Brasil repete pior nota em ranking do Índice de Percepção da Corrupção (IPC) e ocupa 106ª posição
A
eleição de Jair Bolsonaro (sem partido), impulsionada por promessas
de combate à corrupção, não alterou a percepção sobre este problema no
seu primeiro ano de governo, marcado por denúncias contra integrantes do
governo e familiares do presidente.
Em
2019, o Brasil caiu uma posição no ranking do IPC (Índice de Percepção
da Corrupção), e ocupa a 106ª posição entre os 180 países avaliados
—atrás de outros latino-americanos como Argentina (66ª), Chile (26ª),
Colômbia (96ª), Cuba (60ª), Equador (93ª) e Uruguai (21ª).
Elaborado
pela ONG Transparência Internacional, o ranking atribui notas de 0 a
100 a países com base em pesquisas e relatórios sobre como o setor
público é percebido por especialistas e executivos de empresas no que
diz respeito à prática de corrupção.
O Brasil repetiu a mesma nota 35 recebida em 2018, a pior do país desde 2012.
Isso
indica que o novo governo, apesar do discurso, não adotou medidas que
impactassem na percepção de que práticas corruptas, tais como abuso de
poder, subornos e acordos secretos, tenham diminuído no país.
“O
resultado reflete um ano de poucos avanços e muitos retrocessos na luta
contra a corrupção no Brasil”, avalia Bruno Brandão, diretor-executivo
da Transparência Internacional no Brasil.
Para ele, trata-se de
prova de que “discurso não é o suficiente”. “São necessárias medidas
efetivas e coerência nas atitudes em todos os âmbitos”, diz.
Entre
os poucos avanços citados, ele destaca o decreto do governo federal que
exige ficha limpa para aqueles nomeados a cargos de confiança e um
fortalecimento da Polícia Federal, que recebeu 1.200 novos agentes e
deflagrou operações importantes.
Brandão cita aquela que prendeu
advogados e afastou desembargadores e o presidente do Tribunal da
Justiça da Bahia por suposto esquema de venda de decisões judiciais.
Além disso, ele cita como muito positiva a criação de 29 delegacias estaduais de combate à corrupção.
No
Legislativo, a aprovação de medidas do pacote anticrime, tais como o
confisco alargado e mudanças no sistema de prescrição, foram apontadas
como relevantes, além da derrubada do decreto presidencial que
facilitava a classificação de informações públicas como sigilosas.
Já a lista de retrocessos constantes no relatório da Transparência Internacional é bem mais alentada.
O
texto aponta para investigações de corrupção envolvendo membros do
núcleo duro do governo, como o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro
Antônio, denunciado por esquema de candidaturas laranjas do PSL, e o
líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho, envolvido em
investigações sobre suborno.
Filho do presidente, o senador Flávio
Bolsonaro também é investigado sob suspeita dos crimes de peculato,
lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.
“O grau de tolerância do presidente com esses casos é contraditório com o discurso de campanha do presidente”, avalia Brandão.
Ele
também aponta como problemáticas decisões do Executivo que sugerem
interferência política em órgãos-chave do combate à corrupção:
afastamento do presidente do Coaf, substituições na PF do Rio e na
Receita Federal, além da nomeação de um procurador-geral alinhado ao
presidente.
Para a cientista política Nara Pavão, professora da
Universidade Federal de Pernambuco, “a corrupção pode ser combatida
pelas instituições ou pelas urnas, e a continuidade dessas práticas no
atual governo manda a mensagem de que corrupção faz parte da política, o
que pode gerar cinismo e desencanto”.
Ataques à mídia e à
sociedade civil organizada também são avaliados como retrocessos que
pioram a percepção sobre a corrupção, segundo a ONG. “Uma imprensa livre
e uma sociedade civil ativa são dois pilares fundamentais do combate à
corrupção”, diz Brandão.
Para Nara Pavão — que critica o IPC por
ser baseado “na percepção apenas de algumas poucas elites
— “a corrupção é
algo inerentemente secreto, e só ficamos sabendo dela quando a mídia a
reportar”.
Ela explica que, quando uma denúncia de corrupção é
trazida por uma fonte com credibilidade, o peso eleitoral negativo
aumenta. “Se a mídia perde credibilidade, perdemos essa única fonte de
denúncias de corrupção que sejam politicamente custosas.”
Entre retrocessos promovidos pelo Legislativo, segundo a ONG, estão a minirreforma eleitoral,
que vai na contramão do combate à corrupção ao aumentar a
disponibilidade de recursos públicos para partidos enquanto reduz o
controle e a transparência desses gastos.
No Judiciário, o caso
mais grave seria o da decisão do presidente do STF (Supremo Tribunal
Federal), Dias Toffoli, depois revertida pelo plenário, que suspendeu investigações criminais que
usassem, sem autorização judicial, dados sigilosos do Coaf e da Receita
Federal. A decisão motivou uma visita inédita do grupo anticorrupção da
OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) ao país.
Fonte: Folha de S. Paulo - Publicado por: Larissa Freitas
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