Lula perde ação de indenização para o ex-senador Delcídio Amaral na Justiça
Ex presidente pedia indenização de R$ 1,5 milhão por dano moral ao ex-senador

© Reuters
Lula perdeu o embate para Delcídio Amaral (ex-PT/MS). Em
decisão de 15 páginas, o juiz Maurício Tini Garcia, da 2.ª Vara Cível de
São Bernardo do Campo (Grande São Paulo), julgou improcedente ação do
ex-presidente contra o ex-senador que, em delação premiada na Operação
Lava Jato, o acusou de obstrução de Justiça por supostamente tramar pelo
silêncio do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró, em 2015 - na
ocasião, Cerveró estava em vias de fazer delação premiada. Lula queria
indenização de R$ 1,5 milhão por dano moral.
O magistrado condenou Lula a arcar com "as custas e despesas
processuais, além de honorários advocatícios de 15% sobre o valor
atualizado da causa", ou R$ 225 mil. O ex-presidente pode recorrer.
Na ação, Lula alegou que tem 40 anos de vida pública e já exerceu o
cargo de Presidente da República. "Foi afetado em sua dignidade e
integridade moral em virtude das falsas imputações deduzidas pelo réu
(Delcídio)."
O ex-presidente argumentou que na delação premiada, Delcídio atribuiu
a Lula plano para "segurar" a delação premiada de Cerveró. "Tal
solicitação do autor (Lula) jamais ocorreu, tanto que Nestor Cerveró e
outras testemunhas ouvidas em 8 de novembro de 2016, na audiência
realizada na 10.ª Vara Federal de Brasília confirmaram jamais ter
recebido qualquer assédio direto ou indireto do autor (Lula)."
Os advogados de Lula acrescentaram que "as afirmações impugnadas
foram prestadas durante o período em que o réu (Delcídio) esteve preso
em um quarto-cela sem luz, que enchia de fumaça do gerador instalado no
ambiente ao lado". "Em determinada ocasião o gerador funcionou e sua
fumaça invadiu o recinto onde estava o réu, causando situação de intensa
aflição. Tal situação compromete a validade da delação premiada
realizada pelo réu, dado que afeta o requisito legal da voluntariedade
(Lei 12.850/13, art. 4º, caput)."
O ex-senador, que chegou a ser preso em novembro de 2015, fechou o
acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal, homologado
pelo Supremo Tribunal Federal, "do que emerge a validade e a relevância
das informações que nela foram prestadas, bem assim a licitude das
provas colhidas a partir do mencionado instituto processual penal".
Delcídio atribuiu a Lula envolvimento na trama para comprar o
silêncio de Cerveró que, afinal, acabou fazendo delação premiada e saiu
da cadeia da Lava Jato.
"A pretensão indenizatória deduzida na demanda é fundada na suposta
falsidade das informações prestadas pelo réu no curso de procedimento de
delação premiada, em que foi imputada uma tentativa de obstrução da
Justiça, na forma de tentativa de
convencimento de prepostos de terceira pessoa a evitar envolver o
autor e seus correligionários em prática de atos ilegais na gestão de
empresa estatal", assinala o juiz Maurício Tini Garcia.
O magistrado assinalou. "Não se discute que, no mesmo patamar de
importância, estabelece a Carta Magna à inviolabilidade da intimidade,
da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurado o direito
de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação
(artigo 5.º Inciso X, da Constituição). O direito à honra é
contrabalançado pela responsabilidade nas esferas cível e criminal
daquele que supostamente afronte o ordenamento jurídico pátrio."
Maurício Tini Garcia observa que é previsto no artigo 6.º, I, da Lei
12.850/13, "o caráter personalíssimo do acordo de delação premiada, a
impedir sua impugnação por coautores ou partícipes do colaborador na
organização criminosa e nas infrações penais investigadas, ainda que
sejam expressamente mencionados no relato de colaboração".
"O acordo de delação premiada firmado pelo réu foi integralmente
homologado, sem qualquer glosa, e, por isso, obteve eficácia que
possibilitou a aplicação da sanção premial nele prevista. Nada nos autos
sinaliza para imprecisão na identificação de coautores e partícipes de
suposta organização criminosa ou dúvida na revelação de estrutura
hierárquica e de divisão de tarefas, entre outros requisitos legais do
instituto, tanto que sequer a petição inicial menciona a revogação da
delação premiada firmado pelo réu", pondera o magistrado.
