Presidente de Câmara de Vereadores na Paraíba comanda cabaré de Caicó que viralizou com live
Parte da renda revertida da primeira live
solidária, o cabaré doou para freiras - que se negaram a comentar o caso
junto a reportagem da Folha de S.Paulo
A
pandemia tem dificultado diversos setores da economia no país, com isso
também gera crise no entretenimento adulto estados afora. Pensando em
driblar as adversidades, o Cabaré Sol e Lua, localizado em Caicó,
interior do Rio Grande do Norte realizou uma live semanas atrás que
arrecadou R$ 10 mil, produtos de higiene e meia tonelada de alimentos
para as garotas de programa que atuam na casa. O sucesso foi tanto, que
uma live mais produzida aconteceu no último sábado (7). A Folha de
S.Paulo fez uma reportagem especial sobre o caso – confira na íntegra abaixo.
Quem está por trás do empreendimento e da empreitada digital é Lilia
Saldanha. Além de empresária, ela é presidente da Câmara de Vereadores
de São José do Brejo do Cruz, no interior paraibano, cidade há 70km do
município potiguar.
Uma
curiosidade é que famílias e empresários e empresárias se mobilizaram
para realizarem grandes doações na segunda live do cabaré. E com a renda
revertida da primeira ação digital, o cabaré doou parte do dinheiro
para freiras – que se negaram a comentar o caso.
Confira reportagem da Folha na íntegra
As meninas do Cabaré Sol e Lua, na pequena Caicó, sertão potiguar,
despiram-se dos trajes sensuais e deram um até logo à pista de
striptease e aos quartinhos de sexo. Desempregadas por causa da
pandemia, abandonaram a cidade. A dona do bordel, responsável pelo
empreendimento, percebeu que tinha de fazer alguma coisa para salvar o
negócio e as meninas. Ela apostou na solidariedade e pôs no ar uma live
que, direcionada aos frequentadores da casa, evocava a memória de
momentos mais felizes.
No vídeo, Ariana Maia Saldanha, 46, conhecida desde garotinha como
Lilia Saldanha, vai direto ao ponto: é hora de ajudar as meninas que o
novo coronavírus tirou da cena.
Enquanto fala sem rodeios das dificuldades, uma morena voluptuosa, de
trejeitos sensuais, faz poses, caras e bocas. É a Michelle (nome
artístico) que se enrosca no poste num momento pole dance ao som do hit
“Amor de rapariga”: “Amor de rapariga não vinga, não/ não tem
sentimento/ não tem coração”.
A repercussão do vídeo, de uma hora 34 minutos de duração,
transmitido na noite de 3 de maio no canal da empresária no YouTube, com
mais de 164 mil visualizações, surpreendeu Lilia Saldanha.
A produção foi além do Nordeste e conquistou a simpatia até mesmo de
um juiz de Brasília, provando que amor de rapariga pode, sim, tocar o
coração. Popularidade e solidariedade, de braços dados, amealharam
doações suficientes para amparar as profissionais e também um lar de
idosos e uma das igrejas locais, aos quais Lilia destinou uma parte dos
recursos.
![]() |
Lilia Saldanha transmite a live solidária em seu canal no Youtube |
A transmissão ao vivo do Cabaré Sol e Lua arrecadou R$ 12 mil, meia
tonelada de alimentos e produtos de higiene e 108 cestas básicas,
mostrando que, no anonimato, também pode existir muita solidariedade.
Lilia percebeu que estava no caminho certo e decidiu usar seu talento
para criar uma segunda live – agora, com clima de festa junina e
acessível em Libras –, prometida para ir ao ar neste domingo (7).
A empresária Ana Claudia Vale, 30, com quem Lilia é casada há seis
anos, ajudou a viabilizar o projeto. “Em tempos tão difíceis, a live
serviu para mostrar solidariedade e compaixão.”
Pela primeira vez em 16 anos, o Cabaré Sol e Lua interrompeu suas
atividades. Ali chegaram a trabalhar simultaneamente 25 garotas, que
cobravam de R$ 150 (para fazer um strip) a R$ 300 (para ir às vias de
fato).
“Cabaré que eu não mando, eu fecho”, avisa Lilia. “As meninas tiveram
que voltar para suas cidades no começo de abril”, lembra. “Muitas não
tinham o que comer, me ligavam pedindo ajuda.”
