Morre neste domingo aos 81 anos, Alberto Goldman, ex-governador de São Paulo
Um dos nomes mais fortes dentro no PSDB, o político estava internado desde o mês passado para tratamento de um câncer
Morreu neste domingo (1º), o ex-governador de São Paulo e deputado federal Alberto Goldman. Ele estava internado desde o dia 19 no hospital Sírio Libanês, em São Paulo. O líder tucano tivera
uma hemorragia durante uma operação no crânio. Ex-comunista, Goldman
aderiu á social-democracia e se tornou um de seus maiores nomes no país.
Nascido em 12 de outubro de 1937, em São Paulo, filho de
Dora, uma dona de casa, e de um alfaiate polonês, Wolf Goldman. Seu avô
paterno tinha uma pequena loja de tecidos em uma cidade da região de
Lublin, no interior da Polônia – recentemente, ele viajara ao país e
tentara encontrar os antigos jazigos da famílias, mas o cemitério havia
sido destruído e nada sobrara da memória dos Goldman no lugar. Nem uma
lápide. “Impressionante. Os nazistas levaram os vivos e os mortos
também.”
Nascido em 12 de outubro de 1937, Goldman era engenheiro formado pela
Escola Politécnica, foi deputado estadual por dois mandatos
(1971-1978), deputado federal por seis mandatos (1979-1986 e 1991-2006),
Ministro dos Transportes (Governo Itamar Franco), secretário de Estado,
vice-governador e governador de São Paulo.
Alberto Goldman deixa esposa, cinco filhos e quatro netos.
No Brasil, seu pai começou a trabalhar como alfaiate e, depois, com o
irmão montou uma confecção de roupas masculina. Moravam no Bom Retiro,
no centro de São Paulo, bairro que então concentrava a população judaica
de São Paulo. Alberto Goldman cursou a Escola Politécnica (Poli) da
Universidade de São Paulo, onde se formou engenheiro civil. Ali começou a
militância política. “No primeiro ano da Poli me filiei ao partido. A
base era grande.” Era 1955.
O partido era o Partido Comunista Brasileiro, o PCB. “Minha mãe havia
sido militante do partido comunista na Polônia. E meu pai não era
propriamente militante, mas era próximo.” O menino conviveu com
discussões em casa, durante a guerra, sobre os acontecimentos no mundo.
“Fui me aproximando dessa posição.”
Participou do movimento estudantil. Quando deixou a faculdade não se
vinculou a nenhuma outra base do partido, mas permaneceu ligado ao grupo
da comunidade judaica do Bom Retiro ao lado de militantes como Max
Altman e Jacob Wolfenson. “Era um pessoal muito bem formado.” Trabalhava
então em uma empresa de engenharia que ele abriu depois de sair da
faculdade.
Ligou-se aos Comitês Municipal e estadual do partido, uma militância
clandestina. “Participava das reuniões e discussões.” Tinha já três
filhos quando, em 1969, após o Ato Institucional-5 (AI-5) , foi
procurado em seu escritório de engenharia pelo dirigentes do partido
Moacir Longo e Hércules Correa dos Reis, ambos cassados pelo regime. “Em
nome do comitê estadual, eles me comunicaram que o partido queria que
eu fosse candidato a deputado estadual.” Os militares haviam acabado de
cassar em 1968 o deputado estadual Fernando Perrone (MDB), que era o
homem do partido na Assembleia Legislativa.
“Resisti durante meses. Não queria entrar nisso. Era um loucura pois
era a pior época para isso (entrar na política).” Quando decidiu ser
candidato, teve de enfrentar a oposição do pai. “Meu pai fazia campanha
contra mim, achando que eu havia enlouquecido. E acho que ele tinha
razão”, lembrava décadas depois. Era o começo de uma carreira que não
teria mais fim. “Tento, tento e não consigo deixar a política”, dizia o
ex-governador.
Goldman só aceitou se candidatar porque acreditava que não seria
eleito. “Mais do que isso. Eu não acreditava que seria registrado no
tribunal eleitoral.” Quando o desembargador Adriano Marrey recebeu o
processo para decidir pelo registro da candidatura, disse: “Tem aqui uma
série de informações do Dops, mas para mim informações do Dops não
valem nada.”
Depois do registro da candidatura, o engenheiro teve de enfrentar a
campanha. Goldman lembrava que então a repressão contra o partido não
era forte. Mesmo assim, durante a campanha, teve os passos vigiados pela
polícia política. “Onde eu ia eles me acompanhavam.” Fazia comícios na
porta de fábricas, com um caixote e um megafone para discursar contra o
governo. Usava um Fusca para se deslocar. Elegeu-se em 1970 pelo MDB com
o apoio do partido. Recebeu 17.226 votos.
“Fui eleito pelo trabalho do partido. O partido tinha bases em vários
lugares, como entre os ferroviários, na Lapa, na zona norte e na Vila
Formosa. E no estado, na área da Sorocabana e em Santos. E nas
associações de amigos de bairro e em sindicatos, como o dos metalúrgicos
e da construção civil.” Foi o oitavo mais votado em sua legenda, o MDB.
Depois de eleito, passou a manter encontros com integrantes do Comitê
Central em casa e em restaurantes. Os contatos eram esparsos. “Comecei a
fazer os discursos que tinha de fazer e meus colegas achavam que eu ia
ser cassado.” Com o tempo a repressão se abateu sobre a estrutura do
partido, que buscava uma política de frente democrática contra a
ditadura militar.
