terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Triste realidade

Sertão nordestino enfrenta pior seca em um século; região é castigada pela falta de chuva

Restos de animais no sertão de Quixeramobim, Ceará
O crânio de uma vaca jaz exposto sob o sol escaldante do sertão. Ao seu lado, um bezerro se decompõe recostado a um arbusto ressecado. É a imagem da desolação no Nordeste do Brasil, que enfrenta a pior seca em um século.
É neste local empoeirado que pecuaristas do semiárido cearense deixam seus animais mortos. Em meio a cactus e arbustos, contam-se ao menos trinta esqueletos de vacas, burros e cabras.
"A maioria dos animais morreu de sede ou porque o alimento não foi suficiente. Infelizmente, essa é a realidade, é o resultado destes cinco anos de seca", conta à AFP Kerginaldo Pereira, um agricultor de 30 anos, que deixou uma de suas vacas e vendeu três bezerros e dez ovelhas "esqueléticas" porque não conseguia mantê-las.
Ainda que a seca acompanhe a história desta região castigada, a memória coletiva não registra outra seca pior ou mais longa que a atual.
A explicação dada pelos climatologistas é que uma série de fatores combinaram-se perversamente: a predominância do fenômeno El Niño no Pacífico, o aquecimento do Atlântico Norte e as mudanças climáticas, que no Ceará se traduziram em aquecimento de 1,3º nos últimos 50 anos.
Desde 2012, praticamente não chove no sertão. Prova disso é que quilômetros de sua vegetação - a caatinga - está desmatada e escura, como se tivesse acontecido um grande incêndio.
Os rios e açudes que abasteciam as populações rurais não estão em situação melhor. As autoridades consideram que as represas trabalham com 6% de sua capacidade, mas algumas literalmente evaporaram.
A dramática situação traz, muitas vezes, uma difícil escolha para os moradores da região: conseguir água para os animais ou para as pessoas.
E, com muita dor, Kerginaldo e as 70 famílias do remoto assentamento de Nova Canaã, polo leiteiro de Quixeramobim, foram enterrando vacas enquanto procuram alternativas para sobreviver.
- Dependentes de ajuda -
Atividades cotidianas como fazer a higiene pessoal, lavar roupa ou, inclusive, beber água se tornaram um luxo no sertão, que se estende por oito estados do país.
Dos 25 milhões de habitantes, pelo menos três milhões sofrem com o desabastecimento total de água, um milhão deles no Ceará, segundo cifras do governo deste estado.
Distante da recomendação da Organização Mundial de Saúde - que considera necessário 100 litros de água ao dia por pessoa - a água chega a conta-gotas nestas comunidades ligadas por estradas de terra como Nova Canaã, onde as torneiras já são decorativas.
Desde que a seca se intensificou, o governo começou a levar água gratuitamente para estes locais em caminhões-pipa, estimando um consumo de apenas 20 litros diários por pessoa.
Como esta água acaba rápido, os vizinhos se organizam para pagar eles próprios os caros caminhões-pipa, ir com seus burros até poços públicos onde as filas demoram horas ou cavar seus próprios poços em casa para conseguir uma água tão salobra que nem os animais querem beber.
Porém, em outras tantas vezes, também compram água mineral em galões.
Isso representa uma fortuna para famílias que, com o gado morto ou raquítico e seus pequenos cultivos de feijão e milho secos, sobrevivem da ajuda do governo.
A única renda vem do Bolsa Família - que temem ver reduzida pelos ajustes do governo de Michel Temer - e uma modesta ajuda para cultivos perdidos nos meses mais secos do ano. Uma família ganha, dessa forma, 420 reais. Um caminhão-pipa custa 150 reais.
"Um ano (de seca) a gente superava tranquilo, porque os açudes tinham muita água guardada, mas agora a cada dia estamos economizando mais", resume Clara Carneiro, uma pecuarista de 67 anos, que economiza durante o banho e reutiliza a água ao lavar a louça e limpar o chão para manter vivas suas duas vacas, que bebem cerca de 100 litros por dia.
Yahoo

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