Dona do prostíbulo, Lilia também é vereadora pelo PP, que faz parte
do centrão, bloco de partidos que apoia o governo em troca de cargos e
verbas do Executivo. Ela ainda preside a Câmara de São José do Brejo do
Cruz, cidade paraibana a cerca de 70 km de Caicó.
Na transmissão ao vivo, Lilia aparece sentada, anunciando marcas de
“patrocinadores”, como a Granja Caicó, o Bar do Macaco e o Armazém
Paulino, que doaram cachaça, álcool em gel, ovos, pizza, pastel, tábua
de frios, entre vários outros itens.
Casada, mãe de três filhos, a empresária Gislana Maia, 41, dona de 14
óticas em Natal (RN) e Fortaleza (CE), destacou-se entre os doadores,
ao fazer chegar à casa do prazer meia tonelada de alimentos e produtos
de higiene. Gislana faz questão de declarar a origem das doações: “Foram
mães de família e pais empresários bem casados os que mais doaram”.
Reconhece que “as pessoas têm um certo preconceito, mas agora é hora de
ajudar”. Queixa-se, porém, de que a live foi tirada do ar bem na hora em
que, nas palavras dela, “estava mobilizando multidões”.
Nas redes sociais, houve quem tenha classificado o YouTube de “cabarefóbico”.
Neste momento, em que equipes foram reduzidas devido à pandemia,
informa o canal de vídeos, o serviço conta mais com a tecnologia para
ajudar na revisão de conteúdo, o que pode resultar tanto em remoções
acidentais, que não violam suas políticas, quanto em maior demora para
retirar vídeos que as infrinjam.

“Não infringimos norma alguma”, responde Ana Claudia. Segundo ela, o
canal do cabaré saiu do ar por volta das 20h45 e só retornou depois das
2h do dia seguinte. “Chegou a ter 7.000 visualizações simultâneas antes
de cair.”
Prova de que o vídeo não ofendeu a moral e os bons costumes é o que
diz o advogado Lucas Santos de Medeiros, 24, católico fervoroso: “Vi com
bons olhos a live. É um ato de generosidade”, lembrando que a dona do
cabaré repassou muitas doações às irmãs clarissas do mosteiro, que vivem
na clausura.
Medeiros, que nunca faltava à missa das 7h, no Mosteiro Nossa Senhora
de Guadalupe, foi obrigado a abster-se da prática religiosa e agora
anda preocupado com a sobrevivência das freiras, pois elas dependem de
donativos.
Procuradas, as irmãs não quiseram comentar, por telefone, as doações vindas da live do cabaré.
A rede de solidariedade na pequena Caicó, de 68 mil habitantes,
também não deixou de fora os animais sem dono. O agrônomo e veterinário
Júlio César Fernandes de Azevedo, 37, conta que, antes de a live entrar
no ar –diga-se, totalmente improvisada–, havia muita descrença nos
resultados, mas, no fim, veio a surpresa positiva: “Os animais de rua
ganharam 800 kg de ração”.
Veja vídeo:
Na avaliação do representante comercial Hudson Santos, 36, nascido
ali, mas morador da capital, Natal, os bons frutos eram esperados, pois,
segundo ele, o caicoense é um povo bastante solidário. “Mobilizou
famílias, religiosos. Não teve preconceito. A gente abraçou a causa”,
diz.
Quem assistiu à transmissão até os instantes finais pôde ouvir fortes
batidas nas portas do bordel. Era uma prostituta que, de passagem pela
rodovia RN-288, escutou, abafada pelas paredes do lupanar, a
inconfundível voz de Reginaldo Rossi, que entoava o clássico “Garçom”,
hino dos cabarés Brasil adentro. Imaginou que o Sol e Lua estivesse a
todo o vapor, funcionando às escondidas, em plena quarentena e se
apresentou ao trabalho.
Para evitar bafafá, o ambiente da transmissão deste domingo pode até
lembrar o de uma boate, mas vai ser cenário, montado longe do cabaré, em
um endereço guardado a setes chaves.
Nova live fora do ar
A reportagem do site Paraíba Já checou o canal de Lilia Saldanha, ao que parece o Youtube removeu a live do canal – que já tem quase 8 mil inscritos.
Assista como foi a primeira live solidária:
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