Casamento custou oito milhões de reais: este não foi a Lei Rouanet que pagou
O
goiano Djalma Rezende, noivo do casamento que custou 8 milhões de
reais, nasceu na roça e era chamado de Jeca Tatu na escola.
Transformou-se no advogado número 1 das multimilionárias causas agrárias
e, mais recentemente, em protagonista de um vídeo ostentação que virou
hit na internet.
Quando o advogado Djalma Rezende estacionou sua Ferrari vermelha com o
capô aberto em frente ao salão em Goiânia onde 1 200 pessoas o
aguardavam, dois drones já sobrevoavam o carro. Convidados e fotógrafos
se aglomeraram em torno dele. Diante da plateia, dos drones e dos
flashes, Djalma acionou o mecanismo que faz a parte traseira da Ferrari
abrir-se e liberar a capota do conversível, que deslizou suavemente para
baixo: zzzzzzzip, zzzzzzip, clique. Breve silêncio. Aplausos ruidosos. O
noivo, então, desembarcou do carro sorrindo, com os dentes
branquíssimos e um lírio na lapela do terno Armani – feliz da vida (e
mais feliz ainda estaria se pudesse ter estacionado a Ferrari DENTRO do
salão, como era seu desejo, gentilmente desestimulado pelo
cerimonialista de Brasília que ele contratou). Djalma Rezende, 62 anos,
goiano, especialista em multimilionárias causas agrárias, casou-se no
último dia 1º com Priscila Maura de Carvalho, 24 anos, goiana, bacharel
em direito, numa festa que custou os olhos da cara e virou assunto nas
redes sociais mesmo antes de acontecer, graças a um vídeo que caiu na
internet e do qual se falará aqui mais adiante. Antes, uma descrição do
casamento, superlativo em cifras, brilhos e repercussão.
Os padrinhos foram 48, alguns trazidos por um dos três jatos que o
noivo pôs à disposição dos convidados de outros estados. A noiva, com
seu véu de 8 metros de comprimento, entrou com uma tiara de diamantes e
um vestido bordado com fios de pérolas. No salão de festas, decorado com
20 000 orquídeas, 93 lustres (incluindo dez Baccarats) e teto coberto
por 3 000 metros de tecido que reproduziam os afrescos do Castelo Real
de Versalhes (a noiva queria uma “decoração palaciana”), foram servidas
960 garrafas de champanhe Veuve Clicquot, 300 de uísque Royal Salute 21
anos e 380 de vinho Brunello Barbi DOCG, safra 2004 (os padrinhos
tiveram direito a seis garrafas de Château Petrus – safras 1974 e 1979).
De Brasília, vieram 257 garçons e um jantar pantagruélico, que, se
não primou pela unidade, tampouco pela coerência, impressionou pelo
ecletismo. Foram servidos bacalhau, bobó de camarão, ravióli, filé com
risoto de funghi, lagosta à thermidor, ragu de cordeiro, rosbife, torta
de salmão, ossobuco, codorna recheada, sushi, temaki, caviar e nhoque.
De sobremesa, um bolo de 2,5 metros de altura (preço já com desconto
pelo pagamento à vista: 40 000 reais), 12 000 docinhos vindos de São
Paulo e Brasília e shows de Tiago Abravanel e Anitta. Pelo casamento
ostentação, Djalma foi elogiadíssimo – e apanhou muitíssimo também.
O advogado nasceu na zona rural de Mineiros, no interior de Goiás, e
foi alfabetizado pela mãe, já que a escola mais próxima ficava a 50
quilômetros do sítio onde morava com os pais e cinco irmãos. Quando
entrou numa sala de aula pela primeira vez, já tinha 12 anos. Era
grande, desengonçado e falava com sotaque da roça, o que fez com que os
colegas o apelidassem de Jeca Tatu. Apesar de estudar de manhã e
trabalhar no resto do dia como oleiro e carvoeiro (foi também engraxate e
servente de pedreiro), sempre passou de ano em primeiro lugar, no que o
ajudou a memória extraordinária, que, colegas garantem, faz com seja
capaz de citar de cor o número das páginas em que estão trechos
importantes de processos.
Amigos e clientes o descrevem como um advogado obcecado. No início
dos anos 2000, Djalma representou a família Michels, de fazendeiros do
Centro-Oeste, em uma bilionária disputa com a empresa gaúcha Linck por
uma área de fazendas localizada na nascente do Rio Araguaia. Para
estudar o processo e achar uma saída, ele ficou enfurnado em um hotel 34
dias, incluindo Natal e Ano-Novo. Acordava às 7 para subir e descer os
quinze andares de escadas do prédio a título de exercício matinal e
dormia só quatro horas por noite, “para poder pensar mais”. No 34º dia
da autoimposta internação, encontrou “o ponto” e teve certeza de que
ganharia a ação, mas a jurisprudência de todos os tribunais do Brasil
era contrária à sua tese. O STJ, no entanto, não havia apreciado questão
semelhante ainda, e Djalma viu aí uma brecha para a vitória. Para ter
chance no tribunal superior, porém, decidiu que precisava de um parecer
do professor Humberto Theodoro Júnior, reputado nome do direito
processual. Foi ao seu escritório, em Belo Horizonte, mas o professor
não comprou o argumento e recusou-se a dar-lhe o parecer. Na tentativa
de convencê-lo, Djalma voltou lá outra vez. E outra e outra. Na última,
levou uma citação do civilista Carvalho Santos que finalmente dobrou o
jurista. Ele elaborou o parecer, Djalma ganhou o processo e enfiou 30
milhões de reais em honorários no bolso. A filha do professor, Adriana
Mandim Theodoro, mandou-lhe um bilhete cumprimentando-o pela vitória e
dizendo que sua equipe “jamais esquecerá a gentileza de suas visitas” –
seis ao todo, em pouco mais de um mês.
O advogado garante que nunca quis juntar patrimônio, prefere
gastá-lo. Não tem fazendas nem grandes propriedades. Diz possuir alguns
terrenos, a casa de 10 milhões de reais onde mora e o 6º andar no
notório edifício Excalibur, em Goiânia (onde cinco entre dez sertanejos
milionários têm apartamento). Entre os luxos que ele cultiva estão um
avião Piaggio P180, duas Ferraris, um Audi TT, um Porsche e um Land
Rover blindado, que usa para andar por Goiânia escoltado por dois
seguranças de moto. O avião e a Ferrari 458 Spider foram as estrelas do
vídeo que, produzido a pedido dos noivos para “compartilhar sua
felicidade” e lembrar os convidados da data do casamento, caiu na
internet dias antes da festa. Até a semana passada tinha mais de 200 000
visualizações no YouTube.
Priscila, hoje senhora Djalma Rezende, diz não entender o motivo de
tanto barulho: “O filme mostra uma história de amor, mas, só porque tem
coisas de alto padrão, ninguém falou da troca de olhares e do carinho
entre nós, só falaram do carro e do avião”. Sobre o fato de o carro e o
avião (e o Rolex e o anel de brilhantes e a bolsa de marca) terem
merecido takes mais demorados que os olhares carinhosos, Priscila tem um
comentário a fazer: “Hoje em dia, com essas operações, a polícia entra
na casa dos outros e acha isso, acha aquilo. O Djalma não esconde nada,
ele mostra”. A amiga Giselle Lucena, que ajudou a noiva a organizar o
casamento, conta que o advogado lhe fez um único pedido nos quinze meses
que duraram os preparativos para a festa: que ela fizesse de tudo para
que nenhum desejo de Priscila deixasse de ser atendido. Bem que podiam
ter deixado o noivo entrar de Ferrari no salão.
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