OPERAÇÃO LAVA JATO: A conexão Uruguai da família Lula
Publicado por: Ivyna Souto
As
investigações sobre o patrimônio oculto do ex-presidente Lula
ultrapassaram as fronteiras do Brasil. Depois de identificarem ligações
do ex-presidente com imóveis suspeitos em solo nacional, como o tríplex
no Guarujá, o sítio em Atibaia e uma cobertura em São Bernardo do Campo,
procuradores do Ministério Público Federal (MPF), integrantes da
força-tarefa da Operação Lava Jato, apuram se uma mansão em Punta Del
Este, no Uruguai, pertence a Lula. A investigação foi iniciada em
agosto. O esquema seria semelhante ao adotado pelo petista para as
outras propriedades utilizadas por ele no Brasil. No modus operandi
tradicional, os imóveis ficam registrados em nome de empresários amigos.
Em troca de benesses e tráfico de influência no governo ou fora do
País, Lula se transforma no dono real desses imóveis, com poder para
deles usufruir quando bem entender, determinar quem entra e sai e até
mesmo promover caríssimas reformas, mesmo que oficialmente as
propriedades não figurem em seu nome. O que ISTOÉ revela agora é que
essa prática se repetiria no Uruguai. Neste caso, a mansão – segundo
colaboradores do Ministério Público Federal que estiveram em Punta Del
Este – pertenceria a uma offshore ligada ao empresário Alexandre
Grendene Bertelle, um dos donos da indústria de calçados Grendene e que,
no Uruguai, é proprietário de um sem-número de casarões – entre os
quais uma suntuosa casa na rua paralela à do imóvel suspeito de ter
ligações com Lula – e sócio de empreendimentos bem-sucedidos como o
Hotel e Cassino Conrad.
A casa que motiva a investigação da Lava Jato possui um terreno de
7,5 mil metros quadrados e fica localizada na Calle Timbó, conhecida por
Villa Regina, com valor estimado em US$ 2 milhões, segundo corretores
locais. A mansão adota o estilo de chalé suíço, com uma escadaria de
acesso à residência. O que mais chama a atenção é a grande área verde da
propriedade, que cerca toda a edificação. A reportagem de ISTOÉ esteve
no local na última quarta-feira 26. A mansão está vazia. Outras moradias
da região, reduto de endinheirados da América Latina que escolhem o
local para passar temporadas de veraneio, são ocupadas apenas por
caseiros.
As informações sobre a possível propriedade de Lula no país vizinho
foram transmitidas ao MPF por um conhecido colaborador. Ele fora
responsável pelas denúncias que levaram à deflagração da Operação Lava
Jato. Daí a sua confiabilidade. No mesmo dia em que entregou documentos à
Lava Jato, esse delator narrou que vários ônibus de excursão,
responsáveis por conduzir comitivas de brasileiros pela paradisíaca
Punta Del Este, passam defronte a casa de Calle Timbó e dizem, sem
pestanejar, que a propriedade pertence a Lula. Em duas dessas visitas
monitoradas, os turistas brasileiros demonstraram revolta ao receberem a
informação. Um deles chegou a fotografar a casa de dentro do ônibus. Na
última semana, o procurador destacado para investigar o caso disse à
ISTOÉ que se encontra na fase de coleta de provas. Ele não descarta a
possibilidade de pedir a colaboração do governo uruguaio. Na
Procuradoria da República, a investigação está sendo tratada com total
discrição. A avaliação é de que, se no Brasil já é difícil caracterizar a
ocultação de patrimônio quando ele figura em nome de terceiros, em
Punta del Este, no Uruguai, torna-se ainda mais complicado puxar o fio
desse intrincado novelo. Haja vista que lá os imóveis, em geral, ficam
escondidos em offshores, dificultando o rastreamento. Procurada por
ISTOÉ, a assessoria de Lula repetiu uma versão já conhecida. Disse que o
ex-presidente não tem nenhuma casa ou conta no exterior e que todas as
propriedades dele estão em São Bernardo do Campo e são devidamente
declaradas.
Se o triplex do Guarujá está em nome da OAS de Léo Pinheiro, o sítio
de Atibaia no de Fernando Bittar e Jonas Suassuna e a segunda cobertura
de São Bernardo no de um primo do pecuarista José Carlos Bumlai, o
mecenas de Lula na mansão de Punta Del Este seria o bilionário Alexandre
Grendene. O empresário do ramo calçadista mantém relações com Lula – e
com os políticos de um modo geral. Durante o governo do petista,
Grendene obteve empréstimos subsidiados do Banco de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) no valor de R$ 3 bilhões. Esses empréstimos
estão sendo investigados pelo Ministério Público Federal de Novo
Hamburgo (RS). Só para a compra da Vulcabrás, o BNDES emprestou R$ 314
milhões para a Grendene. Os irmãos Pedro e Alexandre Grendene
participaram também em 2008 de um negócio para implantação de usinas de
açúcar e álcool no valor de R$ 1,8 bilhão, com dinheiro do governo.
