Voto útil, abstenções e outros três fatores que podem ser decisivos na reta final
A BBC News Brasil reuniu dados das mais recentes pesquisas e ouviu especialistas para entender quais seriam estes elementos.
1 – Preferência ou ‘voto útil’?
A
pesquisa do Ibope de 26 de setembro questionou os entrevistados a
respeito do chamado “voto útil” – a possibilidade de o eleitor deixar de
votar no candidato de sua preferência para votar em outro que considere
mais competitivo contra um terceiro.
E 28% dos entrevistados naquela ocasião afirmaram que essa probabilidade era alta ou muito alta.
Essa
porcentagem é semelhante às intenções de voto do líder da pesquisa,
Jair Bolsonaro (PSL), e supera a do segundo colocado, Fernando Haddad
(PT).
Segundo a pesquisa, 10% dos eleitores de
Bolsonaro, 17% dos de Haddad, 21% dos de Ciro Gomes (PDT) e 14% dos de
Alckmin admitiam a possibilidade de mudar sua escolha nas urnas para
fazer voto útil.
“Já tivemos alguns casos memoráveis
de voto útil (mudando o rumo de eleições), por exemplo em 1988, quando
Luiza Erundina ganhou a prefeitura de São Paulo com o voto útil contra
Paulo Maluf, em 1998, quando Mario Covas ia mal nas pesquisas (para
governador de São Paulo), mas recebeu o voto de vários eleitores que
abandonaram Marta Suplicy e foi eleito em segundo turno”, explica à BBC
News Brasil o cientista político Carlos Melo, professor do Insper.
No
entanto, diz Melo, a grande dúvida é o quanto a atual volatilidade
pode, de fato, ter efeito concreto, já que a eventual migração de votos
pode se pulverizar entre diversos candidatos e ser insuficiente para
alterar o cenário atualmente mais provável de segundo turno, entre
Bolsonaro e Haddad.
Na pesquisa Datafolha
divulgada na noite de terça-feira, as intenções de voto em Bolsonaro
subiram para 32%, o que corresponde a 38% dos votos válidos. A
trajetória ascendente do candidato às vésperas das eleições fez
analistas começarem a considerar como possível, ainda que não provável,
uma vitória já no primeiro turno.
“O
voto útil existe e há movimentos de última hora do eleitorado, mas a
questão nesta eleição é: quem vai capitalizar com uma (eventual)
mudança? Se os antipetistas, por exemplo, forem fazer voto útil, eles
vão votar em um mesmo candidato? É um fenômeno mais complexo do que no
passado, porque hoje temos duas grandes frentes de rejeição (PT e
Bolsonaro) e campos múltiplos (por exemplo, Geraldo Alckmin, Ciro Gomes e
Marina Silva) que podem receber essa rejeição”, agrega o cientista
político.
2 – Os mais rejeitados?
O
alto índice de rejeição dos candidatos mais bem colocados nas pesquisas
de intenção de votos é a principal força por trás do eventual voto útil
discutido acima. Segundo pesquisa Datafolha divulgada nesta
terça-feira, 2 de outubro, 45% dos eleitores dizem que não votariam em
Bolsonaro de jeito nenhum. Para Fernando Haddad, esse índice é de 41%.
Juntos,
os dois candidatos têm cerca da metade das intenções de voto dos
brasileiros – só em 1989 os dois primeiros colocados tiveram tão pouco,
tão perto da data das eleições.
“Só existe voto útil
por causa da alta taxa de rejeição”, afirma Melo. “De alguma forma, o
voto de rejeição está se alinhando. A questão é se vai se alinhar em um
terceiro nome ou se vai se pulverizar entre dois ou três candidatos”,
que podem acabar tendo uma votação parecida no final, mas não suficiente
para levar um deles ao segundo turno.
3. Quem levará o voto das mulheres?
As
menções às mulheres feitas pelos candidatos durante os debates de TV
dão pistas de quão cobiçado é o voto feminino nesta reta final, por dois
motivos principais: o primeiro é que elas compõem 52% do eleitorado do
total; o segundo é que o candidato mais bem colocado, Jair Bolsonaro, é
também o que tem o maior índice de rejeição feminina – 52%, segundo o
Datafolha.
Um exemplo dessa reprovação foi dado pelos
protestos de sábado, na campanha #EleNão, organizados por mulheres em
diversas cidades do país.
