Dados do IBGE sinalizam que Agronegócio tem recuperação mais veloz do nível de empregos do pré-pandemia e atrai jovens qualificados
No terceiro trimestre de 2021, a população ocupada na agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura chegou a 9 milhões

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DOUGLAS GAVRAS E LEONARDO VIECELI
CURITIBA,
PR, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Filho de produtores de soja,
Murilo Ricardo, 32, não se imagina mais morando longe do campo. Ele, que
saiu da pequena Anaurilândia (a 368 km de Campo Grande, no MS) para
estudar agronomia, voltou para o interior para ajudar a cuidar da
propriedade da família.
"As
melhores oportunidades de trabalho para mim estão aqui, e os avanços
tecnológicos pesaram na decisão de voltar. Em pouco tempo, já consegui
implementar na propriedade parte do que aprendi na cidade e estudando no
exterior. Agora, usamos tecnologia de ponta para fazer medições. Não me
imagino longe do campo."
Dados do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística) sinalizam que a trajetória de
Ricardo não é isolada, e que as atividades ligadas ao campo já superaram
o nível de empregos do pré-pandemia, levando em consideração vagas
formais e informais.
No terceiro trimestre de 2021, a
população ocupada na agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e
aquicultura chegou a 9 milhões – o número representa um avanço de 574 mil
postos frente ao terceiro trimestre de 2019 (8,5 milhões), antes da
crise sanitária.
Em termos percentuais, o crescimento no
período foi de 6,8%. É o maior na lista de dez atividades analisadas
pelo IBGE. Os dados integram a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios Contínua).
Fora as atividades
relacionadas ao campo, apenas o setor de construção e o ramo de
informação, comunicação e atividades financeiras, imobiliárias,
profissionais e administrativas tiveram aumento da população ocupada no
mesmo período. As altas foram de 2,5% e 2,9%, respectivamente
–resultados inferiores aos registrados no campo.
Além
de liderar o ritmo de geração de empregos, o agronegócio também está
ficando mais jovem e escolarizado, segundo um levantamento exclusivo da
consultoria IDados, também a partir da Pnad Contínua: o total de
trabalhadores rurais com até 29 anos é o mais alto desde 2015. No
terceiro trimestre de 2021, eles eram 2,2 milhões.
Em
número de trabalhadores, o grupo ainda é menor do que o das demais
faixas etárias, mas foi o que mais cresceu na comparação com antes da
pandemia, com aumento de 16% em relação ao início de 2019.
Apesar de
ainda serem minoria, os trabalhadores rurais com ensino superior
incompleto ou mais dobraram nos últimos nove anos, em patamar recorde.
Eles eram 189,8 mil no terceiro trimestre de 2012. No mesmo período de
2021, já somavam 389,8 mil, ainda de acordo com os dados do IBGE.
Em
busca de qualidade de vida e redução de despesas, o veterinário Thomaz
Coelho, 31, trocou o Rio de Janeiro pela mineira Palmópolis, de menos de
7.000 habitantes. "Tinha um emprego no Rio, mas estava insatisfeito com
a rotina da cidade. Prestei um concurso e hoje atuo em fazendas de
Minas", conta.
Ele também avalia que muitos jovens de maior
formação acabam se mudando para o interior para fugir da violência e dos
problemas das grandes cidades e que a pandemia deve reforçar esse
movimento.
O pesquisador Felippe Serigati, do centro de estudos FGV
Agro, avalia que a criação de vagas no campo reflete um conjunto de
fatores. Um dos principais é o fato de atividades como agricultura e
pecuária não terem parado de operar durante a pandemia.
Restrições
adotadas para frear o coronavírus atingiram mais setores como comércio e
serviços, com grande peso em centros urbanos e dependentes da
circulação de consumidores.
Além
disso, a demanda por alimentos ficou aquecida durante a crise
sanitária, incentivando contratações de trabalhadores no campo, diz o
pesquisador.
"Em 2021, o Brasil teve seca e geadas e, com
isso, houve quebra de safra. Mas o investimento já estava feito. A mão
de obra já havia sido contratada", aponta.
A pesquisadora
Nicole Rennó, do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia
Aplicada), tem opinião semelhante. Segundo ela, a demanda aquecida e os
preços em alta por produtos da agropecuária colaboraram para o aumento
da população ocupada na pandemia.
"Os preços altos, que são o
principal elemento da conjuntura, favorecem os empregos. O avanço
superou o que era necessário para uma recuperação", afirma.
Sobre
o aumento do número de empregados rurais com ensino superior, o
pesquisador da IDados e também da FGV Bruno Ottoni diz que não é
possível medir se isso se deve pela atração de universitários ao campo
ou pelo aumento da escolaridade dos moradores dessas regiões. Mas é
provável que os dois movimentos estejam ocorrendo.
"É importante
observar que o campo é um dos setores que mais perderam mão de obra ao
longo da história, por causa do processo de mecanização, que vai se
acentuar. As novas gerações de trabalhadores rurais terão de ser mais
treinadas para essa realidade também."
AUMENTO DO EMPREGO ESBARRA EM DESAFIOS
A
enfermeira Greice Cizeski, 31, também deixou para trás a vida na
cidade. Em meio aos impactos da pandemia em sua rotina de trabalho,
largou o emprego em um hospital na região metropolitana de Florianópolis
(SC) no último mês de abril.
Filha de produtores rurais, escolheu
voltar para perto da família, no município de Morro da Fumaça, a cerca
de 200 quilômetros da capital catarinense. Ela acaba de abrir uma
queijaria com os pais na cidade de cerca de 18 mil habitantes.
"Tudo
isso aconteceu durante a pandemia. Meu pai me apoiou bastante", conta.
"Tinha trabalhado na roça com meus pais até os 17 anos. Lá atrás tudo
era mais difícil. Não tinha tecnologia. Hoje é diferente", relata.
O
campo vem se destacado na geração de empregos, mas, no horizonte para
2022, há uma combinação entre possíveis estímulos e riscos à expansão da
mão de obra.
Por um lado, as previsões indicam um ano mais favorável
do ponto de vista climático, na comparação com 2021. Isso pode gerar
reflexos positivos no mercado de trabalho.
O movimento de
contratações, no entanto, é ameaçado pela alta nos custos produtivos,
pondera o Serigati. Itens como fertilizantes, que dependem de
importações, dispararam com o dólar elevado durante a pandemia,
pressionando o bolso dos produtores.
Nicole também entende que os
custos desafiam o setor em 2022, mas projeta um cenário positivo para a
geração de empregos nos próximos meses.
"A perspectiva é que
essa melhoria no mercado de trabalho continue mais um pouco, pelo menos
nos primeiros trimestres de 2022. Há um grande desafio que é o aumento
de custos, mas, no geral, ainda esperamos um bom ano para a
agropecuária", diz.
"Isso deve continuar a favorecer o mercado
de trabalho e ajudar a segurar uma tendência contrária de muitos anos
que é a redução da população ocupada na agropecuária", diz a
pesquisadora.
Apesar do avanço na crise, as atividades de
agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura ainda
representam menos de 10% da população ocupada no país.
No
terceiro trimestre de 2021, os cerca de 9 milhões de trabalhadores
nessas atividades correspondiam a 9,7% de um universo de 93 milhões de
ocupados.
No
mesmo período, o rendimento médio do trabalho, em termos reais, foi de
R$ 1.517 na agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e
aquicultura.
O número é o segundo menor
entre as 10 atividades da Pnad Contínua. Só fica acima da renda média
obtida com serviços domésticos (R$ 920).
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