“Militares não vão dar golpe ou fazer intervenção”, diz general Augusto Heleno
O
ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general da
reserva Augusto Heleno, descartou a possibilidade de golpe, intervenção
militar ou da instalação de uma ditadura no Brasil.
“Os militares
não vão dar golpe. Isso não passa na cabeça dessa nossa geração, que
foi formada por aquela geração que viveu todos aqueles fatos, como estar
contra o governo, fazer uma contrarrevolução em 1964”, afirmou.
As
observações foram feitas durante live para o grupo Personalidades em
Foco por pouco mais de uma hora e 20 minutos nesta quarta (20).
Para
ele, “não passa [pela cabeça] ditadura, intervenções, isso são
provocações feitas por alguns indivíduos que não têm coragem de dizer
quais são suas ideologias, que ficam provocando os militares para ver se
nós vamos reagir”.
O general, conselheiro de campanha de Jair
Bolsonaro e um dos três com assento no Palácio do Planalto, disse que
deve isso aos “nossos instrutores, vacinados por toda aquela trajetória
de militares se intrometendo de uma forma pouco aconselhável, mas muitas
vezes necessária, na política”.
No último mês, o ministro da
Defesa teve de editar duas notas reafirmando o compromisso das Forças
Armadas com a Constituição após o presidente participar de atos
golpistas que pediam intervenção militar contra Congresso e Supremo
Tribunal Federal.
Na semana passada, artigo do vice-presidente,
general Hamilton Mourão, gerou rumores sobre eventuais intenções
intervencionistas dos fardados.
Havia pouco mais de 200 pessoas na
audiência com Heleno, a maioria composta por pessoas ligadas à Marinha,
inclusive o comandante Ilques Barbosa Júnior. O grupo foi criado no mês
passado por integrantes e ex-membros da Força para buscar combater a
polarização no país.
Havia também políticos, como a ex-senadora
Ana Amélia (Progressistas-RS) e o deputado Luiz Phillipe de Orleáns e
Bragança (PSL-SP).
Ele
não foi questionado sobre polêmicas, como o xingamento que proferiu
sobre o Congresso, que inspirou atos golpistas, ou sobre a reunião
ministerial que está no centro do inquérito sobre eventual interferência
de Bolsonaro na Polícia Federal.
Heleno foi o primeiro
oficial-general do Exército a falar ao grupo, que já ouvira figuras
contrárias a Bolsonaro como Geraldo Alckmin (PSDB) e Luciano Huck, e
membros do governo, além de jornalistas.
Ele falou como um
representante de sua classe, sem diferenciar no discurso serviço ativo e
a ala militar do governo –que ele rejeita como definição. “Eu fico
revoltado quando ouço essas duas palavrinhas”, disse.
Ele defendeu
a presença de egressos das Forças na administração. “Nós não somos
todos brilhantes, temos alguns brilhantes, mas temos uma dívida com o
país”.
Heleno criticou duramente a mídia. “Na hora de apresentar
os fatos, a gente percebe. É uma total contaminação dessa parte da
imprensa. Só pode ser para derrubar o presidente da República. Não tem
outra explicação”, disse.
Ele não nomeou veículos de comunicação —
nem precisaria, já que Bolsonaro critica constantemente a Folha de S.
Paulo, órgãos do Grupo Globo e o Estado de S. Paulo, entre outros.
Heleno
criticou a cobertura dos 500 dias do governo, que, segundo o general,
não citou supostos feitos de Bolsonaro. “[A mídia] só procura as coisas
para falar mal do governo. Isso é lamentável, porque é contra a nossa
visão de democracia e liberdade de imprensa.”
“Não tem nenhum reconhecimento, é duro. Mas vamos lá, eles não vão conseguir baixar o moral da gente.”
Um
entrevistador, o consultor Gustavo Heck lembrou que o presidente
Getúlio Vargas estimulava o jornal Última Hora para se defender e
perguntou se o governo não faria o mesmo. “Temos um instrumento que são
as redes sociais”, disse Heleno, queixando-se especificamente da TV.
