TIRO, FACADA E BOMBA: saiba como são treinados os agentes que fazem a segurança do presidente Bolsoanro
O
perfil ideal de um agente da segurança presidencial é a “mistura de
Batman, Superman e Mandrake”. O perfil real é a combinação de excelente
preparo físico e psicológico, muita paciência e bom senso, na definição
do ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general
Augusto Heleno.
A
equipe responsável pela proteção do presidente da República, do vice e
de seus familiares é composta por membros das Forças Armadas e órgãos de
segurança pública, como as polícias Federal, Militar e Civil. Os
melhores são selecionados pelas próprias corporações e encaminhados ao
GSI, onde passam por aprimoramento adicional de até seis meses antes de
chegar às ruas.
O próprio Heleno admite ser um trabalho “difícil,
estafante” e que “desertaria” se tivesse que ficar cinco dias seguidos
em um corredor de hotel de olho em visitantes e perigos que possam
atentar contra a vida do chefe de Estado.
Ao longo de uma manhã em
Brasília, o UOL acompanhou o treinamento de um grupo de guarda-costas
do presidente Jair Bolsonaro (PSL) no arredores de Brasília. A rotina
passa por simulações de emboscadas ao comboio presidencial, ataques a
tiros e lutas corpo a corpo.
Porte atlético e nada de papo com o chefe
Semblante
amarrado, terno preto, óculos escuros, fone no ouvido. A cara sisuda
dos seguranças do presidente não vem de graça. Todos eles passam por
treinamentos constantes de tiro e direção, além de exercícios como
natação e artes marciais. Parte das atividades é feita nos anexos do
Palácio do Planalto. Outra, em centros específicos e clubes das Forças
Armadas em Brasília.
O desgaste físico e mental é grande. O
desempenho atlético, a habilidade ao atirar e as condições de saúde
norteiam a seleção do agente. Altura e idade também são critérios
adotados.
Flexibilidade de horário e disponibilidade para o trabalho são essenciais. A fluência em mais idiomas é desejável.
O
número de agentes empregados não é revelado pelo GSI, mas todos são
oriundos de Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Federal, Polícia
Rodoviária Federal, Polícia Militar, Polícia Civil ou do Corpo de
Bombeiros.
Das
Forças Armadas, são convocados de praças a oficiais para exercer todos
os níveis de funções necessárias. Por exemplo, desde ficar de prontidão
no jardim do Palácio da Alvorada, onde mora o presidente e a família,
até o planejamento de eventos na Esplanada.
Os salários
são compostos pelo vencimento da instituição de origem mais gratificação
correspondente à função exercida na Presidência.
As
equipes passam por revezamentos para manter a impessoalidade na função. A
avaliação é que, se um agente permanecer com a pessoa a ser protegida
por longos períodos, corre-se o risco de se criar um vínculo pessoal que
diminui a noção de perigo existente e coloque em risco a segurança de
ambos.
Um
assessor do Planalto que acompanha os presidentes da República há duas
décadas disse ao UOL que Bolsonaro é o chefe de Estado mais interage e
brinca com os seus seguranças Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem em
seguida. Michel Temer (MDB) é o mais polido, segundo ele.
As horas
diárias trabalhadas por um agente dependem da agenda da autoridade e
vão das oito horas rotineiras a até vários dias consecutivos, como em
viagens. Isso porque a segurança tem que ser ininterrupta. A equipe que
acompanha o presidente é determinada por escala prévia para que todos
tenham períodos de descanso.
“Irrequieto, impetuoso e desobediente”
Décadas atrás, a maior preocupação da segurança presidencial era conter
o “beijoqueiro”, apelido pelo qual um português ficou famoso ao tentar
agarrar e beijar celebridades de surpresa.
“Era
bem mais fácil o beijoqueiro do que hoje esfaqueador”, diz o general
Augusto Heleno, lembrando o ataque sofrido por Bolsonaro em setembro do
ano passado, durante a campanha eleitoral.
Hoje, assessores do
presidente recomendam, sem sucesso, que ele fale menos em locais
públicos e não se aproxime tanto do público para conversar, como faz
quase diariamente na portaria do Palácio da Alvorada, atendendo a
pedidos de selfies.
No desfile de 7 de Setembro, por exemplo,
chegou em carro aberto, desceu da tribuna presidencial, andou a pé e,
antes de ir embora, percorreu parte da Esplanada dos Ministérios com
metade do corpo para fora do carro fechado do comboio.
O secretário de Segurança e Coordenação Presidencial do GSI, general Luiz Fernando Baganha, diz não ter sido surpreendido.
“Nós
sabíamos que ele ia querer ir. Colocamos agentes junto à população.
Todas as arquibancadas sofreram processo de checagem. Todos passaram por
detecção de metal. Ele é impulsivo, mas sabemos disso”, afirma.
Heleno
descreve Bolsonaro como “irrequieto, impetuoso e desobediente”. Porém,
diz ele, não se pode dar ordens ao presidente. Cabe ao GSI se adaptar.
O
ministro nega que o atentado a faca contra Bolsonaro tenha mudado o
planejamento da segurança presidencial. Segundo ele, não houve grande
reforço ao redor de Bolsonaro em comparação com seus antecessores. “Às
vezes, não tem nem espaço” para colocar mais seguranças. O foco, diz, é a
melhor qualificação dos envolvidos.
