Um mês depois da prisão do expresidente Lula, vigília diminui e tensão aumenta
Os episódios recorrentes de conflitos levaram na última semana o prefeito de Curitiba, o urbanista Rafael Greca (PMN), a fazer uma "súplica" à Justiça
© REUTERS/Rodolfo Buhrer
Um drone branco sobrevoa
diariamente o prédio da Polícia Federal em Curitiba (PR), onde
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva está preso há um mês, condenado
pela Operação Lava Jato no caso triplex do Guarujá. Pela câmera da mini
aeronave não tripulada, policiais monitoram o movimento dos moradores
locais e dos "acampados" na área sitiada do entorno da Superintendência
da PF. O ambiente é cada vez mais tenso.
Os episódios recorrentes de conflitos levaram na última semana
o prefeito de Curitiba, o urbanista Rafael Greca (PMN), a fazer uma
"súplica" à Justiça. Ele cobrou a saída de Lula - e dos manifestantes -
do local e disse que e o zoneamento urbano do bairro onde está a sede da
PF pode até comportar um prédio com o serviço de emissão de
passaportes, mas não "alojar, em caráter de confinamento penitenciário,
um preso com a expressiva trajetória política do líder sindical, mentor e
líder de movimentos sociais, ex-presidente da República".
O
zumbido diário do drone da PF é mais um dos barulhos da nova rotina do
antes sossegado bairro Jardim Santa Cândida, local arborizado num dos
extremos de Curitiba. Desde a chegada de Lula e do grupo de apoiadores, a
área virou palco de relações conflituosas.
Do alto, as imagens do
drone registram desde o dia 7 de abril o esvaziamento do acampamento -
organizado pelo PT e pelo MST e batizado de "Lula Livre". Nas duas
primeiras semanas, após a chegada do ex-presidente, cerca de 500
manifestantes formavam o acampamento, com barracas espalhadas nas ruas
do bairro e sobre as calçadas. Com ele vieram o comércio clandestino, a
cantorias, os gritos de ordem, o futebol nas ruas, a constante presença
policial, os bloqueios de tráfego e a quebra da rotina.
Desde o
dia 17, são cerca de 70 pessoas, segundo a organização, que passaram a
dormir em barracas em um terreno alugado há 800 metros do ponto
principal dos protestos, a "esquina Olga Benário", como batizaram os
acampados o encontro da rua Guilherme Matter com a Dr. Barreto Coutinho.
O cruzamento é o marco zero do acampamento, que está bloqueado pelos
manifestantes e pelo cordão da isolamento da Polícia Militar - que
cumpre ordem da Justiça estadual de interdito da área do entorno da PF.
Ali
permanecem quatro barracas da estrutura operacional do movimento: a que
recebe os donativos, a da comunicação, a da organização e a das caixas
de som. É no local que todos os dias o grito em coro, amplificado,
quebra o silêncio das manhãs do bairro: "Bom dia, presidente Lula! Bom
dia, presidente Lula! Bom dia, presidente Lula". Uma saudação-protesto
que se repete no "boa tarde" e no "boa noite", diariamente.
Foi na
"esquina Olga Benário" que na sexta-feira passada um delegado da PF,
morador do bairro, quebrou o equipamento sonoro e discutiu com
manifestantes. Dias antes, moradores entraram em confronto verbal e
houve empurra-empurra, novamente por causa do som das "saudações a
Lula".
Os moradores se organizaram em grupos de WhatsApp para
trocar informações e buscar a remoção dos "invasores". Eles também
passaram a isolar os jardins de suas calçadas com fitas de segurança
para tentar impedir montagem de barracas e a ocupação pelos apoiadores
de Lula.
"Essa baderna nos impede de ir e vir com tranquilidade e
segurança, nos coloca medo em relação a nossas esposas e filhos, nos
coloca a mercê de maus odores e ao risco de doenças em razão do lixo que
por vezes se acumula", diz um abaixo-assinado enviado à governadora do
Paraná, Cida Borghetti (PP), com cópia para a 12.ª Vara Federal de
Curitiba no dia 28. "Vivemos acuados e amedrontados. Não conseguimos
dormir em paz em nossas próprias camas. Ressaltamos que não existe
aqui qualquer manifestação de posicionamento ideológico."
O
documento foi enviado no dia anterior ao acampamento ser alvo de
disparos de arma de fogo - ferindo de raspão no pescoço um dos
manifestantes. Um ato em protesto contra os tiros bloqueou uma
principais vias de ônibus do bairro com pneus incendiados.
Os organizadores do acampamento pró-Lula afirmam que as manifestações são pacíficas.
Frentes
A
Justiça Federal recebeu até aqui pedidos de remoção de Lula da PF - e
consequentemente dos manifestantes - de quatro frentes: dos moradores,
da prefeitura de Curitiba, de um deputado estadual e da própria Polícia
Federal. Nenhum deles ainda foi julgado.
O pedido da Prefeitura,
por meio da Procuradoria-Geral da Município, feito no dia 13 de abril,
resultou na abertura de um processo por ordem da juíza federal da 12.ª
Vara Federal, Carolina Moura Lebbos.
O Ministério Público Federal
se posicionou contra a transferência de Lula da sede da PF e diz que no
atual momento "a princípio, é difícil afirmar a existência de outro
local no Estado do Paraná que possa garantir o controle das autoridades
federais sobre as condições de segurança física e moral" Lula.
No
documento, o procurador regional da República Januário Paludo, da
força-tarefa da Lava Jato, diz que há "um aparente conflito
constitucional" na questão: o direito à livre manifestação; à liberdade
de locomoção dos moradores do entorno da PF; o direito do Estado de
aplicar a pena; e o do preso, que até o momento não pediu para ser
removido da "cela" especial montada para ele no quarto andar do prédio
da PF em Curitiba.
Lula completa nesta segunda-feira, 7, seu
primeiro mês de cárcere. A defesa quer esgotar todos os recursos no
processo antes de pedir uma remoção da Superintendência da Polícia
Federal.
Na semana passada, o ex-presidente recebeu pela primeira vez as
visitas de políticos: o amigo, ex-governador da Bahia e possível 'plano
B' do PT para a disputa presidencial, Jaques Wagner, e a presidente do
partido, Gleisi Hoffman. Sem o acesso esperado a aliados, dentro do
cárcere, Lula manteve nesses primeiros 30 dias o contato com o partido
via advogados.
Brasil ao Minuto com informações do Estadão Conteúdo
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