Veja ponto a ponto do que passa a valer com o pacote anticrime, que entra em vigor nesta quinta-feira
O
pacote anticrime, aprovado pelo Congresso e sancionado em dezembro pelo
presidente Jair Bolsonaro, passa a valer a partir desta quinta-feira
(23). A nova legislação altera dispositivos do Código Penal, do Código
de Processo Penal e da Lei de Execuções Penais.
Entre as principais
mudanças estão as novas regras para acordos de delação premiada, o novo
critério para definir a legítima defesa e a previsão de prisão imediata
após condenação pelo tribunal do júri.
O
pacote é resultado da reunião de propostas elaboradas pelo ministro da
Justiça, Sergio Moro, e por uma comissão de juristas coordenada pelo
ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Quatro
dispositivos que fazem parte do pacote não terão aplicação imediata.
Eles foram suspensos por tempo indeterminado pelo vice-presidente do
STF, ministro Luiz Fux, relator de quatro ações sobre o tema.
A suspensão vale até que o tema seja analisado no plenário do Supremo – a data desse julgamento ainda não foi marcada.
Foram suspensos:
a
criação do juiz de garantias, que atua apenas na fase de instrução do
processo – diferente do juiz que vai atuar no julgamento propriamente
dito;
novas regras para o arquivamento de inquéritos;
a ilegalidade de prisões, caso os detidos não passem pela audiência de custódia em até 24 horas;
a proibição de que juízes decidam processos nos quais acessaram provas consideradas inadmissíveis.
Veja o que estabelece a nova lei anticrime:
Pena máxima de 40 anos de prisão
Será
maior o tempo máximo de cumprimento das penas privativas de liberdade,
ou seja, de prisão, de 30 para 40 anos. Mesmo que uma pessoa seja
condenada por outros crimes, o prazo máximo de permanência na prisão
será de 40 anos.
Legítima defesa
Agentes de segurança que
previnem agressões ou risco de agressões de bandidos a reféns durante
crimes poderão ser enquadrados no conceito de legítima defesa, ou seja,
podem não responder por estas reações contra criminosos.
Possibilidade de prisão de condenados depois de decisão do júri
Depois
de decisão do tribunal do júri, o cumprimento da pena passará a ser
imediato para crimes com pena igual ou maior que 15 anos. O tribunal do
júri, pela Constituição, julga crimes dolosos contra a vida – como, por
exemplo, um homicídio, em que houve a intenção do criminoso de matar.
Novas regras para progressão de regime
A
progressão de regime de cumprimento de pena (fechado, aberto,
semiaberto) terá mudanças. Pelo texto, o condenado vai mudar do regime
mais restrito para um mais brando de acordo com os percentuais de pena
já cumpridos por ele e com o tipo de crime cometido – os percentuais vão
variar de 16% (para o condenado por crime sem violência ou grave
ameaça) até 70% da pena (para o condenado reincidente por crime hediondo
ou equiparado com resultado morte).
Mudanças nas regras para a liberdade condicional
A
lei criou mais um requisito para a concessão de liberdade condicional:
para obter o benefício, o condenado não pode cometer falta grave nos
últimos 12 meses.
Proibição de ‘saídão’ para condenados por crime hediondo com morte
O
texto proíbe a saída temporária da prisão aos condenados por crime
hediondo que resultaram em morte. A saída temporária é um benefício
concedido a quem cumpre pena em regime semiaberto, em datas específicas.
Mudanças nas regras para a delação premiada
Começam
a valer também as novas regras sobre a delação premiada (acordo em que o
investigado se compromete a prestar informações em troca de uma punição
menor).
A negociação para a delação premiada será sigilosa e terá,
necessariamente, o acompanhamento do advogado do investigado. A delação
poderá ser negada, por meio de decisão fundamentada. O texto estabelece
ainda que, em todas as fases do processo, o réu delatado deve ter a
oportunidade de se defender após o fim do prazo da manifestação do réu
que delatou. No ano passado, o STF, por maioria de votos, entendeu que
em ações penais envolvendo os dois tipos de acusados, quem foi delatado
tem direito a apresentar suas alegações finais depois dos réus
colaboradores.
As negociações e a própria delação devem ser
gravadas. Além disso, o texto impede que alguns procedimentos sejam
realizados tendo apenas como base a delação: concessão de medidas
cautelares, recebimento de denúncia ou decisão em sentença condenatória.
A lei prevê também rescisão de acordos de delação já homologados em
caso de omissão dolosa de informações por parte do acusado que delatou.
Decisões colegiadas de juízes em casos envolvendo organizações criminosas
A
legislação amplia os crimes que podem ser julgados por Varas Criminais
Colegiadas. A possibilidade de decisão colegiada já existia em lei, para
o caso crimes de organizações criminosas. A nova redação prevê o uso
deste recurso também no caso do crime de constituição de milícia e
outras infrações penais conexas.
