Políticos admitem 'caixa três' da empreiteira Odebrecht em campanhas
Construtora usou empresas laranjas para fazer os repasses de dinheiro aos candidatos
© Paulo Withaker/Reuters
Apelidado pelos executivos da Odebrecht de "Boca Mole", o
deputado Heráclito Fortes (PSB-PI) é um dos políticos que admitem ter
recebido da empreiteira doação eleitoral por meio de empresas laranjas.
A prática, chamada de "caixa três", consiste em uma triangulação do
dinheiro de campanha com o objetivo de escamotear quem era o real
financiador. A fórmula é uma variação do legal "caixa um" - o valor doado
sem intermediários e declarado à Justiça - e do ilegal "caixa dois",
que é a movimentação de recursos de campanha por fora.
"Eu declarei, foi tudo por dentro. Não sei por qual motivo a
Odebrecht não quis dar o dinheiro e passou para outras duas empresas.
Acho que havia muita pressão na época e ela não queria aparecer muito",
diz Heráclito.Só nas eleições de 2010, a Odebrecht - a principal
empreiteira investigada nos devios da Petrobras - usou o caixa três para
direcionar R$ 5,5 milhões para 28 candidatos.
Na prestação de contas eleitorais desses políticos, a empreiteira não
figurou como a real fonte dos recursos, e sim a Praiamar e a Leyroz. As
investigações apontam que essas duas empresas eram distribuidoras do
grupo Petrópolis, fabricante da cerveja Itaipava.
Em delação premiada, executivos da Odebrecht contaram ao Ministério
Público que a cervejaria foi usada diretamente em 2014 para replicar o
esquema. De acordo com explicações dadas aos procuradores, havia dois
motivos para a utilização do modelo: não estourar o teto estabelecido
por lei para doações e evitar cobranças de políticos preteridos.
"Na verdade a empresa [Odebrecht] me fez uma doação e apareceu por
meio dessas duas empresas", disse o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que
nega conhecer a Praiamar e a Leyroz.
"Não tenho a menor ideia [do porque da triangulação]. Como é a doação
empresarial? Você vai na empresa e declina a sua conta. Aí aparece
essas empresas [na prestação de contas]."
Já o líder da bancada do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP), diz que
recebeu das duas empresas, mas afirma não se lembrar das circunstâncias
nem conhecer a relação delas com a Odebrecht.
Nas palavras do Ministério Público, trata-se de uma "inequívoca
ilicitude", um "engodo, uma artimanha para mascarar o verdadeiro autor
da doação, que por vias indiretas injeta dinheiro em uma campanha sob o
véu do anonimato".
"Está-se diante de uma nova modalidade de contabilidade espúria de
campanha", diz o MP."Só existe um modo de financiamento legal, que é o
caixa 1 puro. O resto está no campo das ilegalidades", diz o ministro
Herman Benjamin, do Tribunal Superior Eleitoral. Ele relatou o pedido de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer.
Presidente do TSE, Gilmar Mendes diz que é preciso examinar caso a
caso e que, a princípio, o problema maior é do doador. "Não precisa
haver necessariamente crime. Herman e o Ministério Público veem crime em
tudo. Se se trata de manipular limites de doação podemos ter um
problema", afirma, se referindo ao teto de doações de empresas, de 2% do
faturamento bruto.
O financiamento empresarial acabou em 2015, ano em que o Supremo Tribunal Federal proibiu a prática.
A reportagem também procurou as assessorias dos tucanos Aécio Neves,
senador afastado, e Bruno Araújo, ministro das Cidades, que também
receberam da Praiamar e da Leyroz. Não houve resposta.
A Odebrecht disse que a empresa está colaborando com a Justiça no
Brasil e nos países em que atua. "Já reconheceu os seus erros, pediu
desculpas públicas".
A assessoria da Petropólis afirmou que a Leyroz e a Praiamar eram
distribuidoras terceirizadas de produtos do Grupo Petrópolis. "Todas as
doações feitas pelo Grupo Petrópolis seguiram estritamente a legislação
eleitoral."
Notícias ao Minuto com informações da Folhapress.
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