Declarações do ministro da Justiça expõem a falência da Segurança Pública do Rio, denunciam as conexões do comando da PM com o crime organizado e abrem crise entre os governos federal e estadual
DEDO NA FERIDA Ministro Torquato Jardim vocalizou o que autoridades escondiam - (Crédito: Michel Filho) |
Na última semana, o ministro da Justiça, Torquato Jardim,
escancarou o que autoridades responsáveis pela área de segurança no
governo estavam a sussurrar intramuros. Sem mesuras, Jardim afirmou com
impressionante desassombro que a Polícia Militar do Rio de Janeiro
virou, definitivamente, refém do crime organizado. Mais que isso: disse
que setores da polícia estão diretamente ligados ao lucro dessas
organizações de traficantes.
O crime é quem controla a polícia, os criminosos participam da
escolha do comando da Polícia Militar e os chefes dos batalhões da PM
são “sócios do crime”, invertendo a lógica que deveria balizar qualquer
País que se pretenda seguro no mundo. De acordo com ele, são claras as
conexões entre comandantes da PM e o crime organizado. “Comandantes de
batalhão são sócios do crime organizado no Rio.
E o que está acontecendo hoje é que a milícia está tomando conta do
narcotráfico. Por quê? Os principais chefões do tráfico estão
trancafiados em presídios federais. E o crime organizado “deixou de ser
vertical. Passou a ser uma operação horizontal, mais difícil de
controlar”, afirmou. É, ainda segundo suas palavras, a volta “à tropa de
elite 1 e 2”.
Tragédia anunciada
É uma lamentável crônica de uma tragédia mais do que anunciada. Só
que, desta vez, vindo de um ministro de Estado, o que expõe a falência
do mesmo no combate ao flagelo do tráfico e do crime. As duras palavras
de Torquato Jardim foram suficientes para gerar reações diversas, além
de abrir uma crise entre Rio e Brasília – e este comportamento também
fala muito sobre o Rio e suas autoridades.
Uma ala de PMs enfurecidos com as vísceras expostas pelo do ministro
compareceu ao quartel-general da corporação, no centro do Rio, para
exigir uma resposta firme do comandante-geral, coronel Wolney Dias. O
governador Luiz Fernando Pezão e o secretário de Estado de Segurança
Pública, Roberto Sá, se manifestaram por meio de nota. Como já era de se
esperar, pelo próprio ministro, inclusive, carregaram nas tintas. Pezão
declarou que “o governo do Estado e o comando da Polícia Militar não
negociam com criminosos”.
Segundo o governador, as escolhas de comandos de batalhões e
delegacias fluminenses são decisões eminentemente técnicas. Pezão ainda
acusou Torquato Jardim de nunca tê-lo procurado para tratar do assunto e
prometeu interpelá-lo judicialmente. Roberto Sá, por sua vez,
demonstrou revolta com as declarações do ministro.
Dizendo-se indignado, reiterou que as investigações mostram que o
tenente-coronel Luiz Gustavo Teixeira, comandante do 3º BPM (Méier)
executado a tiros, foi vítima de tentativa de assalto. “Ninguém assalta
dando dezenas de tiros em cima de um coronel à paisana [em verdade, o
oficial da PM estava fardado], num carro descaracterizado. O motorista
era um sargento da confiança dele”, havia dito o ministro. O
comandante-geral da PM, Wolney Dias, rebateu: “Não comando uma horda e
sim uma legião de heróis”. De Israel, o presidente da Câmara, Rodrigo
Maia, acusou Jardim de falar demais e de ter prejudicado as
investigações.
FALOU GROSSO Comandante-geral da PM, Wolney Dias: “Não comando uma horda” - (Crédito: Alexandre Cassiano) |
Deputados da bancada do Rio de Janeiro passaram a exigir que o
ministro da Justiça comparecesse à Comissão de Segurança Pública e
Combate ao Crime Organizado da Câmara. A abertura do requerimento
apresentado pelo deputado Hugo Leal, do PSB fluminense, na quarta-feira
1, é enfática em relação à desmoralização das autoridades que comandam a
segurança pública do Rio.
Em entrevista, no entanto, Leal peitou o ministro: “Já que ele se diz
conhecedor desses fatos gravíssimos e afirma ter provas irrefutáveis,
que peça imediata intervenção federal na segurança pública do estado”.
Que as gravíssimas denúncias apresentadas por Torquato Jardim não sejam
em vão. O Rio pede socorro.
Istoé
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