“A
gente mexe pra lá, mexe pra cá, zapeia, e acaba vendo Animal Planet.
Chega a um ponto em que não dá, melhor ver suricato e leão atacando
veadinho da floresta”, disse.
Aí o general deu sua receita ante as
críticas. Para ele, as universidades “foram vítimas de verdadeira
lavagem cerebral”, com “formação dirigida para esse fanatismo
ideológico” associado à esquerda.
Esse é um ponto de contato
antigo entre o que pensam os fardados brasileiros e a ala ideológica do
bolsonarismo, representada entre outros no governo pelo ministro da
Educação, Abraham Weintraub.
“A única solução é colocar a educação
como grande instrumento de formação do cidadão, para ele ser um grande
profissional, e não um militante político. Será criminoso fazer isso de
um lado ou de outro. [Ele deve] construir sua família, prezando a
democracia, prezando a família, a pátria”, afirmou.
“Não será fácil recuperar o terreno perdido. A educação precisa ser profundamente reformulada nesse país”, completou.
O
general, que foi comandante militar da Amazônia e perdeu o cargo por
criticar a política indigenista do governo Lula, apontou descaso
político com a região, emulando discurso histórico dos militares.
“A
Amazônia é 7% do eleitorado. Investir lá não traz resultado eleitoral. É
triste. Pensar que não é uma região cobiçada é ingenuidade”, afirmou.
Sobre
a crise provocada pelas críticas internacionais ao manejo dos incêndios
florestais do ano passado, ensaiou um mea-culpa: “Fomos muito
maltratados no ano passado, pagamos caro, demos margem para esse tipo de
visão”.
Na sequência, deixou claro que o erro teria sido
corrigido quando Mourão assumiu o comitê para a região, no começo deste
ano. “A Covid-19 veio na pior hora. A Amazônia é alvo da cobiça
internacional. Essa história que vários líderes mundiais expressaram
interesses escusos sobre a Amazônia, isso vai continuar acontecendo.”
Reclamou
da presença de “80 mil ONGs que recebem de estrangeiros”, de políticos,
da falta de investimento federal no programa Sisfron, de monitoramento
de fronteiras do Exército.
Não havia uma dinâmica para questionar
Heleno por que o governo Bolsonaro não alocou verbas no sistema. A
queixa sobre o Sisfron é corrente no Alto-Comando do Exército.
Afirmou
que os “romanticamente chamados de povos da floresta” são “facilmente
cooptáveis pelo tráfico” e clamou pela presença do Estado.
Segundo
Heleno, só as Forças Armadas lá estão. “É uma peneira. Sem nenhuma
crítica à PF, à Receita e ao Ibama, mas eles não são tão presentes”,
disse, lamentando a falta de recursos humanos.
O general contou
que certa vez, em Roraima, encontrou um grupo indígena que falava
inglês, vindo da Guiana. “Muita gente acha que essas comunidades vão
defender o Brasil, eles nem sabiam que estavam no Brasil”, afirmou.
Sobre
a Covid-19, Heleno só falou ao ser questionado pelo velejador Lars
Grael sobre o papel do esporte no pós-pandemia. “Isolamento vertical
[defendido por Bolsonaro] é perfeitamente viável e deve ser totalmente
adotado por nossas famílias. Com o isolamento horizontal, se não tem
saneamento básico?”, questionou.
Ex-comandante do Centro de
Capacitação Física do Exército e tendo testado positivo para a Covid-19
em um exame e negativo, em outro, Heleno ecoou o “histórico de atleta”
que Bolsonaro usou para minimizar os riscos do novo coronavírus.
“Cultue
o esporte como algo que vai afastá-lo do médico. Não quero dizer que o
médico não é importante, o médico é fundamental. Mas devemos zelar para
ficar longe dos médicos, longe dos hospitais, longe de exames que não
sejam exames para nos qualificar como atletas.”
Ao fim, o
organizador do grupo, o palestrante Paulo Zottolo, elogiou o governo,
mas criticou sua comunicação. Sobre isso, Heleno disse que não iria
concordar ou discordar. “Estamos juntos”, finalizou.
Fonte: Folha de S. Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário