Governador João Doria vence prévias do PSDB para disputar Presidência da República em 2022
O resultado põe fim a uma novela que começou no domingo (21), quando a votação foi impedida por uma pane no aplicativo
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O governador de São Paulo, João Doria, 63, venceu, neste sábado (27), as prévias presidenciais do PSDB por 53,99% a 44,66% contra o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. O terceiro concorrente, Arthur Virgílio Neto, ex-prefeito de Manaus, obteve 1,35%.
O
resultado põe fim a uma novela que começou no domingo (21), quando a
votação foi impedida por uma pane no aplicativo (investiga-se um ataque
hacker) e o resultado, postergado. O saldo foi de vexame e tensão no
partido.
Neste sábado, cerca de 40 mil filiados
puderam votar por meio de uma nova ferramenta online. No total, 44,7 mil
se cadastraram para votar nas prévias - cerca de 3.000 votaram pelo app e
o restante, tucanos com mandato, em urnas eletrônicas, no último
domingo.
O presidente do PSDB, Bruno Araújo, disse ter havido
tentativas de ataque ao sistema de votação nas prévias neste sábado, mas
que houve boa resistência do novo aplicativo contratado. Foram
contabilizadas pouco mais de 30 milhões de tentativas de acesso ao
sistema, de acordo com as empresas de auditoria do processo.
Vitorioso
nas prévias, Doria fez um discurso em que pregou a união de seu partido
e de outras siglas em torno de um projeto liberal para enfrentar Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (sem partido, rumo ao PL).
O
governador paulista acenou a seus rivais, particularmente Eduardo Leite, com
quem travou uma amarga disputa ao longo das prévias. "A eleição foi
linda. Não tenho dúvidas de que foi difícil a decisão. Eduardo Leite e
Arthur Virgílio são meus amigos e do mesmo partido. A partir de agora,
fazemos parte da mesma chapa", disse o tucano.
"Ninguém
faz nada sozinho. Precisaremos da ajuda de todos. Da união do Brasil.
Da união do PSDB. Da união com outros líderes e partidos."
Eduardo
Leite desejou boa sorte a Doria defendeu o partido como um projeto de
centro contra a polarização e os extremos no cenário político.
Ele
criticou o que chamou de "polarização inútil e prejudicial à vida da
população". "João, te desejo toda sorte porque o Brasil precisa disso.
Que a gente consiga viabilizar um projeto no centro."
Para o
governador do Rio Grande do Sul, o país vive um clima de ataques entre dois extremos ao
mesmo tempo em que cresce abaixo do potencial e ainda convive com
desigualdades.
O partido tem a missão de ser firmar como a
principal opção da chamada terceira via, enquanto vê esse posto ameaçado
por candidatos como o ex-juiz Sergio Moro (Podemos).
"Essa
energia desperdiçada entre dois extremos que se enfrentam como dois
inimigos a serem exterminados e que viram os verdadeiros inimigos da
população, soltos para fazer o estrago que estão fazendo", afirmou Eduardo Leite.
A semana havia agravado a divisão entre Doria e Eduardo Leite, enquanto evidenciou o alinhamento de Arthur Virgílio ao governador de São Paulo.
O
paulista levantou suspeitas de que as regras de votação foram feitas
para beneficiar o gaúcho, além de lembrar a relação do rival com o
deputado Aécio Neves (MG), falando na necessidade de depurar o partido.
Doria
foi alvo ainda de acusação de compra de votos pela deputada Mara Rocha
(AC), episódio que não teve desdobramentos - a não ser pelas referências
de Eduardo Leite. Contudo, o governador paulista foi colocando panos quentes nas
polêmicas e preparando o terreno para a votação deste sábado.
"Entendemos
que a dimensão do nosso partido, a dimensão daquilo que representa o
único partido do Brasil que faz prévias, é mais importante do que
qualquer outro sentimento que possa ter sido expressado de forma
emocional, de forma instável ou de forma deliberada", resumiu, na terça-feira (23).
