quinta-feira, 2 de março de 2023

Paraibana de Cajazeiras passa em 1º lugar em medicina na USP

Jovem de escola pública da cidade de Cajazeiras, na Paraíba, é primeiro lugar em medicina na Universidade de São Paulo (USP), com apenas 17 anos de idade

A paraibana Maria Clara Lira estudou sozinha, por meio de vídeo aulas e apostilas, e se diz feliz em representar o nordeste, que segundo ela, "pode, sim, instruir e educar sua população"

Katherine Assis*
Maria Clara Lira passou em primeiro lugar em medicina na USP estudando sozinha -  (crédito: Arquivo pessoal)
Maria Clara Lira passou em primeiro lugar em medicina na USP estudando sozinha - (crédito: Arquivo pessoal)

Estudando por conta própria, a estudante do Instituto Federal da Paraíba (IFPB) no município de Cajazeiras (PB), Maria Clara Lira, foi classificada em primeiro lugar em medicina na Universidade de São Paulo (USP). A paraibana, de 17 anos, conta que custou a acreditar quando viu seu nome no primeiro lugar geral do curso mais concorrido de uma das melhores faculdades do Brasil. A aprovação se deu por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem-USP 2023). Porém, a nova caloura ainda pondera se realmente fará sua matrícula na USP, alegando questões financeiras e a angústia de ficar muito tempo distante da família.

Maria Clara não esconde sua felicidade pela conquista, especialmente por estar representando os nordestinos e estudantes de escola pública. "Fico feliz em demonstrar que nós, aqui na Paraíba e no Nordeste, temos instrução e que somos capazes alcançar o que quisermos. Por meio da minha conquista eu consigo mostrar que a Paraíba e o Nordeste são, sim, capazes de informar e instruir seus cidadãos", afirma, orgulhosa.

A estudante, que cursou os dois primeiros anos de ensino médio no auge da pandemia, estudava sozinha, por meio de videoaulas, livros e provas antigas. "No primeiro ano, ainda estava em dúvida entre medicina e outros cursos, mas decidi que iria estudar para passar com a maior nota possível para que pudesse escolher o que seria melhor para mim", diz ela, reforçando que buscava solucionar todas as questões possíveis que encontrava nos livros didáticos e ainda procurava por outras em sites da internet.

"Estudava em torno de nove horas por dia durante a pandemia e quando as aulas voltaram, já no terceiro ano, em média 7 horas. A gente tem que abdicar de muita coisa para ir em frente nos estudos", afirma a paraibana. "Até teve momentos em que eu pensei em desistir, especialmente na hora da prova, quando fiquei um pouco nervosa. Mas pensei: não, eu tenho que continuar, já cheguei até aqui, agora vou prosseguir. Sempre há momentos que dá vontade de desistir, mas não vale a pena esmorecer", reforça.

Sayonara Abrantes, coordenadora e professora de língua portuguesa da Maria Clara no IFPB, que acompanhou o processo de estudos da aluna desde o primeiro ano, destaca a dedicação da estudante. "Ela sempre foi muito dedicada e estudiosa desde o início do ensino médio. Sempre se mostrou muito esforçada, tirava dúvidas e participava dos projetos do IF, como o de redação, que eu coordenava. Por isso, com seu esforço e dentro da base família-escola, ela chegou lá" comemora.

Rede de apoio

Filha de pedagoga e pai aposentado, Maria Clara destaca a importância da família e dos amigos em todo o processo de estudos. "Todos eles foram muito importantes nesses anos de dedicação. Meus pais sempre me incentivaram emocionalmente e com os materiais de estudo necessários. Meu irmão também me ajudou muito, assinando plataformas digitais para que eu pudesse estudar", lembra.

A jovem recorda, ainda, que aos 9 anos seu pai, que não tem curso superior, a incentivou a estudar matemática e a estar sempre à frente nos conteúdos da escola. "Ele sempre viu na educação uma forma dos filhos alcançarem lugares de importância na sociedade. Desde os meus nove anos meu pai me colocava para estudar um livro que estivesse à frente da minha série", conta.

Ainda na infância, paraibana nutria paixão pela escola
Ainda na infância, paraibana nutria paixão pela escola - (Foto: Arquivo pessoal)

Ela lembra, ainda, que seus amigos sempre foram compreensivos quanto à sua ausência, entendendo que ela era temporária e visava um objetivo maior. "É importante que os amigos compreendam a necessidade do afastamento das pessoas de suas vidas no momento em que ela está investindo no estudo. Além disso, os amigos são importantes nas horas de lazer, que muitas vezes são raras nesses períodos de dedicação exclusiva o aprendizado", diz.

A pedagoga Lídia Maria de Santana, mãe de Maria Clara, não esconde o orgulho da filha e lembra que ela e o marido sempre buscaram apoiá-la em tudo que pudessem. "Sempre buscamos oferecer tudo que estivesse ao nosso alcance para que a Maria pudesse estudar. Nunca cobrei que ela fizesse outras atividades, como serviços de casa, justamente para que pudesse se concentrar nos estudos. Tudo que fizemos por ela foi com muito prazer" conta.

Sayonara Abrantes, professora da jovem, é mais uma a destacar a importância da família durante os estudos. "O processo de formação de um aluno não se esgota apenas na escola. Uma das grandes bases dessa formação é justamente a família, que deve acompanhar o adolescente, orientar e dar a ele a percepção do valor da escola e dos estudos", ensina ela, destacando que o ambiente familiar de Maria Clara foi fundamental para que ela alcançasse a tão sonhada aprovação.

Decisão difícil

Maria Clara ainda tem dúvidas sobre se matricular na USP ou cursar medicina na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), onde teria uma segurança financeira maior. "Ir morar em São Paulo seria uma mudança bem significativa na minha vida, especialmente tendo em vista o tempo de curso, que é bem longo. Além disso, sem programas de auxílio financeiro não seria possível eu me manter lá" lamenta a jovem, que tem o prazo para bater o martelo até amanhã.

Ela diz que irá pensar com calma pois, se resolver se matricular na USP e depois desistir, também perderá a oportunidade de garantir sua vaga na UFPB por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). "Procuro pensar a longo prazo. Como vai ser daqui seis anos, pois medicina é um curso muito longo, terei que pensar como seria minha vida nos dois lugares", afirma. "Os auxílios estudantis são de extrema importância para incentivar e contribuir com o acesso, início e permanência na universidade, inclusive pode fazer a diferença entre desistir ou continuar", arremata a mãe da estudante, reiterando que apoiará a decisão da filha seja ela qual for.

Correio Braziliense

Nenhum comentário:

Postar um comentário