Como colocar um bilionário na cadeia? Os americanos sabem
Alô, malditos da Blessed. Ter um promotor federal da Justiça dos Estados Unidos no pé é pior que cerveja quente e boi doente. Quanto às suas mulheres…
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Espírito animal: morar em apê na Quinta Avenida não vai evitar cair no laço dos cowboys da Justiça americana - (//iStock) |
Jatinho no hangar, apartamento na Quinta
Avenida? Uma porcaria de indenização e a transposição de bens para uma
feitiçaria financeira chamada Blessed Holdings? E ainda rindo da nossa
cara?
Seus caríssimos e competentíssimos advogados já devem ter
avisado que os Estados Unidos não são um refúgio seguro. Com certeza
estão se movimentando a milhares de dólares por hora. Como o dinheiro
teve origem nos nossos bolsos, isso é um detalhe.
Mas dá um certo prazer relembrar os bilionários americanos
que foram para a cadeia por crimes comparativamente insignificantes
diante do que os reis do gado fizeram, não só no Brasil como nos Estados
Unidos.
E tem alguns americanos bastante aborrecidos ao descobrir
que o ataque ao mercado da carne feito pelos irmãos açougueiros foi com
montanhas de dinheiro – nosso, só para lembrar – obtido em troca de
propinas.
É o tipo da coisa que desperta o espirito animal dos
gringos. Falando à Bloomberg, o diretor de um grupo pecuarista de
Montana, Bill Bullard, explicou direitinho os motivos: “Não apenas a
JBS fez as aquisições com empréstimos obtidos através de propinas como
invadiu o mercado americano e tirou da competição investidores
americanos potencialmente interessados nesses ativos”.
DEUSA DA COZINHA
É também o tipo da coisa que põe promotor federal na linha. E
promotores federais americanos têm uma certa tendência a colocar
bilionários flagrados em ilegalidades no sistema prisional.
Às vezes, até com um certo exagero. O caso de Martha Stewart
é um exemplo. Ela estava no auge de seu império de produtos para casa e
cozinha, ancorado em dois populares programas de televisão.
A deusa de todas as coisas domésticas foi acusada de receber
informação privilegiada de seu gerente de investimentos. Mandou vender
uma mixaria de 200 mil dólares em ações de uma empresa enrolada. Evitou
uma perda de 45 mil dólares, mas acabou condenada, em 2004, a nove meses
em regime fechado e dois anos de monitoração, dos quais cinco meses com
tornozeleira eletrônica.
O promotor do caso foi Preet Bharara, que infundiu o terror
durante seu período à frente da Promotoria Federal do Distrito Sul de
Nova York. Processou mais de 100 pessoas do mercado financeiro, muitas
vezes com um ânimo considerado agressivo demais.
O caso mais estrondoso de Bharara, que é indiano
naturalizado, da religião sikh, foi contra Raj Rajatranam, criador de um
fundo de investimentos chamado Galleon Group. O bilionário, nascido no
Sri Lanka, cumpre desde 2011 pena de onze anos de prisão por diversos
crimes financeiros. As multas passaram de 150 milhões de dólares. o
Galleon Group foi a pique.
O PAI, O GENRO, O SOGRO
Como os promotores federais são nomeados pelo presidente,
Bharara teve que sair depois da eleição de Donald Trump. Mas tem uma
carreira política promissora no Partido Democrata pela frente, como é
bastante comum.
O atual governador de Nova Jersey, Chris Christie, foi o
promotor que colocou na cadeia o pai de Jared Kushner, o genro de Trump
atualmente assessor do sogro. Charles Kushner – fortuna de 1,8 bi –
pegou dois anos por doações ilegais de campanha, evasão fiscal e
intimidação criminal do cunhado, que estava cooperando com a justiça
contra ele (contratou uma prostituta para atraí-lo, gravou o encontro e
mostrou a gravação para a irmã).
O sogro de Chelsea Clinton, que provavelmente por
interferência divina não retomou o lugar de primeira filha, também já se
lascou todo. Ed Mezvinsky estudou direito e ciências políticas e fez
carreira no Partido Democrata como defensor dos direitos do consumidor.
Tentou ser promotor e senador. Acabou eleito deputado por
Iowa. Fez trambiques espetaculares, usando um esquema tipo pirâmide para
capturar 10 milhões de dólares em investimentos podres. Ele e a mulher,
que também foi deputada, eram muito amigos e financiadores do casal
Clinton.
Mezvinsky alegou sofrer de doença bipolar quando foi pego
com a mão na roubalheira. Não colou. Cumpriu cinco anos de regime
fechado. Saiu em 2008, ainda enrolado no pagamento dos ressarcimentos às
vítimas de seus trambiques.
RICÕES EM CANA
O caso que virou um marco da Justiça americana na punição de
bilionários criminosos foi o de Michael Milken, que veio à tona no fim
dos anos 80. Ele foi o gênio dos investimentos que praticamente
inventou o mercado dos títulos de alto risco – ou podres.
Energizou o mercado, mas também cometeu uma lista de delitos
financeiros de impressionar até em outras latitudes. Fez um acordo de
leniência para pegar apenas dez anos de prisão e multa de 600 milhões de
dólares. Comutou a pena em dois anos por colaborar com a justiça,
entregando outros gigantes do mercado financeiro. É mais ou menos a
história contada no filme O Lobo de Wall Street.
A justiça americana praticamente inventou o conceito de
acordo de leniência em todas as esferas criminais. Também desenvolveu
vários sistemas para pegar políticos, poderosos e bilionários, inclusive
com a criação de ”penitenciárias de colarinho branco”.
Sem risco de convívio com criminosos violentos, que além das
pressões habituais podem chantagear os bilionários, e em instalações
corretas, embora espartanas se comparadas a apartamentos de 20 milhões
de dólares na Quinta Avenida, fica mais fácil mandar os ricões para a
cana dura.
CRÁPULAS SEM BANDEIRAS
Num trabalho extraordinário, policiais federais, promotores e
juízes brasileiros também estão desenvolvendo métodos efetivos que
recolheram para o regime fechado nomes do mais alto escalão – e do baixo
calão, cada vez que nos lembramos deles.
Esta nova realidade é praticamente a única coisa que nos dá
algum alento diante do nojo, da humilhação e da raiva em que fomos
jogados pela asquerosa traição dos mais conhecidos políticos do Brasil.
Só para ficar na última eleição: mais de 51 brasileiros
confiaram seus votos a um dos traidores; 54,5 milhões votaram na outra.
Os dois integrantes da Crápulas Sem Bandeiras, a dos políticos
criminosos independentemente da estirpe partidária, não vão se safar se
depender da honestidade e da eficiência dos bons integrantes do
Judiciário brasileiro.
Será que os promotores americanos vão deixar os colegas
brasileiros passar à frente deles? Será que uma competição virtuosa para
ver quem coloca mais crápulas na cadeia não vai atiçar os ânimos deles?
Os americanos já partem de um terreno muito vantajoso: sabem
tudo. Inclusive exatamente qual é a composição da Blessed. Os sócios
ocultos podem fugir, mas não podem se esconder.
Veja
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