O fiasco da votação do último domingo já era previsto na
equipe de Doria, que considerava o app original frágil. A ferramenta já
havia sido alvo de contestação pelas campanhas de Doria e de Eduardo Leite
devido a vulnerabilidades, mas mesmo assim foi mantida.
Tucanos
que acompanharam as prévias afirmam que, apesar de favorito por estar à
frente de São Paulo, sede do tucanato, Doria viu seu adversário
crescer, mas recuperou terreno na reta final - virou o voto, por exemplo,
de dois deputados federais.
Por isso, para Eduardo Leite e seus aliados, o
adiamento beneficiou o paulista. O entorno do gaúcho afirma que Doria
conquistou novos votos com base em barganha e intimidação, sobretudo em
São Paulo, o que a campanha paulista nega.
Doria, que costuma
dizer ser "filho de prévias", vence a sua terceira em seguida. Ele foi
vitorioso nas indicações para concorrer à Prefeitura de São Paulo, em
2016, e ao governo do estado, em 2018 - tendo conquistado os dois cargos.
Ao
bater o rival gaúcho e obter a vaga de candidato à Presidência, Doria
consolida seu projeto político iniciado em 2016 e abre caminho para
ampliar sua influência na sigla - apesar da resistência de tucanos da ala
histórica e de seu principal rival interno, Aécio.
Depois
de um processo com críticas e acusações de parte a parte, Doria terá o
desafio de unir a sigla em torno da sua campanha ao Planalto.
Doria
já afirmou acreditar que as prévias fortalecem o PSDB e que, superada a
votação, todos os membros do partido serão aliados e vencedores.
A
composição do percentual de cada um dos três candidatos se baseou nos
votos de quatro grupos, cada um com peso de 25%. O paulista ganhou em
três deles, e no último bloco houve divisão.
Entre filiados,
Doria teve maior vantagem, somando 15,4% dos votos frente à 9,2% de Eduardo Leite. Já entre os prefeitos e vices, a distância foi pequena: Doria
ficou com 12,9% e Eduardo Leite 11,9%.
No grupo de governadores e
vices, senadores e deputados federais, bem como ex-presidentes do PSDB, o
paulista também obteve vitória apertada: 13% dos votos, enquanto o
gaúcho somou 11,5%.
Deputados estaduais e vereadores
representavam juntos 25%. No primeiro grupo ganhou Doria (6,8%),
enquanto Eduardo Leite teve (5,5%). Apenas entre os vereadores o gaúcho ficou na
dianteira, somando 6,5% frente a 5,9% do paulista.
Nos dias que antecederam a primeira votação, Eduardo Leite e Doria já procuravam baixar a temperatura publicamente: fizeram um último debate morno e ensaiaram um discurso de unidade durante uma reunião em Porto Alegre. Nos bastidores, a briga voto a voto seguiu até o final.
O gaúcho, que foi
procurado por outras siglas neste ano, disse que não deixaria o partido
se perdesse. Eduardo Leite vinha afirmando ainda que, no caso da derrota, não
concorreria a nenhum cargo em 2022 e terminaria seu mandato no Rio
Grande do Sul.
Outra
tarefa do agora presidenciável é estabelecer conversas e negociações
com partidos da chamada terceira via, com o objetivo de evitar a
fragmentação do campo político que pretende apresentar uma alternativa
viável contra Jair Bolsonaro e Lula, que estão à frente nas pesquisas.
Durante
a campanha, Doria se comprometeu a buscar as demais legendas e até
sinalizou que poderia abrir mão da cabeça de chapa em nome de um projeto
comum. Com cerca de 5% nas pesquisas e criticado por não alavancar seu
nome a partir do trunfo da vacinação, o tucano está atrás de Sergio Moro
(Podemos).
A maior rejeição de Doria nas pesquisas e a
opinião de que sua candidatura é um projeto pessoal que isolaria o PSDB
foram argumentos mobilizados por Eduardo Leite, mas não bateram a ampla vitrine
de programas e investimentos apresentada pelo governador paulista a seu
favor.
