A eleição passará à História como aquela que foi ditada de dentro da carceragem da Polícia Federal e, em sua reta final, de um leito hospitalar
Parâmetros a menos de um mês das eleições são inéditos e não permitem previsões
Por Vera Magalhães
A eleição
presidencial de 2018 passará à História como aquela que foi ditada, em
sua maior parte, de dentro da carceragem da Polícia Federal e, em sua
reta final, de um leito hospitalar.
Um mês antes do pleito, o
atentado contra a vida de Jair Bolsonaro foi o mais dramático episódio
de um processo já eivado de ineditismos – políticos, jurídicos,
institucionais, sociológicos, econômicos – e já marcado pela polarização
do eleitorado nos dois extremos do espectro ideológico.
O
resultado a longo prazo da tentativa de assassinato do líder nas
pesquisas, logo depois da interdição do outro pela Justiça Eleitoral, é
imprevisível. Como ocorreu num prazo curtíssimo até que os brasileiros
tenham de ir às urnas, o que se terá será um pouso eleitoral por
instrumentos, dadas as condições climáticas adversas. Dependerá,
portanto, da habilidade de cada um dos atores da campanha.
A
primeira reação dos opositores diretos de Bolsonaro, os demais
candidatos, foi de respeito e cautela. Não houve entre os principais
candidatos nenhum que minimizasse a gravidade do atentado, culpasse a
vítima ou tentasse obter dividendos eleitorais. O que é bom.
As
manifestações que flertaram com o oportunismo político vieram, como tem
sido em todo o ciclo político que se iniciou com a Lava Jato, dos
extremos.
A ex-presidente Dilma Rousseff fez questão de reavivar a
memória dos brasileiros de como pode ser desastrosa e equivocada quando
fala. Ao transferir para a vítima a responsabilidade por quase ter
morrido apostou no “nós contra eles”, retórica perniciosa que permitiu
a Lula criar postes como ela e cindir o País em dois enquanto operava a
pilhagem do Estado em conluio com empreiteiras e aliados.
Do
extremo oposto, dirigentes do PSL e a família de Bolsonaro também
flertavam com o caos ao culpar a imprensa ou adversários do candidato
pelo crime cometido por Adelio Bispo de Oliveira, o que é irresponsável
num momento de extrema gravidade institucional pela qual passa o País.
Não
é possível saber se esse clima de nervosismo político, natural em
episódios que provocam forte comoção nacional, prevalecerá nas quatro
semanas que nos separam do primeiro turno.
Dependerá de como as outras candidaturas e o estafe de Bolsonaro se comportarem no que resta de campanha.
O
deputado terá uma recuperação difícil pela frente. Mas já ficou claro
que estará mais presente do que nunca, pelo protagonismo natural que
adquiriu no noticiário e pela disposição de seus aliados de mantê-lo
presente nas redes sociais, o hábitat natural em que Bolsonaro construiu
sua resiliência e no qual montará seu palanque.
Os adversários se
recolheram nos dias que se seguiram ao atentado, mais até que o próprio
Bolsonaro. Precisarão encontrar um discurso que mantenha no ambiente
público a (mais do que nunca) necessária discussão sobre a necessidade
de reconstruir o tecido social e institucional do Brasil, condição de
partida para a recuperação da economia e a construção de um governo,
dado que hoje temos apenas um arremedo canhestro de um.
Não se
pode interditar o debate, porque isso significaria abandonar o eleitor à
própria sorte no nevoeiro de mistificação que encobre o processo
sucessório desde o início.
O desafio é fazê-lo sem que pareça que
atacam alguém fisicamente fragilizado, que passou a contar com uma onda
de empatia depois do atentado inaceitável capaz de quebrar, ao menos num
primeiro momento, a forte rejeição que enfrentava em setores do
eleitorado.
A melhor forma é com o resgate da racionalidade, do
bom senso, da responsabilidade e da grande política, valores em falta
nas atuais condições climáticas de um país operado por aparelhos.
Fonte: Estadão - Créditos: Vera Magalhães - Publicado por: Gutemberg Cardoso
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