quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Em Juru, família Galdino resgata a tradicional novena de Santa Luzia

O cenário da novena de Santa Luzia, celebrada na casa do senhor Manoel Galdino na cidade de Juru, ainda é o mesmo: mudaram apenas os personagens e o enredo

Resistente às intempéries, a singela casa do senhor Manoel Galdino foi palco de memoráveis homenagens à Santa Luzia, a 'protetora dos olhos'

O engenho de rapadura do senhor Manoel Galdino não está mais lá, no mesmo local, há muitos anos foi demolido e deu lugar a uma ruazinha estreita em uma ladeira íngreme onde algumas casas já foram construídas.

Ainda está erguida, no entanto, a morada do patriarca da família Galdino, cujo imóvel resiste ao tempo e a modernidade das reformas para preservar um pouco da história da cidade de Juru, no Sertão da Paraíba.

Foi naquela casa singela, ainda hoje pintada apenas com uma demão de cal, exatamente como era antigamente, que lá pelos idos da primeira metade do século XX teve início o novenário dedicado à Santa Luzia, a santa 'Protetora dos Olhos'.

O evento homenageava também a esposa do anfitrião, que se chamava Luzia, mãe de Manoel, Antônio, José, João, Maria, Geneva, Isabel e Joana. Destes, apenas Geneva ainda é viva, esbanjando saúde e lucidez aos 93 anos de idade.

A celebração da novena de Santa Luzia foi mantida por João, o filho mais novo do senhor Manoel Galdino, atualmente resgatada por Luzimery, neta do patriarca  

Assim como a memorável festa de São Pedro, realizada no sítio Serra Branca pela família Prudente, a novena de Santa Luzia celebrada na casa do senhor Manoel Galdino era um dos principais eventos religiosos do município - ficava atrás em número de participantes e animação apenas para a festa da padroeira da cidade. 

Mesmo após a morte do circunspecto dono do engenho de rapadura, a celebração nunca deixou de ser realizada e foi mantida anualmente pelo saudoso João Galdino, filho mais novo da família. Atualmente, a continuidade da tradição é mantida por Luzimery, após o recente falecimento do pai. 

A participação de muita gente naquela época, tanto acontecia pela devoção a Santa Luzia como também pela vontade de muitas pessoas de encher a pança, já que era grande a matança de galinha capoeira e capão para serem servidos com arroz da terra, o famoso 'arroz de festa'. Aliás, tinha comida pra todo mundo, diga-se de passagem!

O que não podiam faltar na novena, era a banda de pífanos de Severino Barbosa nem a soltura de fogos fabricados pelo princesense Pedro Fogueteiro, assim como o tradicional leilão anunciado por um engraçado apregoador que insistia em perguntar "quem dava mais" pelas prendas que apresentava

Na ocasião, todas as pessoas presentes ao evento se reuniam em frente ao alpendre da casa para o início do leilão, - com exceção das lavadeiras de louças que se entretiam na cozinha e da molecada que só queria saber de se divertir no terreiro, local preferido dos casais de namorados que procuravam os lugares mais escuros para se achegarem. 

Em uma grande mesa, eram colocados obolos, sequilhos, fióis, alfinim e batida de rapadura, além de galinhas assadas e vivas, ovos, pencas de banana, pinhas, mangas e outras frutas da região, dentre diversas prendas e objetos que seriam arrematados por quem oferecesse o maior preço por cada um deles.

Para impressionar as moças que iam acompanhadas dos pais para novena, os rapazes endinheirados se digladiavam por um copo de cachaça e um pedaço de galinha assada anunciados pelo leiloeiro, que bebia uma lapada antes de apresentar as prendas e findava o leilão visivelmente embriagado.

A 'caixa de segredo', assim chamada por ser arrematada sem se saber o que tinha dentro, era a prenda mais esperada do leilão. Contudo, arrematá-la era uma exclusividade de um produtor rural solteirão e endinheirado da família Batista, que todos os anos comparecia à novena sempre vestido com um terno branco de linho e um chapéu de massa na cabeça. Apaixonado pela única filha solteira do dono da casa, Antônio Batista arrematava a tal caixa para presentear a pretendida, custasse o que custasse. Porém, o enamorado jamais teve a sua paixão correspondida e morreu em idade avançada. Joana, conhecida como Dandú, também morreu solteirona.

Com o propósito de resgatar e manter a tradição, na última terça-feira (13) os descendentes do senhor Manoel Galdino se reuniram no velho casarão branco para homenagear Santa Luzia.

Ainda resistente às intempéries, a singela casa do senhor Manoel Galdino foi palco de memoráveis homenagens à Santa Luzia, a protetora dos olhos

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