“Eu tinha tudo para não terminar o mandato de presidente. Aliás, não tinha condições nem de começar”, diz Sarney

Investido
 na presidência da República com a doença e com a morte de Tancredo de 
Almeida Neves, há 34 anos, o ex-senador pelo Maranhão José Sarney 
declarou, em depoimento para um livro organizado pelo jornalista 
Oliveira Bastos, que cinco presidentes, no Brasil assumiram marcados 
para não terminar seus mandatos – Arthur Bernardes, Café Filho, 
Juscelino Kubitscheck, João Goulart e ele. No seu caso específico, 
confessou que tinha tudo para não concluir a instalação da Nova 
República anunciada por Tancredo como parte do slogan “Muda Brasil” em 
substituição ao regime militar. “Aliás, eu não tinha condições nem de 
começar. Era um vice-presidente fraco, que não 
participara das escolhas do governo nem fora consultado. Alguns setores 
das Forças Armadas, fiéis ao presidente Figueiredo, com os generais 
promovidos no esquema da revolução, me olhavam com muitas reservas. Todo
 o esquema das forças políticas me era hostil. Eu vinha de uma facção 
que não estava constituída em partido, era um grupo difuso, pertenço a 
um Estado pequeno, sem grupos econômicos, de uma região vítima de 
preconceitos, toda a mídia contra mim e a opinião pública me vendo como 
um homem do antigo regime, que aderira a Tancredo por motivos de 
sobrevivência política. Qualquer passo em falso e eu estaria perdido”, 
confidenciou.
Sarney liderou a dissidência dentro do PDS contra a imposição da 
candidatura de Paulo Maluf à sucessão presidencial no colégio eleitoral e
 nesse episódio se credenciou para ser o vice de Tancredo. Pessoalmente,
 resistiu o quanto pôde às sondagens para ser o vice do presidente que 
não assumiu e cuja morte completa 34 anos neste domingo, 21 de abril. A 
preferência de Sarney em torno da vice recaía em torno do nome do 
senador pernambucano Marco Maciel. Havia outros líderes políticos 
operando, porém, para que fosse Sarney o candidato, como Aureliano 
Chaves, vice-presidente da República do general João Baptista 
Figueiredo, e Antônio Carlos Magalhães, cacique político da Bahia, que 
se indispôs publicamente com Maluf numa cerimônia em Salvador. O próprio
 Tancredo considerava essencial a indicação de Sarney por avaliar que 
ele conhecia como poucos a estrutura do PDS nos Estados, de onde sairiam
 votos de delegados no colégio eleitoral incumbido de referendar o 
presidente da República na última eleição indireta. “Você é o dono do 
mapa da mina”, costumava repetir Tancredo, além de mimosear Sarney com 
elogios à sua coragem em romper com o regime e abrir canais para a 
montagem da chamada Aliança Democrática.
José Sarney contou que várias reuniões e articulações foram feitas 
para evitar a sua posse. Ele, aliás, não recebeu o poder das mãos do 
ex-presidente Figueiredo, que saiu pela porta dos fundos para não lhe 
passar o cargo e muito menos a faixa. “Assumi porque o preço do meu 
afastamento poderia ter um custo imprevisível. O poder podia voltar aos 
militares. Havíamos feito um excelente trabalho de aproximação política 
com um importante setor militar. Na semana anterior à posse, todo o 
comando das tropas já estava nas mãos do general Leônidas Gonçalves e de
 seus homens. Por outro lado, o clima de nervosismo, o medo da volta dos
 militares e os riscos do vazio fizeram com que me aceitassem. A minha 
presença, naquele instante, era uma garantia legal de normalidade para 
os militares que nos apoiavam e para as correntes políticas de oposição 
que chegavam ao poder. Mas eu não me iludia. Conhecia bem o caldeirão 
que fervia sob meus pés”, relata Sarney, observando que a partir da 
evolução dos fatos passou a construir sua própria estratégia.
– Eu não queria entrar na História do Brasil como mais um presidente 
incapaz de exercer o poder e ser responsável por um retrocesso 
institucional. Era imperioso ganhar tempo e arregimentar alianças. Eu 
mesmo comecei a pensar numa saída que não comprometesse a transição. 
Recuei porque o preço a pagar seria grande para o país e para a 
democracia. Naquele instante, as Forças Armadas eram a única instituição
 capaz de exibir uma posição de força. Só elas têm planos estruturados 
para uma emergência de crise. As Forças Armadas sempre têm programas 
para evitar o cais. Naquele momento, elas ainda eram as fiadoras do 
processo político. Afinal, todos estávamos ali cumprindo um calendário 
da distensão política feito pelas Forças Armadas, pelas mãos do Golbery,
 do Geisel e de Figueiredo” – adiantou Sarney. O ex-presidente convidou 
para o ministério da Fazenda o economista paraibano Maílson da Nóbrega, 
cuja indicação teria tido o aval do doutor Roberto Marinho, proprietário
 das Organizações Globo. Sob a batuta de Sarney foi lançado o Plano 
Cruzado, de congelamento de preços e salários, com maciço apoio popular,
 a ponto de surgirem os “fiscais do Sarney” que fechavam supermercados 
pilhados na remarcação de preços. O Plano acabou fazendo furos – e 
Sarney concluiu o mandato com a volta da inflação, em níveis 
estratosféricos, e com altos índices de impopularidade já amargados por 
um presidente da República.
Fonte: OS GUEDES - Nonato Guedes - Publicado por: Larissa Freitas
 
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