Maioria do Supremo Tribunal Federal proíbe condução coercitiva para interrogatório
Nesta quinta, a maioria dos ministros manteve a liminar e decidiu o mérito da questão, proibindo em definitivo que a polícia leve coercitivamente pessoas investigadas para depor
© José Cruzr/Agência Brasil
A condução coercitiva para
interrogatório, que ficou famosa na Lava Jato, é inconstitucional e fere
o direito do investigado de ficar em silêncio e de não produzir provas
contra si mesmo, decidiu a maioria do Supremo Tribunal Federal nesta
quinta-feira (14). Até o momento, 6 dos 11 ministros votaram por proibir
esse instrumento: Gilmar Mendes (relator), Rosa Weber, Dias Toffoli,
Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello.
Quatro votaram pela legitimidade da medida: Alexandre de
Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. O julgamento
ainda não terminou. Falta a presidente da corte, ministra Cármen Lúcia,
votar -o que não deve alterar o resultado.
Os magistrados estão
julgando duas ações que questionam as conduções coercitivas para
interrogatório. As ações foram ajuizadas pelo PT e pela OAB (Ordem dos
Advogados do Brasil), que sustentam que a medida viola o direito dos
suspeitos de permanecer em silêncio e de não se autoincriminar.
Desde
dezembro passado, as conduções coercitivas para esse fim estão
suspensas por uma liminar de Gilmar. Nesta quinta, a maioria dos
ministros manteve a liminar e decidiu o mérito da questão, proibindo em
definitivo que a polícia leve coercitivamente pessoas investigadas para
depor. Gilmar, Toffoli, Lewandowski e Marco Aurélio enfatizaram em seus
votos um ponto em comum: que um sistema penal punitivista afeta também
pessoas pobres, e não só políticos corruptos.
"A legislação não se
aplica somente àqueles envolvidos em possível prática de corrupção, não
se aplica somente ao crime do colarinho branco. Não são apenas esses
que são conduzidos [pela polícia]. São os envolvidos em geral em prática
criminosa. Queremos no Brasil dias melhores? Queremos todos nós. Mas
não podemos partir para o justiçamento, sob pena de não ter-se mais
segurança jurídica, vivendo a sociedade a sobressaltos", disse Marco
Aurélio.
Ao votar, Lewandowski louvou a "jurisprudência
garantista" da corte e mencionou decisões recentes nesse sentido, como o
habeas corpus que liberou da prisão mulheres grávidas que cometeram
crimes de menor potencial ofensivo. "É chegado o momento em que o
Supremo, na tutela da liberdade de locomoção, impeça interpretações
criativas que atentem contra o direito fundamental de ir e vir e contra a
garantia do contraditório, da ampla defesa e da não autoincriminação",
afirmou Toffoli.
Na
semana passada, quando o julgamento começou, Gilmar classificou as
conduções coercitivas de "novo capítulo da espetacularização da
investigação que ganhou força no país". "Combate à corrupção tem que ser
feito nos termos estritos da lei. Quem defende direito alternativo para
combate à corrupção já não está no Estado de direito", sustentou.
VENCIDOS
Moraes,
Fachin, Barroso e Fux votaram pela legalidade do instrumento,
ressaltando que deve ser garantido ao investigado o direito de ficar em
silêncio e de ser assistido por seu advogado. O voto de Moraes foi mais
restritivo. Para ele, a condução coercitiva para interrogatório só é
permitida quando o investigado tiver sido intimado previamente e não
tiver comparecido.
Já Fachin, Barroso e Fux admitiram essa
hipótese e, além dela, que a condução pode ser empregada em substituição
às prisões cautelares (temporária ou preventiva) -tipo de uso que foi
comum nas operações da Lava Jato sob responsabilidade do juiz Sergio
Moro. O argumento dos ministros era que, em benefício do suspeito, o
juiz poderia trocar uma medida mais gravosa (prisão) por outra menos
gravosa (condução) se entendesse ser suficiente para a investigação.
"Compreendo
possível e constitucionalmente adequada a condução coercitiva [...]
sempre que for em substituição a uma medida cautelar mais grave, como a
prisão temporária ou preventiva, por conveniência da instrução penal",
afirmou Fachin, relator da Lava Jato no STF, legitimando as práticas da
operação.
Essa posição, contudo, foi vencida. Fachin e Barroso
disseram, ao votar, que há um discurso corrente em prol da manutenção de
um sistema penal leniente com crimes de colarinho branco que vem
disfarçado de preocupação com os direitos dos mais pobres.
"Entendo
ser o sistema criminal no Brasil notadamente injusto e desigual. Há
rigor excessivo contra uma parcela desabastada da população e
injustificada leniência quando criminosos estão às voltas com práticas
de corrupção", declarou Fachin. O "surto de garantismo", na verdade, "é
um mal revestido de bem", afirmou Barroso.
Agentes da Lava Jato dizem acreditar que, com o fim desse
instrumento, o número de prisões temporárias deve aumentar.
Política ao Minuto com
informações da Folhapress
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