Paciente com câncer em fase terminal tem alta após terapia genética pioneira obter sucesso pela 1ª vez na América Latina
Um
paciente de 62 anos que tinha linfoma em fase terminal e tomava morfina
todo dia deve receber alta no sábado (12) após ser submetido a um
tratamento inédito na América Latina. Ele deixará o hospital livre dos
sintomas do câncer graças a um método 100% brasileiro baseado em uma
técnica de terapia genética descoberta no exterior e conhecida como
CART-Cell.
Os médicos e pesquisadores do Centro de Terapia Celular
(CTC-Fapesp-USP) do Hemocentro, ligado ao Hospital das Clínicas de
Ribeirão Preto, apontam que o paciente está “virtualmente” livre da
doença. Os especialistas, no entanto, não falam em cura ainda porque o
diagnóstico final só pode ser dado após cinco anos de acompanhamento.
Tecnicamente, os exames indicam a “remissão do câncer”.
Os
pesquisadores da USP – apoiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo (Fapesp) e pelo Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq)
– desenvolveram um procedimento próprio de aplicação da técnica
CART-Cell.
Essa técnica, ainda recente, foi criada nos EUA, está
em fase de pesquisas e é pouco acessível. No EUA, os tratamentos
comerciais já receberam aprovação e podem custar mais de U$ 475 mil.
O
paciente submetido ao tratamento no Brasil é o mineiro Vamberto,
funcionário público aposentado de 62 anos. Antes de chegar ao interior
de São Paulo, ele tentou quimioterapia e radioterapia, mas seu corpo não
respondeu bem a nenhuma das técnicas.
Em
um tratamento paliativo, com dose máxima de morfina, o paciente deu
entrada em 9 de setembro no Hospital das Clínicas em Ribeirão com muitas
dores, perda de peso e dificuldades para andar. O tumor havia se
espalhado para os ossos.
O prognóstico de Vamberto, de acordo com
os médicos, era de menos de um ano de vida. Como uma última tentativa,
os médicos incluíram o paciente em um “protocolo de pesquisa” e testaram
a nova terapia, até então nunca aplicada no Brasil.
A CART-Cell é
uma forma de terapia genética já utilizada nos Estados Unidos, Europa,
China e Japão. Esse método consiste na manipulação de células do sistema
imunológico para que elas possam combater as células causadoras do
câncer.
Terapia genética
A
estratégia da CART-Cell consiste em habilitar células de defesa do
corpo (linfócitos T) com receptores capazes de reconhecer o tumor. O
ataque é contínuo e específico e, na maioria das vezes, basta uma única
dose.
Rápida melhora
Segundo os médicos,
Vamberto respondeu bem ao tratamento e logo após quatro dias deixou de
sentir as fortes dores causadas pela doença. Após uma semana, ele voltou
a andar.
“Essa primeira fase do tratamento foi milagrosa”, disse
ao G1 o hematologista Dimas Tadeu Covas, coordenador do Centro de
Terapia Celular (CTC-Fapesp) e do Instituto Nacional de Células Tronco e
Terapia Celular, apoiado pelo CNPq e pelo Ministério da Saúde.
“Não
tem mais manifestação da doença, ele era cheio de nódulos linfáticos
pelo corpo. Sumiram todos. Ele tinha uma dor intratável, dependia de
morfina todo dia. É uma história com final muito feliz.”
100% brasileiro
Renato
Luiz Cunha, outro dos responsáveis pelo estudo, explicou que a terapia
genética consegue modificar células de defesa do corpo para atuarem em
combate às que causam o câncer.
“As células vão crescer no
organismo do paciente e vão combater o tumor”, disse Cunha. “E
desenvolvemos uma tecnologia 100% brasileira, de um tratamento que nos
EUA custa mais de US$ 1 milhão. Esperamos que ela possa ser, no futuro,
acessível a todos os pacientes do SUS.”
Cunha recebeu, em 2018, o prêmio da Associação Americana de Hematologia (ASH), nos EUA, para desenvolver este estudo no Brasil.
“É um tratamento caro e que requer um desenvolvimento científico importante”, explica Cunha.
No ano passado a agência norte-americana de vigilância sanitária (FDA), aprovou nos EUA a primeira terapia gênica do mercado para leucemia linfoide aguda. Porém, o tratamento é caro e chega a custar U$ 475 mil dólares.
“É um tratamento caro e que requer um desenvolvimento científico importante”, explica Cunha.
No ano passado a agência norte-americana de vigilância sanitária (FDA), aprovou nos EUA a primeira terapia gênica do mercado para leucemia linfoide aguda. Porém, o tratamento é caro e chega a custar U$ 475 mil dólares.
O tratamento ainda não está liberado na rede pública ou
privada de saúde, por isso, Cunha explicou que, para o paciente ser
atendido no hospital universitário, o encaminhamento foi aprovado por
uma comissão de ética.
O hematologista Rodrigo Calado, professor
da FMRP-USP e membro do CTC, afirma que “esse tratamento foi possível
pelo investimento em pesquisa e formação de pessoas feito pela Fapesp e
CNPQ ao longo dos anos e que agora se traduz em um tratamento melhor e
mais eficaz em casos de linfomas refratários.”
Perspectivas para o SUS
Dimas
Tadeu Covas, que coordena o Centro de Terapia Celular do HC de
Ribeirão, disse que o procedimento poderá ser reproduzido em outros
centros de excelência do país, mas não dá datas. Isso porque, segundo
ele, depende de laboratórios controlados com infraestrutura adequada.
“Devido
à complexidade do tratamento, ele também só pode ser feito em unidades
hospitalares com experiência em transplante de medula óssea”, disse o
pesquisador. “Isso porque, durante o processo, a imunidade é
comprometida. O paciente tem que ficar isolado, não pode ficar exposto.
Não são todos os hospitais que podem fazer esse tipo de tratamento. Além
disso a terapia tem efeitos colaterais.”
A resposta imune
progressiva pode causar febres altas, náuseas e dores musculares. Os
pesquisadores não eliminam o risco de morte, e reconhecem que a forte
baixa no sistema imunológico traz um potencial fatal para alguns
pacientes.
De acordo com os envolvidos na pesquisa, antes de o
tratamento ser disponibilizado para o Sistema Único de Saúde (SUS), ele
precisa cumprir os requisitos regulatórios da Anvisa. O chamada “estudo
clínico compassivo” continua e deverá incluir mais 10 pacientes nos
próximos 6 meses.
Se as etapas de estudos e pesquisas continuarem a
se manter promissoras, Covas avalia que o tratamento pode ser adotado
em larga escala com adaptações nos laboratórios de produção. “Os
investimentos necessários para ampliação da capacidade produtiva são de
pequena monta, da ordem de R$ 10 milhões”, afirma Covas.
Fonte: G1 - Publicado por: Adriany Santos
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