Ministro Paulo Guedes tem pronta Medida Provisória que revê regras da Previdência
Foto: Rafael Carvalho/Governo de transição |
A
equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, já redigiu e está prestes
a lançar uma MP (medida provisória) que busca fazer uma ampla revisão
das regras da Previdência.
A proposta do novo governo é dar um
passo moralizador em relação à legislação, corrigindo imprecisões e
distorções na lei que abrem margem para concessões irregulares de
benefícios e mesmo para a corrupção.
Trata-se de ajustes simples,
mas com grande efeito financeiro, como impor mais rigor na liberação de
benefícios da Previdência rural e estabelecer normas para reaver
recursos liberados via decisões judiciais que mais tarde são cancelados
no julgamento final da causa.
Cálculos preliminares indicam que
essa reestruturação legal abriria espaço para fazer uma economia anual
de ao menos R$ 50 bilhões ao longo de uma década.
Essa revisão
normativa não depende de emendas constitucionais, mas é considerada
radical. Quem teve acesso ao texto diz que as mudanças são mais
ambiciosas que as apresentadas na reforma dos economistas Armínio Fraga e
Paulo Tafner, que também propunha mudanças legais em normas não
incluídas na Constituição.
O grande teste dessa estratégia tende a ocorrer no Congresso Nacional.
Diante
das dificuldades para aprovar uma reforma da Previdência, o governo
Dilma Rousseff também optou por fazer ajustes de normas via medida
provisória, mas encontrou forte resistência no Congresso, que precisa
aprovar as MPs para que virem lei.
Entre as propostas enviadas
pela petista em 2015, por meio do então ministro da Fazenda, Joaquim
Levy, estavam regras mais duras para concessão de pensão por morte e
auxílio-doença. As mudanças foram barradas parcialmente pelo
Legislativo, e o governo cedeu em vários pontos, reduzindo o alcance
fiscal do pacote.
O governo Michel Temer tentou usar um MP para
elevar a contribuição previdenciária dos servidores e foi impedido pelo
STF (Supremo Tribunal Federal).
O pente-fino legal seria um
primeiro passo para a reforma. O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni,
afirmou nesta terça-feira (1º) que a proposta de reforma da Previdência
está “amadurecida” e que equipe de Guedes deve fazer uma reunião com o
presidente Jair Bolsonaro para apresentar a proposta.
Lorenzoni
não deu detalhes, mas o ministro Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral)
disse também nesta terça (1º) que a tendência é que seja apresentada uma
proposta fatiada, como afirmou Bolsonaro durante o governo de
transição.
Segundo Onyx, o presidente deve aproveitar os próximos
dias para fazer medidas de “simplificação”, que podem ser anunciadas até
o fim da semana.
“Pegar toda essa parafernália de instrução
normativa, resolução, portaria ministerial e tirar tudo isso da frente.
Porque o Congresso vota uma coisa e a burocracia aqui muda tudo”,
afirmou o ministro.
Economistas ouvidos pela Folha consideram que,
na área fiscal, o grande desafio do governo de Jair Bolsonaro em 2019
justamente este: preparar o terreno para que 2020 não se transforme numa
grande fonte de dor de cabeça.
Neste ano, o rombo nas contas
públicas, dizem especialistas, deve ser inferior ao previsto pelo
próprio governo, e o teto fixado para os gastos não corre o risco de ser
rompido.
A preocupação é fechar as contas dos anos seguintes.
Para
isso, caberá a Guedes emplacar reformas estruturais consideradas
fundamentais —sendo justamente a da Previdência a grande dívida deixada
pelo governo Temer.
“O Brasil é como uma pessoa empregada que tem
algum dinheiro para pagar suas contas nos próximos meses, mas compromete
mais de 90% do seu orçamento com coisas que não pode cortar e que só
crescem”, ilustra Fernando Honorato Barbosa, economista-chefe do
Bradesco.
“O lado positivo é que o sujeito está empregado e tem alguma chance de escapar.”
Os gastos obrigatórios do governo consomem hoje a cerca de 92% dos gastos totais.
“Sobram
menos de 10% sobre os quais o governo tem algum controle, mas que são
necessários, por exemplo, para tocar a máquina pública”, diz Pedro
Schneider, economista do Itaú Unibanco.
Schneider ressalta que a
Previdência é a primeira candidata à reforma porque aposentadorias e
pensões consomem metade dos gastos obrigatórios e crescem cerca de R$ 20
bilhões por ano.
No total, os gastos com a Previdência encostam
nos R$ 750 bilhões —a maior despesa da União, à frente dos gastos com
juros, em torno de R$ 350 bilhões.
Em 2019, o governo entra no
sexto ano consecutivo com rombo em suas contas (gastando mais do que
arrecada), situação sem paralelo em toda a história.
Diante dos
sucessivos déficits, a dívida bruta sobe com força desde 2014 e deve
encerrar 2019 perto de 78% do PIB (Produto Interno Bruto).
O nível é considerado alto se comparado à média dos países emergentes, ao redor de 55% do PIB.
A previsão do Bradesco é que a dívida cresça moderadamente até 2023, se aproximando de 80% do PIB.
Para
estabilizá-la hoje, o banco estima que seria preciso uma economia de
cerca de R$ 270 bilhões —ou quase dez vezes o Bolsa Família.
Apesar
do cenário preocupante, o quadro fiscal é menos urgente no curto prazo
porque se baseia em expectativas de aceleração do crescimento econômico
(para 2,5%) e juros e inflação mais baixos, que ajudam a comprar mais
tempo.
“O que estamos vendo nos mercados de juros, que são um
componente importante da dívida, permite um conforto de seis meses a um
ano. Imagine estar nessa discussão fiscal com a taxa Selic a 14%? O
governo assumiria tendo que fazer reforma no dia 1º”, diz Honorato, do
Bradesco.
No caso do teto de gastos, cortes em subsídios e, em
especial, em investimentos do governo —considerados cruciais para a
retomada— dão a folga para 2019.
Já o déficit primário do governo
central (que exclui o pagamento de juros) deve ficar em R$ 94 bilhões em
2019, segundo o Bradesco. O Itaú prevê rombo de R$ 96 bilhões, ambos
abaixo da meta de R$ 139 bilhões do governo.
Com relação ao
déficit, Paulo Guedes prometeu zerá-lo durante a campanha de Bolsonaro,
algo considerado factível, diz Miryã Neves Bast, economista do Bradesco.
Para
isso, basta que o governo consiga arrecadar os R$ 100 bilhões esperados
no leilão do pré-sal e opte por usar os recursos para abater o rombo.
“Mas
ainda haveria um déficit nos anos seguintes porque as despesas seguem
crescendo, ainda que num ritmo menor em razão do teto”, diz Bast.
Além
da reforma da Previdência, Schneider, do Itaú, diz que o caminho do
equilíbrio fiscal passa pela revisão dos gastos do funcionalismo e do
reajuste do salário mínimo, que tem efeito sobre 70% das aposentadorias.
Para
Fernando Montero, economista-chefe da corretora Tullett Prebon, a
conjuntura (retomada econômica com juros baixos) pode ajudar as contas,
mas reformas terão de ser encaminhadas. “O fiscal deixou de ser questão
ideológica para ser apenas lógica.”
Folha de São Paulo
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