“Nós
temos consciência plena de que não existe segurança 100%. As coisas são
tratadas de acordo com cada oportunidade, visita, evento. É uma
atividade altamente dinâmica. Existe um pequeníssimo grau de risco que
pode envolver uma situação desagradável”, afirma.
De acordo com Heleno, se o autor do atentado estiver disposto a morrer, provavelmente será bem-sucedido.
Bolsonaro gosta de ir para a galera. É um susto para a gente a cada
momento. Temos que assimilar isso como sendo a maneira de ser do
presidente e estamos aqui para isso. […] Não tem presidente igual. Não
tem viagem igual. Cada presidente é completamente diferente do outro.
Preparação para eventos e viagens (e imprevistos)
Antes
de evento ou viagem, um grupo multidisciplinar chamado Escav (Escalão
Avançado) é encarregado de aprovar o destino. Se for no Brasil, a equipe
vai ao local com até cinco dias de antecedência. No exterior, é
necessário viajar até 15 dias antes do presidente.
O Escav toma
conta dos preparativos até a chegada do chefe de Estado. São checados,
passo a passo, o caminho a ser percorrido pelo comboio, as condições do
palanque ou do auditório, as saídas de emergência, os locais seguros
para resgate, os hospitais disponíveis e os arredores.
A
quantidade de veículos que forma o comboio é variável, mas costuma ser
de pelo menos quatro carros. Uma ambulância sempre vai atrás.
Apesar
do planejamento, imprevistos acontecem. De acordo com Heleno, há pouco
tempo, o comboio presidencial estava saindo à noite de Guaratinguetá
(SP) em direção à Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende (RJ),
quando um dos batedores foi “acidentado”. O grupo teve de ficar parado
na estrada até que o problema fosse resolvido “com o presidente andando
para lá e para cá”.
Para ocasiões como essa no Rio, há treinamento
contra emboscadas. O UOL presenciou demonstrações de fuga em
simuladores e em pista de terra fora do centro de Brasília.
Em
casos menos extremos, como o surgimento de um obstáculo à frente, os
dois primeiros carros do comboio devem formar uma barreira física para
proteger os demais que vêm atrás. O da autoridade e da escolta dão
marcha à ré e se retiram do local em ordem programada.
A
reportagem ainda presenciou demonstração em caso de ataque sem
possibilidade de fuga do comboio. Nesse caso, a autoridade tem de ser
levada a pé em meio a tiroteio e lançamento de granadas coloridas para
atrapalhar a visão dos criminosos.
“Sob ataque, a gente tem até 3 segundos para atirar”
Em eventos fora do Planalto, Bolsonaro usa colete à prova de balas por
debaixo da camisa e é cercado por agentes com pastas marrons que, ao
sinal de anormalidade, se estendem e viram escudos com blindagem.
Uma
das maiores preocupações é o pedido de uma falsa selfie. Ou seja, de um
suposto apoiador se aproximar para tirar foto, mas, na realidade,
esfaquear ou balear o presidente.
Para
tanto, além de treinar movimentações a pé para preservar a integridade
física de Bolsonaro, os agentes devem ser presença assídua nos estandes
de tiro.
Os
seguranças treinam tiro ao alvo com pistolas e fuzis. Segundo um
instrutor, um agente da segurança presidencial tem de sacar a arma e
atirar na ameaça em até três segundos.
O uso de terno no dia a dia
é obrigatório para esconder a arma de fogo. Os óculos escuros são
opcionais, mas costumam ser usados para não revelar a direção do olhar
do agente e amenizar o reflexo da luz do sol.
Restrição a drones, mas não ao WhatsApp
Outro
âmbito que concerne à segurança presidencial é o espaço aéreo. O GSI
conta com o monitoramento da Aeronáutica e agora investe na compra de um
sistema antidrone.
O sistema poderá interceptar o aparelho
fazendo-o baixar ou voltar ao local de origem com a identificação do
operador. Poderá também ser capturado por meio de uma rede física, como
de pescador.
A intenção é evitar que os drones sobrevoem as
residências oficiais e eventos ao ar livre com a presença de Bolsonaro. O
que impede o combate ao drone com disparos é o alto risco de o tiro
atingir alguém ao voltar para o chão.
A expectativa é que o
sistema já possa ser usado na segurança dos presidentes que participarão
de cúpula dos Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e
África do Sul), cuja realização está prevista para os dias 13 e 14 de
novembro em Brasília.
Os preparativos para a cúpula já começaram e
envolvem GSI, Ministério da Justiça e Ministério das Relações
Exteriores, entre outros órgão do governo.
Quanto
à segurança cibernética, o ministro evita fazer comentários mais
contundentes. Ele diz que o GSI olha “o que pode, deve e aparece”,
porém, ressalta a limitação de recursos.
“A segurança seria mais sofisticada se tivesse mais recursos”, afirma.
No
início do ano, o presidente, vice e os ministros receberam celular da
Abin (Agência Brasileira de Inteligência) com programas próprios para
dificultar o vazamento de informações. No entanto, poucos aderiram ao
aparelho pela menor compatibilidade com sistemas usados comercialmente.
Indagado
se o celular que Bolsonaro carrega conta com alguma proteção especial,
Heleno admite que o presidente continua usando o WhatsApp para troca de
mensagens.
Alguma recomendação a mais? “Vai aparecer um emoji
daquele com ‘cuidado presidente!'”, brinca, para então negar que já
recebeu figurinhas de Bolsonaro.
Fonte: Uol - Publicado por: Gerlane Neto
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