Decisões colegiadas sobre presos em presídios federais
Decisões
judiciais sobre providências em relação a presos federais vão ser
feitas por órgão colegiado de juízes: ou seja, decisões sobre
transferência de presos, concessão ou rejeição de benefícios prisionais
ou sanções ao detento poderão ser tomadas por um colegiado de juízes.
Suspensão de prescrição da pena quando há recursos pendentes em tribunais superiores
Passa
a existir uma nova possibilidade de suspensão da prescrição de penas:
quando houver recursos pendentes de julgamento em tribunais superiores. A
prescrição ocorre quando termina o prazo para que a Justiça promova a
punição contra um acusado de crime. Ela varia de acordo com o delito e a
pena aplicada a ele, no caso concreto. Na prática, a mudança é para
evitar que recursos ao STJ e ao STF sejam uma arma da defesa para
protelar o fim do processo e para viabilizar a prescrição.
Criação de Banco Nacional de Perfis Balísticos
Será
criado o Banco Nacional de Perfis Balísticos, que tem como objetivo
cadastrar armas de fogo e armazenar dados relacionados a projéteis e de
estojos de munição deflagrados por estas armas.
Regras da cadeia de custódia
O
texto cria um conjunto de regras da chamada cadeia de custódia, que é o
conjunto de ações para manter e documentar vestígios coletados em
locais onde ocorreram crimes (objetos que fazem parte, por exemplo, do
local onde ocorreu um homicídio). As regras vão disciplinar a atuação
dos profissionais desde a coleta de material no local do crime até o seu
descarte.
Ampliação do tempo de permanência de presos perigosos em presídios federais
Presos
perigosos vão permanecer mais tempo em presídios federais. Até então, a
lei que estava em vigor previa prazo máximo de 360 dias. A nova regra
aumenta o período para 3 anos, renováveis por iguais períodos, havendo
solicitação motivada do juiz.
Permissão para que estados e Distrito Federal construam presídios de segurança máxima
Estados
e Distrito Federal poderão construir presídios de segurança máxima ou
adaptar as instalações já existentes ao regime de segurança máxima.
Criação do Banco de Dados Multibiométrico e de Impressões Digitais
Será
criado, no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública, do
Banco Nacional Multibiométrico e de Impressões Digitais. O Banco tem
como objetivo armazenar dados de registros biométricos, de impressões
digitais e, quando possível, de íris, face e voz, para subsidiar
investigações criminais federais, estaduais ou distritais.
Regras para o ‘informante do bem’
Determina
que a Administração Pública direta e indireta manterá ouvidorias para
garantir que “qualquer pessoa o direito de relatar informações sobre
crimes contra a administração pública, ilícitos administrativos ou
quaisquer ações ou omissões lesivas ao interesse público”.
Estas
pessoas, conhecidas como “informantes do bem”, terão direito à
preservação de sua identidade – que só poderá ser revelada em caso de
“relevante interesse público ou interesse concreto para a apuração dos
fatos”. Além disso, o informante do bem terá proteção integral contra
retaliações e será isento de responsabilidade civil ou penal em relação
ao relato que fizer às autoridades.
Confisco alargado de bens
Estabelece
o chamado “confisco alargado de bens”: nos casos de pena máxima maior
que 6 anos de prisão, a Justiça pode decretar a perda dos bens que são
produtos do crime, ou seja, o que for correspondente à diferença entre o
valor do patrimônio do condenado e seu rendimento lícito.
Acordo de não persecução penal antes da denúncia
Traz
as regras para o acordo de não persecução penal. Pelo texto, o
Ministério Público pode propor o acordo, antes da denúncia, se o
investigado tiver confessado a prática de um crime sem violência ou
grave ameaça. A infração penal deve ter pena mínima menor que quatro
anos.
Acordo de não persecução penal em processos de tribunais superiores
O
acordo de não-persecução penal também poderá ser fechado em processos
em tribunais superiores, como STJ e STF. As condições para este acordo
serão as mesmas previstas para outras instâncias: o investigado precisa
confessar o crime, que não pode ter sido cometido com violência ou grave
ameaça. O delito deve ter pena mínima inferior a quatro anos.
Uso de bens apreendidos por forças de segurança
Tendo
autorização da Justiça, as forças de segurança vão poder usar bens
apreendidos de condenados no desempenho de suas atividades. Veículos e
aeronaves apreendidas, por exemplo, poderão ser usadas no combate ao
crime pelas polícias (civil, federal, rodoviária federal, entre outras),
por agentes socioeducativos, Força Nacional de Segurança Pública e
Instituto Geral de Perícia.
Envio a museus de obras de arte e bens culturais apreendidos
Em
caso de apreensão e perda de obras de arte ou outros bens de valor
cultural, se não houver vítima determinada, o patrimônio poderá ser
destinado a museus públicos.