Após as primeiras prisões em 1972, Goldman pensou que seria logo
preso. Aproveitou um convite do Departamento de Estado americano para
acompanhar as eleições presidenciais entre o republicano Richard Nixon e
o democrata George McGovern para ficar 20 dias fora do país. “Quando
voltei estava mais calmo.” Era o início da ação da repressão contra o
partido. “Por algum fator que não sei explicar, nunca fui cassado”.
Atravessou a década de 1970 com certeza que continua sob vigilância.
Foi avisado por Ivahir Rodrigues Garcia, delegado de polícia e deputado
estadual, que tinha os passos controlados. “Sou teu colega aqui. Você
tem duas funcionárias aqui, uma delas é agente do Dops.”, disse o
delegado. Goldman nunca manteve nada arquivado, Mantinha nomes e
endereços na memória. “Sabia que era vigiado e que a qualquer momento
podia ser apanhado.”
Em 1974, é reeleito deputado estadual com 75 mil votos. Tornara-se o
segundo mais votado do estado em meio avalanche de votos dada ao MDB.
“Fazia palestras em universidades. Passei a ser uma referência de
oposição ao regime. Sempre procurei fazer meus discurso, muito duros,
mas nunca ultrapassando uma linha e evitando as agressões pessoais.”
Tornou-se líder da bancada do MDB, que tinha então dois terços da
Assembleia Legislativa paulista. “Eu podia aprovar o que quisesse e
derrubar o que quisesse.” Conviveu com o governador Paulo Egídio Martins
(Arena), que lhe mandava os projetos antes, iniciando uma relação que
se transformaria em amizade pessoal.
Em 1975, após a prisão e morte do jornalista Vladimir Herzog nas
dependências do Destacamento de Operações de Informações (DOI), do 2.º
Exército, o governador Paulo Egídio chamou a bancada do MDB ao palácio
dos Bandeirantes para um encontro com o presidente Ernesto Geisel. Disse
então para o Geisel: “Presidente, estão matando gente em São Paulo.”
Geisel ouviu o relato de Goldman, com a bancada do MDB em torno dos
dois. “Eu sei”, disse.
Meses depois, após mais uma morte no DOI – a do operário Manoel Fiel
Filho – o presidente removeria do comando do 2.º Exército o general
Ednardo D’Ávila Mello. Para acalmar a linha dura, cassaria dois
deputados comunistas – Nelson Fabiano e Marcelo Gatto. “Na hora que
sabia de uma informação de uma prisão, ia para os jornais denunciar. Era
a forma de anunciara que a pessoa havia sido presa para preservar a
vida dele.” Foi assim com o dirigente comunista Marco Antônio Tavares
Coelho, preso no Rio e trazido para São Paulo. “Isso preservava a vida
das pessoas.”
Em 1977, propôs a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a
invasão da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo invadida
pela polícia de São Paulo para impedir um congresso estudantil. Presidiu
a comissão que interrogou o então secretário da Segurança, o coronel
Erasmo Dias. Ia então para Buenos Aires para encontrar com integrantes
da direção do partido no exílio. Em 1978, elegeu-se deputado federal.
Elegeu-se com 102 mil votos e seria reeleito em 1982 pelo MDB.
Em 1986, após a legalização do PCB em 1985, torna-se líder do partido
na Câmara dos Deputados e integrante do Comitê Central do partido.
Candidata-se pelo partido e, pela primeira e última vez não é reeleito.
“Meu voto era muito PMDB. E na lei de então prevalecia o nome do
partido.”
Se torna secretário de coordenação de programas do governo de Orestes
Quércia (PMDB) em 1987 e, em seguida, deixa o PCB e retorna ao PMDB.
Depois seria secretário de administração. Em 1990, apoia a candidatura
de Luiz Antonio Fleury Filho ao governo do estado. “Foi uma invenção
nossa. Uma infeliz invenção.” No quercismo, o ex-governador permaneceria
até 1996. Ingressou então com outros emedebistas no PSDB.
Em 1990, voltou a se candidatar e a ser eleito deputado federal. No
governo Itamar Franco (1992-1995), tornou-se ministro dos Transportes.
Como tucano, elegeu-se deputado ainda em 1998 e 2002. Em 2006, elegeu-se
vice-governador na chapa de José Serra (PSDB), assumindo o governo do
Estado em 2010 após a renúncia do colega, que se candidatou à
presidência.
“Quando saí do governo em 2011, decidi pagar minhas dívidas com os
filhos e netos. Nesses 40 anos de política não os vi crescerem. Um dos
meus filhos é traumatizado com a política. Não deixava meus netos
falarem em política.” O menino assistia à televisão nos anos 1970 e
ouviu o nome do pai. Era um militar que o acusava Goldman de subversão.
“Meu filho me perguntou: ‘Pai, você é comunista?’ Hoje ele tem 50 anos.
Ficou traumatizado.”
Levava os netos ao cinema. Tornou-se vice-presidente do PSDB e um dos
principais adversários do atual governador João Doria, que lutou pela
sua expulsão do partido. Bem-humorado, gostava de fustigar o adversário.
Na segunda-feira, dia 19 de agosto, foi internado no Hospital Sírio
Libanês, em São Paulo. Passou por uma cirurgia no cérebro e teve um
sangramento. “Minha vida política foi mais do que fazer proselitismo.
Foi minha forma de contribuir com o País.”
Exame - Por Estadão Conteúdo
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