O impacto das manifestações
lideradas por mulheres, no entanto, pode não ter tido o efeito
desejado. Segundo uma pesquisa da USP, a maior parte das adesões ao
protesto em São Paulo veio de mulheres que já rejeitavam o político e o
que se viu nas pesquisas posteriores foi justamente um avanço de
Bolsonaro entre eleitoras mulheres.
Apesar
de continuar líder na rejeição feminina, a pesquisa do Datafolha
publicada na terça-feira mostra que o candidato do PSL cresceu em
intenções de voto entre as mulheres, passando de 21% para 27%.
Do
ponto de vista de Bolsonaro, que tem quase um terço das intenções
totais de voto disponíveis, cerca de 20 pontos percentuais são de homens
e 10 são de mulheres, aponta Carlos Melo.
“Ou
seja, um terço dos votos dele vem de mulheres que não foram
sensibilizadas pelas falas (consideradas de cunho machista) ou pelas
campanhas anti-Bolsonaro”, avalia Melo.
Segundo
dados levantados pela BBC News Brasil, nunca havia existido uma
diferença tão grande no voto de homens e mulheres no período
pós-ditadura.
4. Abstenções, brancos e nulos
O
percentual de eleitores que dizem pretender votar nulo, branco ou se
abster caiu para 8% (tendo chegado a 22%), segundo o Datafolha, mas esse
grupo ainda pode ter um papel muito relevante no pleito.
Para
Lucio Rennó, professor-associado do Instituto de Ciência Política da
Universidade de Brasília, as pesquisas de intenção de voto muitas vezes
não captam plenamente o impacto das abstenções e dos votos nulos e
brancos porque nem sempre as pessoas admitem, durante a entrevista, a
intenção de não comparecer às urnas.
“A
abstenção pode ser influente, por se tratar de um pleito competitivo e
porque as pesquisas têm sinalizado tendências de voto, e não
necessariamente a votação absoluta dos candidatos”, diz ele.
Analisando os dados da eleição de 2014, Rennó identificou uma abstenção maior nos Estados brasileiros mais pobres.
A
abstenção e anulação são importantes porque acabam reduzindo o patamar
necessário para um candidato ser eleito em primeiro turno – ele precisa
ter mais da metade dos votos válidos, que excluem os nulos, brancos e
abstenções.
Na
eleição à prefeitura de São Paulo em 2016, por exemplo, João Doria
(hoje candidato ao governo do Estado) venceu com 53,2% dos votos úteis,
mas teve votação menos expressiva (3,085 milhões de votos) do que o
total de eleitores que anulou ou se absteve (3,096 milhões).
E
em um eventual segundo turno, será que a abstenção pode alcançar níveis
recordes caso se confirme um cenário com dois candidatos com alta
rejeição (Bolsonaro x Haddad)?
Rennó acha difícil
especular – e pensa que o efeito pode acabar sendo o oposto. “Às vezes,
em um pleito mais competitivo, o comparecimento pode aumentar”, opina.
Fabio
Wanderley Reis, cientista político da UFMG, acredita em efeito
semelhante: “As pessoas estão em posição beligerante, então o mais
provável é que as pessoas votem no segundo turno no candidato a que
tiverem menos aversão, para neutralizar o adversário”.
5. O imponderável
Para
Carlos Melo, do Insper, um último fator não pode ser descartado como
potencial influenciador do voto na última hora: o imprevisível.
“Alguma
denúncia nova, alguma delação premiada ou algum escândalo pode ter um
efeito importante quando temos uma eleição acirrada – se você muda 10
pontos percentuais de um candidato para outro já vira um aumento de 20
pontos”, diz.
Ele cita como exemplo novamente a
disputa de 1988 pela prefeitura de São Paulo: seis dias antes da
eleição, uma ação do Exército contra uma greve em siderúrgica de Volta
Redonda (RJ) resultou na morte de três operários, gerando uma onda de
indignação pelo país.
Isso acabou influenciando o
desempenho de Paulo Maluf (à época visto como próximo aos militares) nas
urnas e gerando uma onda de apoio à candidatura da então petista
Erundina.
Fonte: Terra - Créditos: Paula Adamo Idoeta - Publicado por: Ivyna Souto
Nenhum comentário:
Postar um comentário