Salário mínimo fica abaixo do valor necessário para sobreviver, segundo Dieese
Criado em 1938 para assegurar bens e serviços essenciais a uma família, mínimo deveria ser de R$ 3,9 mil, segundo o Dieese. Alta do custo de vida agrava aperto no orçamento
Discrepância tem crescido com o aumento do custo de vida (Foto: Divulgação) |
Para suprir as necessidades básicas, o salário mínimo
deveria ser de R$ 3.940,24. Esse é o valor apontado pelo Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) como o
mínimo necessário para trabalhadores garantirem comida, casa,
transporte, saúde e educação de uma família de quatro pessoas. Na ponta
do lápis, o montante equivale a quatro vezes o mínimo de R$ 880.
Por esses parâmetros, Alcino Nunes Fernandes, de 51 anos, está muito
longe de ter o necessário para viver. Para ganhar cerca de R$ 880, ele
trabalha como ambulante 12 horas por dia numa esquina da Rua Úrsula
Paulino, no Bairro Betânia, na Região Oeste, vendendo capa de volante,
raquete para matar mosquito e outras miudezas. Até ser demitido, ele
capinava ruas e avenidas da cidade. Alcino precisou recorrer à
informalidade para sustentar a família de cinco pessoas. A renda é
complementada pelo salário da mulher e da mãe. “Tem que fazer muita
conta. Não sobra nada. Não tenho dinheiro nem para comprar roupa. Eu
ganhei esta blusa, a calça e o sapato de doação”, conta.
Segundo o Decreto-Lei 399, de 1938, no governo de Getúlio Vargas, o
salário mínimo deveria ser o suficiente para prover alimentação,
moradia, saúde, educação, vestuário, higiene e transporte ao
trabalhador. No cálculo do mínimo necessário, o Dieese segue essa
premissa à risca e leva em conta uma família de quatro pessoas (dois
adultos e duas crianças). “A pesquisa ajuda a estimar a insuficiência do
salário mínimo real”, comenta o técnico regional do Dieese Lúcio
Monteiro.
E essa discrepância tem crescido com o aumento do custo de vida. O
mínimo necessário de 3.940,24, calculado em junho, é 4,2% maior em
relação a maio, mês no qual esse valor era de R$ 3.777,93. O aumento tem
relação com o encarecimento da cesta básica. Em BH, teve aumento de
4,24% no mês passado, em relação ao anterior. Apenas a compra dos 13
itens da alimentação básica – entre eles feijão, leite, óleo e farinha –
consumiu R$ 425,82 na capital mineira, o equivalente a 52,6% do salário
mínimo líquido, conforme aponta o Dieese. Se considerada uma família de
quatro pessoas, dois adultos e duas crianças, o trabalhador
belo-horizontino gastou R$ 1.277,46 somente para cobrir a despesa mínima
familiar com alimentação em junho.
Dois lados do pouco
A alta da inflação acaba tendo peso ainda maior no orçamento da
parcela da população que recebe menos, conforme explica o economista e
membro do Conselho Regional de Economia (Corecon-MG) Adriano Miglio
Porto. “Quem ganha o salário mínimo tende a ter gasto mais intenso
vinculado a produtos e serviços essenciais, como transporte,
alimentação, águ e energia elétrica. Se aumenta o preço do feijão, esse
gasto de alimentação tira a possibilidade de consumo de outros bens”,
afirma.
Mas o especialista explica que, embora seja o menor valor que um
trabalhador pode receber, o salário mínimo traz grande impacto na
economia e funciona como uma espécie de termômetro. “Ele ativa a
economia como se fosse adrenalina na veia. Normalmente, os mais pobres
consomem mais quando recebem mais dinheiro. Quando começa a segurar o
salário mínimo, corre o risco de ocorrer o contrário”, reforça o
economista. Para se ter uma ideia, o aumento do mínimo de R$ 788 para R$
880 em 2016 deve injetar R$ 57 bilhões na economia nacional, segundo o
Dieese.
Renda de 26% da população
A remuneração de até um salário mínimo é realidade entre mais de um
quarto da população brasileira com mais de 15 anos. Os dados são da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) 2014, a mais recente
pesquisa sobre o mínimo do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Um total de 42,6 milhões de pessoas (26%) recebem,
no máximo, o que o governo aponta como a menor renda mensal para suprir
as necessidades básicas do trabalhador. Em Minas Gerais, esse percentual
é maior, chegando a 28,7% da população acima de 15 anos, um total de
4,7 milhões de pessoas.
Em termos percentuais, as mulheres são quem mais recebem o mínimo.
Quase um terço das brasileiras (31,1%) são remuneradas com até um
salário mínimo, enquanto o percentual entre os homens é de 21,9%. Minas
segue esse mesmo retrato, sendo que 33,9% das trabalhadoras ganham até
R$ 880 e 23,1% das mulheres recebem até esse montante. Na capital
mineira, a discrepância entre os sexos é maior. Em BH, 24,5% das
mulheres ganham, no máximo, o salário mínimo, o dobro da quantidade dos
homens (12,5%).
Por Estado de Minas
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