"A validade e a eficácia da delação premiada firmada pelo réu, e
homologada pelo Supremo Tribunal Federal, infirma de forma inequívoca a
alegação de ilicitude da conduta que sustenta a pretensão indenizatória
deduzida na demanda e, por
conseguinte, inviabiliza o acolhimento da responsabilização civil do
réu pelos danos morais descritos na petição inicial", anotou o juiz de
São Bernardo do Campo.
"Isto porque os pressupostos da obrigação de indenizar são: ação ou
omissão do agente, a culpa, nexo causal e o dano", segue Maurício. "Na
hipótese dos autos, a teor dos fundamentos já expostos, não sobressai
dos fatos afirmados pelo autor (Lula) a culpa ou o dolo do réu
(Delcídio) tampouco nexo de causalidade entre os danos e uma ação
ilícita do último. Em outras palavras, conclui-se que o réu, exercendo
regularmente seu direito, formulou acordo de delação premiada que foi
homologado pelo Supremo Tribunal Federal e cuja eficácia é mantida nos
dias atuais."
Maurício assinala que "não cabe ao juízo cível apreciar a relevância e
a idoneidade das informações que ensejaram a homologação do acordo de
delação premiada no Supremo Tribunal Federal, mormente porque esta
demanda não é fundamentada na absolvição sumária do autor pelos fatos
imputados pelo réu".
"A propósito, ainda que o depoimento do réu estivesse protegido pelo
segredo de Justiça, não medraria a pretensão do autor, já que o artigo
5.º, LX, da Constituição Federal, dispõe que somente a lei poderá
restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da
intimidade ou o interesse social o exigirem", observa o magistrado.
"O mencionado dispositivo constitucional tem por premissa o princípio
republicano de que as coisas do Estado têm que ser divulgadas ao
público, tanto que sequer utilizou o vocábulo sigilo ou segredo,
preferindo utilizar restrição como exceção à regra geral da
publicidade", alerta o juiz. "Não se questiona que o excesso deve ser
punido protegendo-se a imagem de quem nela é citado. Sem prejuízo, em
hipótese semelhante envolvendo pessoas públicas que litigam acerca de
danos morais fundados em supostas ofensas divulgadas ao público, emerge
imperioso colacionar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em
acórdão da ministra Nancy Andrighi."
"Significa dizer que aqueles que optam pela vida política, muito mais
que o cidadão comum, sujeitos estão ao escrutínio popular sobre seus
atos, além de submetidos a imputações acerca da probidade e honestidade
de suas ações", destaca o juiz. "Bem por isso, não emerge adequado que,
por meio de fixação de indenizações protetivas da moral, o Poder
Judiciário interfira para desestimular a publicidade de atos de
interesse público, mormente quando o ordenamento jurídico vigente
disponibiliza ao imputado amplo direito de defesa na esfera criminal e
administrativa, com várias instâncias recursais, onde a idoneidade de
suas ações políticas, a legitimidade do patrimônio amealhado durante sua
vida pública e os sinais externos de sua riqueza e de seus parentes
próximos sempre poderão ser objeto de justificativa ou questionamento."
"Vale ressaltar que os demais argumentos afirmados pelas partes são
desprovidos de força para infirmar a conclusão adotada neste julgado e,
por isso, não merecem acolhimento. Nesse contexto, não comprovada
ilicitude da conduta do réu e diante da ausência dos danos afirmados na
demanda, é medida que se impõe a improcedência do pedido de declaração
de violação ao artigo 5.º, incisos V e X, artigos 12, 17 e 21, todos do
Código Civil, bem como da pretensão de ressarcimento de danos morais.
Posto isso, e pelo mais que dos autos consta, julgo improcedente o
pedido inicial."
"Condeno o autor nas custas e despesas processuais, além de
honorários advocatícios de 15% sobre o valor atualizado da causa."
(Julia Affonso, Ricardo Brandt e Fausto Macedo)
Notícias ao Minuto
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