Ex-governadores (em um total de 26) são alvo de processos na Justiça que somam R$ 2 bilhões
Em
uma década, metade dos Estados brasileiros e o Distrito Federal tiveram
governadores implicados em suspeitas de crimes, relacionados aos seus
mandatos e suas campanhas eleitorais. São 26 ex-mandatários atualmente
investigados, denunciados ou condenados por casos de corrupção. Somados,
os valores das ações ou investigações das quais são alvo ultrapassam a
cifra de R$ 2 bilhões.
Na
avaliação de juristas ouvidos pelo Estado, as investigações no plano
estadual ganharam impulso com o avanço do trabalho dos órgãos de
controle federais nos Estados e no DF. O caso mais recente é o do
ex-governador Ricardo Coutinho (PSB), da Paraíba, denunciado (acusado
formalmente) por participação em organização criminosa responsável por
prejuízo de R$ 134 milhões aos cofres estaduais. Sua defesa diz que não
há provas das acusações, e que Coutinho é inocente.
Sete
ex-governadores já foram condenados, entre eles o emedebista Sérgio
Cabral (RJ) e o petista Fernando Pimentel (MG). Só do Rio de Janeiro,
quatro ex-governadores integram a lista: Cabral foi condenado por
corrupção ativa, passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa e
evasão de divisas. Ele já foi sentenciado em 12 ações criminais a penas
que somam 122 anos. Luiz Fernando Pezão (MDB) é réu em processo que
apura o recebimento de quase R$ 40 milhões em propinas. A defesa de
Pezão tem sustentado que as acusações não procedem.
Anthony e
Rosinha Garotinho são réus em ação por corrupção, peculato e organização
criminosa. Os dois foram presos provisoriamente em outubro do ano
passado, mas atualmente respondem em liberdade. Eles negam as
irregularidades.
O levantamento mostra que há protagonismo
da Polícia Federal e do Ministério Público Federal nos processos, ante
os órgãos de controle estaduais. Entre os 19 casos de ex-governadores
que tiveram denúncias aceitas na Justiça, 14 ocorreram na esfera
federal. Para chegar ao valor de R$ 1,5 bilhão (outros R$ 609 milhões
correspondem a investigações ou denúncias ainda não analisadas pela
Justiça) e aos 26 ex-governadores implicados, o levantamento considerou
apenas casos da esfera criminal, onde a pena é em regime fechado. Os
processos dizem respeito a atos praticados durante o mandato ou nas
campanhas eleitorais, e incluem o crime de caixa 2 – que, apesar de ser
julgado na Justiça Eleitoral, pode resultar em cadeia.
Há
processos, contra esses e outros políticos que chefiaram governos
estaduais, na esfera cível. Os casos mais comuns são de improbidade
administrativa, que podem resultar em multa e perda dos direitos
políticos. Apesar de numerosas, essas situações não foram incluídas na
contagem.
Os ex-governadores Beto Richa, do Paraná, e Marconi
Perillo, de Goiás, ambos tucanos, também foram alvo. O paranaense foi
colocado no banco dos réus por supostamente ordenar a omissão de parte
da compra de salas comerciais em Curitiba, feita pela família Richa e
paga em dinheiro vivo. Ele ficou seis dias preso. Segundo a acusação, os
bens teriam sido adquiridos com dinheiro de propina proveniente de
contratos fraudados para obras de escolas públicas.
Já o
ex-governador goiano é réu por corrupção passiva, por ter parte de uma
dívida de campanha eleitoral, no valor de R$ 90 mil, supostamente paga
em troca de um aditivo realizado em contrato do Estado com uma empresa
de engenharia. A defesa de Perillo, na ocasião, classificou a denúncia
como “fraquíssima”.
Copa. Obras para a realização da Copa do Mundo
no Brasil em 2014 causaram problemas para ao menos dois ex-governadores
do PT. No Distrito Federal, Agnelo Queiroz virou réu por corrupção
passiva em operação sobre a obra do Estádio Nacional de Brasília (Mané
Garrincha). Sua defesa disse que “jamais houve qualquer indício de
sobrepreço ou irregularidade”.
Na Bahia, Jaques Wagner é
investigado pelas obras do estádio Fonte Nova. Em 2019, a Justiça
Federal declinou a competência da investigação, suspendeu a operação e a
mandou para a Justiça Estadual da Bahia. À época, sua defesa
caracterizou as suspeitas como “factoides e inverdades” e disse que sua
inocência seria demonstrada. À exceção de Cabral, que em dezembro fechou
um acordo de delação premiada com a PF, os demais citados negam ter
praticado as irregularidades pelas quais respondem.
O
protagonismo do Ministério Público Federal, responsável por mais de 70%
das ações penais contra ex-governadores na última década, chamou
atenção de especialistas consultados pelo Estado. Eles veem mais
independência na atuação dos procuradores federais e da Polícia Federal
na comparação com órgãos estaduais.
Para o jurista Walter
Maierovitch, especializado em crime organizado, o alto número de
denúncias é resultado de mudanças no combate à corrupção em todo o
mundo, a partir de convenções internacionais.
Um dos marcos na
área é a Convenção de Palermo, que dá parâmetros para a cooperação entre
países, assinada no ano 2000 e promulgada pelo governo federal em 2004.
No
entanto, ele vê com preocupação decisões no Judiciário que alteram as
regras do combate à corrupção. “Em relação ao foro privilegiado, o que
se julgou em relação ao mensalão, de repente, não pode ser julgado na
Lava Jato. Isso cria uma instabilidade.”
Já o cientista político
Oscar Vilhena, professor de Direito na Fundação Getúlio Vargas (FGV), vê
dificuldades nos órgãos de controle nos Estado. “É uma demonstração de
que as agências de controle estaduais – polícias, MPs e tribunais de
contas, além dos próprios judiciários estaduais – têm pouca autonomia”,
diz. “Como os órgãos de controle federais não dependem dos Estados,
tendem a agir com maior autonomia.”
Fonte: Estadão - Publicado por: Fabricia Oliveira

Nenhum comentário:
Postar um comentário