Vídeo vira arma na briga do presidente Jair Bolsonaro com o ex-ministro Sérgio Moro
Desde que Moro pediu demissão, no dia 24, acusando Bolsonaro de interferência política na Polícia Federal, tudo parece empurrar o governo para uma crise atrás da outra
© Reuters
O presidente Jair Bolsonaro
havia prometido divulgar a gravação da última reunião ministerial que o
então titular da Justiça Sérgio Moro participou, no dia 14. Na ocasião,
Bolsonaro cobrou do ex-juiz da Lava Jato que se posicionasse sobre
prisões, consideradas por ele como "ilegais", de pessoas que furaram a
quarentena imposta por prefeitos e governadores para evitar a propagação
do novo coronavírus. O clima foi tenso.
"Nossa reunião é filmada e fica no cofre lá o chip",
contou Bolsonaro, ao dizer que pediu autorização dos outros ministros
para tornar público o vídeo. "Mandei legendar e vou divulgar. Tirem as
conclusões de como eu converso com os ministros."
Na última
quinta-feira, porém, Bolsonaro afirmou que recebeu uma recomendação
para não divulgar o áudio da reunião. "Último conselho que tive é não
divulgar para não criar turbulência. Uma reunião reservada, então é essa
a ideia. Talvez saia, mas por enquanto não", disse o mandatário nesta
quinta-feira, 30, ao deixar o Palácio da Alvorada.
Desde que Moro
pediu demissão, no dia 24, acusando Bolsonaro de interferência política
na Polícia Federal, tudo parece empurrar o governo para uma crise atrás
da outra. Agora, por exemplo, o problema não é apenas "cortar o
combustível do Posto Ipiranga", como disse o ex-ministro da Fazenda
Delfim Netto, numa referência ao atual chefe da equipe econômica, Paulo
Guedes, que carrega esse apelido.
O mais grave é que o
próprio Bolsonaro, insuflado pela ala ideológica da Esplanada, tende a
jogar gasolina na crise. Apesar de desconfiar de tudo e de todos,
espalhando até boatos para aliados, com o intuito de identificar quem
"vaza" notícias no Palácio do Planalto, o presidente não enxerga uma
tempestade de grandes proporções no horizonte. Mas vê conspiração. "É
muita trovoada para pouca chuva", resumiu ele.
A mudança no
comando da Polícia Federal, com a escolha do delegado Alexandre Ramagem
para a diretoria da corporação, foi a gota d'água para a saída de Moro.
E, de lá para cá, cada dia vivido pelo Planalto - que se aproximou do
Centrão para formar uma base de sustentação no Congresso e tenta barrar
eventual processo de impeachment - tem sido uma agonia.
Se
a substituição de Moro por André Mendonça no Ministério da Justiça foi
bem recebida no Supremo Tribunal Federal (STF), o mesmo nunca se pôde
dizer sobre a troca de Maurício Valeixo na PF.
O Supremo deu mais
um cartão amarelo para Bolsonaro na última quarta-feira, 29, quando o ministro Alexandre de
Moraes suspendeu a nomeação de Ramagem, sob o argumento de que havia ali
"desvio de finalidade".
Isolado, ele foi obrigado a recuar e
rasgou o decreto. Mas não desistiu de indicar o delegado mais adiante,
prometendo desafiar a Corte. "Não é justo um presidente viver numa
situação dessas. Eu não quero saber de inquérito de ninguém. Não estou
sendo investigado", disse Bolsonaro.
Na última segunda-feira, 27,
porém, o decano Celso de Mello autorizou abertura de inquérito no
Supremo para investigar denúncias feitas por Moro de que Bolsonaro tenta
intervir nas apurações da PF.
Bolsonaro já admitiu, mais de uma
vez, que sempre cobrou de Moro relatórios diários de inteligência, sob o
argumento de que precisa de informações para administrar o País. Disse,
ainda, que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) lhe repassava
esses dados.
O delegado que havia sido escolhido para comandar a
PF está na corporação desde 2005. Ramagem dirigia a Abin e agora, com a
reviravolta provocada pela decisão de Moraes, reassumirá o cargo. É
homem da estrita confiança do presidente e amigo de seus filhos.
A
aproximação com Bolsonaro começou no segundo turno da campanha de 2018,
quando ele foi escalado para coordenar a segurança do então candidato
do PSL. "Passou a ser um amigo", disse o presidente. "Tomava café junto,
com leite condensado no pão."
Na prática, uma tempestade perfeita
se forma na direção de Bolsonaro. As nuvens trazem crise política
misturada à turbulência econômica, além de uma grave pandemia de
coronavírus no meio do caminho. "E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê?
Eu sou Messias, mas não faço milagre", afirmou Bolsonaro na
terça-feira, ao responder a perguntas de repórteres sobre o fato de o
Brasil ter ultrapassado a China em número de mortes pela covid-19.
Nesse mesmo dia, a Secretaria de Comunicação da Presidência postou
mensagem no Twitter sobre "números amplamente positivos" do combate à
doença no "Placar da Vida". Com um solavanco atrás do outro na
República, ninguém se arrisca a prever as cenas do próximo capítulo..
Notícias ao Minuto
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