Integraram a negociação, além dos Grendene, a Odebrecht, o empresário
André Esteves (Banco Pactual) e o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo
íntimo de Lula.
Há outro significativo elo entre o empresário e Lula. Grendene foi um
dos empresários que doaram parte dos R$ 10,8 milhões que custearam o
filme “Lula, o filho do Brasil”, inspirado na trajetória do
ex-presidente petista e dirigido por Fábio Barreto. Ele também colaborou
com o “Fome Zero”, carro-chefe da política social do petista no início
do primeiro mandato – uma espécie de embrião do Bolsa-Família. Ainda no
primeiro governo petista, o guitarrista Lenny Kravitz doou sua guitarra
para o programa de combate à pobreza, que leiloou o instrumento em maio
de 2005. O empresário Pedro Grendene pagou R$ 322 mil pela guitarra, uma
cobiçada Epiphone Flyng V preta autografada, mas o episódio, como
tantos outros envolvendo o PT, terminou na Lava Jato. A força-tarefa
passou a investigar o destino da renda obtida com os instrumentos.
Análise de e-mails de Bumlai, amigo de Lula, mostrou que houve uma
disputa entre a ONG Ação Fome Zero e o Ministério de Desenvolvimento
Social e Combate à Fome pelo direito dos recursos levantados com os
leilões. Em resposta à ISTOÉ na quinta-feira 27, a assessoria de
Grendene disse que ele estava no exterior. Um assessor da diretoria da
empresa afirmou, no entanto, que a história de que Grandene seria uma
espécie de testa-de-ferro do ex-presidente petista no Uruguai não “passa
de um absurdo completo”.
O sítio e a cobertura
Nos últimos dias, a Lava Jato fez novas descobertas acerca do
patrimônio oculto de Lula. No caso do sítio de Atibaia, um dos maiores
amigos do ex-presidente na área empresarial, Alexandrino Alencar,
ex-executivo da Odebrecht, revelou detalhes da reforma do imóvel feita
pela empreiteira durante processo de delação premiada em Curitiba. O
executivo era um dos porta-vozes de Lula dentro da empresa. Era o amigo
das viagens feitas por Lula à América Latina e África à bordo de
jatinhos da Odebrecht.
Na negociação de sua delação com a Justiça do Paraná, Alexandrino
confirmou que a Odebrecht participou de um consórcio junto com a OAS e o
pecuarista José Carlos Bumlai, para reformar o sítio de Atibaia.
Segundo ele, a Odebrecht iniciou a reforma em outubro de 2010, quando
Lula ainda era presidente. A empreiteira ficou responsável pelas obras
de um anexo às quatro suítes do sítio. A propriedade está em nome de
Jonas Suassuna e Fernando Bittar, e Lula, mais uma vez, nega ser dono do
local. A Polícia Federal, no entanto, não tem dúvidas de que o sítio é
mesmo do ex-presidente.
Em outra frente, a força-tarefa da Lava Jato deu início esta semana a
uma investigação sobre uma segunda cobertura que Lula ocupa no edifício
Green Hill, em São Bernardo do Campo. O Ministério Público Federal
investiga se o imóvel, localizado ao lado da primeira cobertura de Lula,
foi adquirida com dinheiro da Odebrecht. Em dezembro de 2010, Glaucos
da Costamarques, primo do pecuarista José Carlos Bumlai recebeu R$ 800
mil da DAG Construtora, investigada pela PF por ter sido usada pela
Odebrecht para negócios ilícitos. Com o dinheiro, Glaucos comprou a
cobertura vizinha de Lula e a alugou para o ex-presidente. O petista
garante que pagou aluguéis e que os mesmos encontram-se declarados em
seu Imposto de Renda. Somente em 2015 pagou R$ 51,3 mil a Glaucos. Os
procuradores suspeitam que tudo tenha sido feito para ocultar o
verdadeiro dono do imóvel. Na realidade, o próprio Lula. A história se
repete.
Punta Del Este, no litoral Sul do Uruguai, onde está localizada a
mansão alvo de investigação da Lava Jato por possíveis ligações com
Lula, é considerada a Saint-Tropez da América do Sul. Praias
paradisíacas, cassinos de luxo, hotéis suntuosos. Uma cidadezinha de 10
mil habitantes, mas que no verão reúne os novos ricos do mundo todo e
muitos milionários brasileiros, provocando congestionamentos de
Mercedes-Benz e Ferraris nas ruas da cidade.
Os carros são conduzidos de São Paulo para lá – a distância é de
1.900 Kms – pelos motoristas, enquanto os patrões percorrem o trajeto de
avião. As mansões de veraneio de milhares de dólares ficam vazias o ano
todo, mantidas por caseiros que se recusam a falar com jornalistas, e
só são ocupadas na alta temporada.
Foi nesse cenário bucólico que Lula foi descansar logo que se elegeu
presidente pela primeira vez em 2002. Jornalistas locais relataram que o
petista descansou na casa de um amigo em Punta Del Este por alguns
dias. Gostou do que viu.
Fonte: Isto É
Fonte: Isto É
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