O gaúcho procurou angariar votos em São Paulo com a
ajuda do ex-governador Geraldo Alckmin, que só consideraria permanecer
no PSDB caso Eduardo Leite vencesse.
Na visão de parte dos tucanos, o
estilo mais incisivo e pragmático de Doria poderia impor uma dificuldade
a mais para a união da legenda.
Com Doria presidenciável, não
haveria espaço para deputados bolsonaristas - em geral, ligados a Aécio e
apoiadores de Eduardo Leite - na bancada federal e uma debandada seria provável.
O deputado mineiro, porém, nega planos de deixar a sigla.
Já
para aliados de Doria, uma vitória de Eduardo Leite, que fortaleceria a ala de
Aécio no partido, acabaria por transformar o PSDB em um partido do
centrão.
Doria, que em 2018 fez campanha por Bolsonaro sob o
slogan "BolsoDoria", passou a ser um dos principais opositores do
presidente.
Com uma campanha que teve como alvos também Bolsonaro e
Lula, Doria percorreu 21 estados do país e obteve o apoio formal de
cinco diretórios, incluindo o de maior peso, São Paulo, que sozinho
representou 35% dos votantes.
Erros de Eduardo Leite na reta final
contribuíram com o resultado - o vaivém de declarações após a suspensão
das prévias, o pedido feito por um aliado para adiar a votação devido a
desconfianças no aplicativo e a revelação pela Folha de que o gaúcho
atuou, a pedido do governo Bolsonaro, para adiar a vacinação.
A
ironia é que a campanha de Eduardo Leite teve início após um movimento político
equivocado de Doria, que tentou tomar para si a presidência do PSDB em
fevereiro e, como troco, viu surgir um rival apoiado pela bancada.
Durante
a campanha, o governador paulista teve estrutura mais robusta e
investiu em pesquisas, sustentado pela máquina do PSDB paulista,
experiente em prévias, e até pela máquina do governo, com um orçamento
previsto de R$ 50 bilhões para investimentos nas cidades.
A Folha revelou que, em 2021, Doria multiplicou o repasse de verba política, chegando a R$ 1 bilhão.
O
marketing da campanha de Doria, coordenado pelo publicitário Daniel
Braga, incorporou a rejeição a ele - o governador assumiu-se "chato" e
"calça apertada" ao som de "O Homem Disparou", hit da eleição de 2020.
Houve uma gafe no interior da Paraíba, quando Doria provocou risos da plateia tucana ao perguntar: "quem aqui já foi a Dubai?".
Após
dois coordenadores das prévias - o senador José Aníbal (SP) e o
ex-deputado Marcus Pestana (MG) - declararem apoio a Eduardo Leite, a campanha de
Doria afirmou que "a parcialidade antes velada se tornou explícita".
"As
raposas estavam dentro do galinheiro. É debochar na cara dos filiados
do PSDB", disse Wilson Pedroso, coordenador da campanha de Doria.
Os
aliados de Eduardo Leite também reclamam do rival, apontando que Doria agiu com
pressão. O maior exemplo foi a demissão de um secretário da capital
após ter declarado voto no gaúcho.
Eles acusaram ainda a
tentativa de fraude por parte dos paulistas pela filiação extemporânea
de 92 prefeitos e vices que, ao final, foram excluídos da votação.
Em
eventos de campanha, Eduardo Leite criticou Doria duramente, afirmando que "o
sentimento do PSDB raiz é maior do que qualquer tipo de pressão" e
condenou o voto em troca de vantagens indevidas.
Para
estrategistas de Eduardo Leite, táticas de intimidação podem ter feito a
diferença no resultado, mas terão o efeito colateral de agravar a imagem
de Doria no partido.
Agora convocado a fazer
campanha para Doria e esquecer todos os ataques, Eduardo Leite chegou a fazer um
trocadilho, na sexta-feira (19): "Não adianta depois chorarmos o leite
derramado, porque vamos todos nos ver numa calça justa".
Notícias ao Minuto
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