Falta de cirurgia bariátrica mata até 45 mil pacientes no país por ano, diz estudo

A
longa fila de espera para cirurgia bariátrica no Brasil provoca mortes
evitáveis e custos ao sistema de saúde. Pesquisa estimando consequências
da demora no acesso ao procedimento mostra que, a cada mil pacientes
que aguardam a cirurgia, cinco morrem por ano de espera. Como a
estimativa dos pesquisadores é de que até 9 milhões precisem da cirurgia
no País - aqueles na fila e os que ainda necessitam de encaminhamento -
e só 1,5% deles sejam operados, a não realização da bariátrica causa
até 45 mil óbitos evitáveis por ano.
Já o custo extra ao sistema público de saúde, segundo o estudo, é de U$
720 milhões anuais (cerca de R$ 2,3 bilhões). A cada mil pacientes, são
US$ 80 mil (aproximadamente R$ 256 mil) gastos a mais, a cada ano, por
complicações da obesidade.
Liderado pelo médico Ricardo Cohen, coordenador do centro de obesidade e
diabete do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, o estudo usou um modelo
estatístico para calcular todos os prejuízos sofridos pelos pacientes
que esperam na fila. Os pesquisadores compararam indicadores de eficácia
e custo em vários cenários: não realização de cirurgia, operação
imediata após a indicação do procedimento e espera de um, dois, quatro e
sete anos na fila.
Os cientistas verificaram que o paciente que espera sete anos na fila
tem 18% mais chance de morrer do que o doente operado de imediato. No
Brasil, o tempo médio de espera por cirurgia bariátrica na rede pública é
de três a quatro anos, mas pode ser muito maior em algumas cidades.
"O obeso já tem risco maior de morte cardiovascular do que a população
em geral. Quanto mais ele espera pela cirurgia, maior a chance de
complicações associadas à doença, como quadros de hipertensão, enfarte e
derrames", comenta Cohen, que teve o estudo publicado em abril na
revista científica Soard, periódico da Sociedade Americana de Cirurgia
Bariátrica e Metabólica. "Mostramos, portanto, que a intervenção precoce
salva vidas", completa.
Para Caetano Marchesini, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia
Bariátrica e Metabólica, a realização mais rápida da cirurgia não
evitaria somente as mortes, mas também sequelas desenvolvidas pelos
pacientes com obesidade grave. "Os derrames podem deixar sequelas
irreparáveis. Outros problemas comuns são apneia do sono, dificuldade
respiratória e problemas osteoarticulares causados pelo excesso de
peso", afirma Marchesini. Todos esses quadros exigem tratamentos
contínuos que sobrecarregam o sistema de saúde.
Demora
Com 116 quilos, a empregada doméstica Miriam Maria de Lima, de
41 anos, está desde 2013 na fila da cirurgia bariátrica na rede pública
de Pernambuco, que conta só com quatro hospitais públicos que realizam a
técnica. Durante os anos de espera, desenvolveu um grave problema de
joelho - que a impediu, por meses, de trabalhar - além de hipertensão e
aumento da taxa de glicose.
Também acabou entrando em um quadro de depressão e ansiedade. "Vi minha
saúde se deteriorando aos poucos e isso tudo mexeu demais comigo. Por
causa do problema do joelho, que foi em grande parte causado pelo
excesso de peso, deixei de trabalhar, de dançar, de usar salto alto, de
sair, passear. Durante meses praticamente deixei de viver. Não tinha
mais alegria e isso foi ruim. Foi difícil conseguir energias, forças
para seguir em frente e continuar lutando", contou.
Em março, ela foi incluída no programa de um hospital estadual para a
realização do procedimento. A espera, porém, ainda não acabou, já que o
prazo máximo para que o paciente passe pela cirurgia após entrar no
programa é de dois anos.
O comerciário Apolônio Dias, de 38 anos e com 139 quilos, se inscreveu
para fazer a cirurgia em dois hospitais, mas ainda não há previsão. "Já
são dois anos esperando e só faço engordar cada vez mais. Desde o ano
passado estou com pressão alta e diabetes, além de alterações nas taxas
do colesterol."
Segundo Dias, a informação que recebe das equipes de triagem é de que a
média de espera - nos programas em que está inscrito - é de três a
quatro anos. "Nesse tempo, não sei o que pode mais acontecer. No mês
passado, um rapaz que também estava tentando entrar na fila morreu por
causa de complicações da diabete. Tinha 28 anos. Estou preocupado. Se
tivesse condições, já tinha procurado serviço particular, mas
infelizmente não tenho", afirma.
Disparidade
Quem tem acesso à rede particular ou a plano de saúde, de
fato, consegue passar pela operação mais rapidamente. Tanto é que
enquanto a rede privada realiza cerca de 110 mil cirurgias bariátricas
por ano, a rede pública faz só 8 mil. Em cinco Estados, o SUS (Sistema
Único de Saúde) não tem nenhum centro que realize a cirurgia: Amazonas,
Goiás, Roraima, Rondônia e Amapá. Nesses casos, os pacientes precisam
entrar na fila de hospitais de outras unidades da federação.
PB Agora
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