Ampliação da pena por roubo com uso de arma branca ou de arma de uso restrito ou proibido
O
Código Penal estabelece pena de 4 a 10 anos para o crime de roubo.
Agora, a lei passa a prever uma possibilidade de aumento de pena de 1/3
até a metade se o delito for cometido com o uso de arma branca (facas,
por exemplo). Já nos casos de uso de arma de fogo de uso restrito ou
proibido, a pena será o dobro da prevista para o crime.
Tipo de ação penal para crimes de estelionato e fraudes
Em
casos de crimes como estelionato e outras fraudes, a ação penal passa a
depender de um aval da vítima para que o Ministério Público formalize a
acusação na Justiça. Há exceções: MP poderá agir sem a representação se
a vítima é a Administração Pública, criança ou adolescente, pessoa com
deficiência mental; maior de 70 anos ou incapaz.
Regras para o regime disciplinar diferenciado
A
lei amplia o prazo de duração do chamado Regime Disciplinar
Diferenciado para os condenados. São submetidos ao RDD – que prevê cela
individual, restrição de visitas e de banho de sol – aqueles condenados
que cometem crime doloso na prisão ou que provocam tumultos dentro dos
presídios. Agora, o detento poderá ficar no RDD por até dois anos, e não
mais 360 dias, como então previsto na lei. As visitas também passam de
semanais para quinzenais. Além disso, as comunicações do preso serão
monitoradas e a correspondência poderá ser fiscalizada.
Mudança no rol dos crimes hediondos
A
lei torna hediondo o homicídio praticado com arma de fogo de uso
restrito ou proibido. Também entram no rol destes tipos de crimes o
roubo com restrição de liberdade, com emprego de arma de fogo, com
resultado lesão corporal grave ou morte. Passam também a ser hediondos
crimes como tráfico internacional de armas de fogo, comércio ilegal de
armas de fogo, posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido.
Crimes hediondos são crimes graves, para os quais não pode haver fiança,
anistia ou indulto.
Infiltração de policiais em crimes de lavagem de dinheiro
A
lei permite a infiltração de agentes e a ação controlada na
investigação de crimes de lavagem de dinheiro. A infiltração consiste em
viabilizar que um agente disfarçado passe a fazer parte de uma
organização criminosa, para obter informações que possam ser usadas em
investigações. Já na ação controlada a polícia acompanha e observa as
ações de organizações criminosas, sem agir imediatamente. Os policiais
só entram em ação no momento mais adequado para obter provas e
informações.
Infiltração de policiais na internet
Policiais
poderão se infiltrar na internet para obter informações e provas contra
organizações criminosas. A infiltração poderá ser autorizada por até
seis meses. Renovações deste prazo podem ocorrer, desde que haja decisão
judicial motivada e desde que o total do prazo não ultrapasse 720 dias.
Recursos para o Fundo Nacional de Segurança Pública
A
lei amplia as fontes de recursos para o Fundo Nacional de Segurança
Pública (FNSP): o fundo passa a receber recursos de convênios, contratos
e acordos; recursos do leilão de bens aprendidos; fianças quebradas ou
perdidas.
Mudanças nas regras para medidas cautelares
As
medidas cautelares (internação provisória, monitoramento eletrônico,
proibição de contato com a vítima, entre outras) não poderão mais ser
determinadas de ofício, ou seja, sem a provocação de outros agentes.
Elas dependerão de pedido das partes no processo, solicitação do MP ou
da polícia. O alvo da medida cautelar terá 5 dias para se manifestar
sobre o pedido.
Mudança nas regras de prisão preventiva
A
lei estabelece que “não será admitida a decretação da prisão preventiva
com a finalidade de antecipação de cumprimento de pena ou como
decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou
recebimento de denúncia”.
O juiz não poderá mais decretar a prisão
preventiva de ofício, ou seja, sem precisar de provocação de outros
agentes. Agora, a prisão preventiva poderá ser decretada a requerimento
do Ministério Público ou por representação da polícia.
A prisão
preventiva também passa a ser cabível quando houver “perigo gerado pelo
estado de liberdade do imputado”. Antes da nova lei, havia a
possibilidade de se decretar esta modalidade de prisão para a “garantia
da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução
criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver
prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”. Além
disso, a decisão judicial que decretar a prisão preventiva deverá ser
“motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de
fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida
adotada”.
A prisão preventiva deverá ser revisada a cada 90 dias. Ou
seja, o órgão judicial que decretou deve analisar se ela deve ser
mantida a cada 90 dias, e deve dar sua decisão de forma fundamentada. Se
não o fizer, pode tornar a prisão ilegal.
Fonte: G1 - Publicado por: Fabricia Oliveira
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