Governo recua e Supremo Tribunal Federal dará palavra final sobre indulto natalino

O
governo Michel Temer desistiu nesta sexta-feira (29) de publicar um
novo decreto de indulto natalino depois de a presidente do STF (Supremo
Tribunal Federal), ministra Cármen Lúcia, derrubar trechos do texto.
Com
isso, vale a publicação de 21 de dezembro com as regras do perdão de
penas, excluindo três artigos e dois incisos vetados por Cármen. A
avaliação era de que esses trechos poderiam colocar em risco a Lava Jato
por estender o benefício a condenados por crimes como corrupção e
lavagem de dinheiro.
O ministro da Justiça, Torquato Jardim,
afirmou ontem que o governo obedecerá ao Supremo e aguardará o
julgamento final da Corte. A decisão de Cármen Lúcia foi por meio de
liminar (caráter provisório).
Só a partir de fevereiro, após o fim
do recesso, o relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, poderá
levá-lo a plenário. Torquato divulgou nota depois de se encontrar com
Temer no Palácio do Jaburu, em Brasília.
— A decisão impede, neste
momento, que milhares de condenados por crimes sem grave ameaça ou
violência à pessoa possam beneficiar-se do indulto, contrariando a nossa
tradição. O governo federal jamais praticou ato qualquer de restrição
ou inibição à Operação Lava Jato.
Ele se referia a um dos itens
barrados que previa o indulto a condenados por crime sem violência que
já tivessem cumprido um quinto da pena, se não reincidentes, e um terço,
se reincidentes. Em 2016, o indulto exigia o mínimo de um quarto.
O
projeto original de indulto feito pelo CNPCP (Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária) a que o Estado teve acesso e entregue
pelo conselho ao ministro da Justiça previa a exclusão de indulto dos
acusados de crimes contra a administração pública (corrupção, por
exemplo) e de lavagem de dinheiro e organização criminosa. A restrição
foi retirada do texto do decreto. Também previa a necessidade de uma
quarto do cumprimento de pena para se ter o benefício.
Polêmica.
Apesar dessas mudanças, o professor de Direito Penal da USP
(Universidade de São Paulo) Sérgio Salomão Shecaira, diz que as reações
contra o decreto do governo não se sustentam. O documento até podia ter
excluído do indulto os corruptos por “oportunidade e conveniência”, pois
essa é uma tradição que “remonta a 1821”.
— Mas o presidente não está botando ninguém na rua.
Shecaira
explica que o indulto tem caráter genérico, não é dirigido a presos em
particular, ao contrário da graça, que é individual. Ele também não é
imediato após o decreto.
— A concessão é feita pelo Judiciário, ouvido o Ministério Público.
Os magistrados podem, em cada caso, verificar se há desvio de finalidade, como alegado por Cármen Lúcia para negar o indulto.
Shecaira
critica a decisão da ministra por considerar que ela suprime a
possibilidade de os juízes se manifestarem nos casos concretos e por
impedir, em razão de uns poucos presos por corrupção um direito que
podia ser dado a milhares de detentos por outros crimes.
— Indulto não é só questão humanitária, mas também questão de política criminal.
Carmen
suspendeu ainda o indulto para os casos de multas e para as penas
restritivas de direitos (como o uso de tornozeleira eletrônica). Neste
caso, professor afirma que tanto a multa quanto as penas restritivas de
direito podiam ser indultadas.
— As multas já haviam sido alvo de indulto em 2009.
Shecaira, que presidiu o CNPCP, diz que o perdão da multa é para acusados de delitos menores e não para a grande corrupção.
—
É medida humanitária em 99% dos casos, mas deve ser negada a quem tem
recursos para pagar. Mais uma vez, é o juiz que vai analisar o caso
concreto.
Limite. Na visão da desembargadora do Tribunal de
Justiça de São Paulo Ivana David, o indulto decretado extrapola limites
da Constituição. Ela cita, por exemplo, o benefício quando a pena não é
definitiva e há recurso pendente do Ministério Público para aumentá-la.
— O limite do presidente é o limite constitucional. A comutação de pena exige trânsito julgado da sentença.
Já
o criminalista Gustavo Badaró não vê inconstitucionalidade no decreto
do governo, embora considere exagerado o fato de ele não limitar o
indulto pelo tamanho da pena do preso — até 2016 o indulto só podia ser
concedido para presos que recebiam até 12 anos de prisão. Segundo ele,
isso foge da tradição do direito no País.
— A Constituição dá ao presidente o direito genérico de indultar.
Estadão
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