O esquema de corrupção por trás da mulher mais rica da África e seus investimentos em João Pessoa
A
fortuna de Isabel dos Santos, filha do ex-presidente da Angola, vem
causando desconfiança nos angolanos, segundo investigação toda a fortuna
foi adquirida por meios ilegais.
O
Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), com sede
em Nova York, publicou no domingo (19/01) uma coletânea de arquivos que
supostamente mostram como Santos transferiu centenas de milhões de
dólares de dinheiro público para contas no exterior. Os mais de 715 mil
arquivos – apelidados de “Luanda Leaks” – foram investigados por 120
repórteres em 20 países, incluindo Brasil e Alemanha.
Investimentos no Brasil
De
acordo com a Agência Pública, agência brasileira de jornalismo
investigativo que faz parte do ICIJ, dinheiro de Angola foi desviado
para empreendimentos imobiliários na costa da Paraíba, como a construção
de um condomínio de alto luxo em João Pessoa e de um dos mais luxuosos
resorts do litoral paraibano, com mais de cem bangalôs.
A
complexa trama de ocultação de moedas e patrimônio, operada por meio de
uma série de empresas em paraísos fiscais, envolveria Isabel dos Santos,
filha do ex-presidente, escreve a Pública.
Segundo o jornal Folha
de São Paulo, “o artigo publicado pela Agência Pública sobre as
atividades dos sócios de Isabel dos Santos na Paraíba joga luz numa nova
dimensão das relações entre Brasil e Angola, quase sempre monopolizada
pela ligação entre o PT e a Odebrecht”.
Envolvimento da Alemanha
As
emissoras públicas alemãs NDR e WDR, junto ao diário Süddeutsche
Zeitung, descobriram que a empresa de bebidas Sodiba, de propriedade de
Isabel dos Santos e seu marido, Sindika Dokolo, recebeu um empréstimo de
50 milhões de euros (cerca de 230 milhões de reais) de uma subsidiária
do banco alemão de desenvolvimento KfW sem um exame prévio e abrangente
do negócio.
O
empréstimo foi utilizado por Santos para comprar uma fábrica de cerveja
e duas linhas de engarrafamento da empresa alemã Krones AG em 2015. O
pai da empresária usou, supostamente, sua influência para obter a
aprovação do projeto de investimento.
O pesquisador e ativista de
direitos humanos Rafael Marques de Morais diz ser “justo” que países
como a Alemanha agora ajudem a investigar como atores internacionais
permitiram que a filha de 46 anos do ex-presidente angolano adquirisse
uma vasta fortuna estimada em mais de 3 bilhões de dólares.
“[A
chanceler federal alemã] Angela Merkel vai visitar Angola [em fevereiro]
e essa questão deve ser abordada: como os fundos fornecidos pelo
governo alemão também foram usados para aumentar sua riqueza [de
Santos]?”, diz o pesquisador.
“Este é um caso importante de
corrupção internacional”, afirma Morais à DW, acrescentando: “Foi o
mundo que lançou Isabel dos Santos como a empresária mais rica e
bem-sucedida, enquanto era uma ladra.”
De
acordo com o ICIJ, os documentos vazados mostram como “empresas
financeiras ocidentais, advogados, contadores, autoridades
governamentais e companhias gestoras ajudaram a esconder ativos das
autoridades fiscais”.
O bilhão roubado
Segundo
os arquivos vazados, nos últimos anos Santos e seu marido fundaram mais
de 400 empresas em 41 territórios, entre eles paraísos fiscais como
Malta, Ilhas Maurício e Hong Kong. Essas empresas se beneficiaram
continuamente de contratos públicos, serviços de consultoria e
empréstimos em Angola.
No final de dezembro passado, as
autoridades angolanas congelaram os bens de Santos no país africano,
após alegações de promotores de que ela e seu marido haviam desviado
mais de 1 bilhão de dólares das empresas estatais Sonangol e Sodiam.
Santos foi colocada por seu pai à frente da Sonangol em 2016. Mais
tarde, ela foi demitida dessa posição pelo sucessor de José Eduardo dos
Santos, o atual presidente João Lourenço.
Isabel
dos Santos continua a negar qualquer irregularidade. “Minha fortuna se
baseia no meu caráter, minha inteligência, educação, capacidade de
trabalho, perseverança”, escreveu Santos em plataformas da rede social.
Ela insiste que tanto a investigação atual em Angola quanto o “Luanda
Leaks” são ataques politicamente motivados e coordenados contra ela.
“Corrupção está matando o país”
Alguns
analistas expressaram suspeitas de que a motivação do atual presidente
não seja tanto a luta contra a corrupção, mas antes a necessidade de
consolidar seu poder depois de suceder ao governante de longa data José
Eduardo dos Santos.
Robert Besseling, diretor executivo da EXX
Africa – empresa que avalia riscos de negócios -, disse à DW acreditar
que os interesses econômicos também estariam em jogo: “[O governo]
parece estar pressionando associados, familiares e empresas a abrir mão
dos ativos de companhias-chave em Angola e em outros lugares no exato
momento em que há uma agenda de privatizações, em que o governo está
tentando vender uma grande parcela da economia”, afirma.
O
ativista e pesquisador Rafael Marques de Morais discorda dessa opinião.
Severamente perseguido por seu ativismo anticorrupção durante a era
Santos, ele diz acreditar que Lourenço esteja realmente decidido a fazer
uma limpeza no país. No entanto, também é do interesse do próprio
presidente: os angolanos estão cada vez mais preocupados com a profunda
crise econômica no país rico em petróleo, que foi precipitada também
pela pilhagem de seus recursos por uma elite corrupta.
O descontentamento não é um bom presságio para o partido do presidente
Lourenço, o MPLA, que governa o país desde a independência, há 45 anos.
“Santos esteve no poder por 38 anos e privatizou o Estado principalmente
em favor de seus filhos. É por isso que há uma investigação sobre
corrupção. E a corrupção deve terminar em Angola, porque ela está
matando o país”, diz Morais.
Necessidade de reformar o sistema judicial
Atualmente,
há muitas investigações contra funcionários do governo atuais e
antigos. Vários generais e membros do Parlamento foram indiciados, e
alguns estão presos. “Há um esforço do governo para realmente apresentar
tantos casos quanto o sistema judicial possa lidar.”
Um grande
problema, no entanto, é a falta de reforma desse sistema em Angola.
“Todos os juízes e procuradores atualmente em exercício foram nomeados
pelo próprio Santos”, explica Morais.
A imunidade concedida ao
ex-presidente Santos, que agora reside na Espanha por razões médicas,
expira em 2022. “Depois disso, espera-se que ele tenha que responder por
seus crimes perante um tribunal”, diz Morais.
Apesar da
controvérsia, na semana passada Isabel dos Santos disse que consideraria
concorrer à presidência de Angola nas eleições de 2022.
Fonte: Terra - Publicado por: Larissa Freitas
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