Por que alguns artistas idosos decidem antecipar a morte, um drama quase invisível – Por Jeff Benício
Há
alguns tabus ainda poucos discutidos na sociedade. Evita-se tocar no
assunto como se essa omissão evitasse o problema. Uma questão quase
sempre censurada é o suicídio de idosos. De acordo com a Organização
Mundial da Saúde (OMS), pessoas acima de 60 anos formam o grupo
populacional de maior risco para o suicídio.
Apesar da alta
incidência — 9 mortes de idosos a cada 100 mil habitantes, cerca de
1.200 óbitos por ano no País — pouco se fala a respeito desse drama
quase invisível. Na segunda-feira (4), o assunto ganhou espaço na mídia
em consequência da morte de Flavio Migliaccio, aos 85 anos, encontrado
morto pelo caseiro de seu sítio. “Segundo a Polícia Militar, a causa da
morte foi suicídio”, informou o Jornal Nacional. Ele deixou uma carta
reveladora e triste.
“Me desculpem, mas não deu mais. A velhice
neste País é o caos como tudo aqui. A humanidade não deu certo. Eu tive a
impressão que foram 85 anos jogados fora num País como este. E com esse
tipo de gente que acabei encontrando. Cuidem das crianças de hoje!
Flavio.”
Com 62 anos de carreira na televisão, Migliaccio era
querido e respeitado pelos colegas de profissão, o público e a imprensa.
Nas novelas e séries surgia quase sempre em papéis cômicos, como
o Mamede de Órfãos da Terra e seu Chalita de Tapas & Beijos. Nas
entrevistas, exalava bom humor. Por isso, a interrupção de sua vida
produziu comoção e estranhamento. “Por quê?” foi a frase mais dita a
respeito da trágica notícia.
O psiquiatra e reorganizador da mente
Isaac Efraim fez em sua página @ansiedadebrasil, no Instagram, uma
rápida análise a respeito da provável condição emocional de Flavio
Migliaccio. “Claramente, pela carta, ele estava em um estado de
depressão. Dependendo da gravidade, você tem na depressão uma total
distorção da realidade. Qualquer perspectiva de ter tido prazer na vida,
ou vir a ter, desaparece”, esclarece o médico. “Mais do que isso, todos
os aspectos negativos ficam distorcidos de uma maneira intensa, dando a
sensação de que a vida é só desgosto.”
A
atitude extrema de Migliaccio nos faz lembrar de outro suicídio que
abalou o universo artístico e os fãs de teledramaturgia, teatro e
cinema. Em 18 de janeiro de 2013, o aclamado Walmor Chagas, então com 82
anos, deu fim à própria vida com um tiro na cabeça. O corpo foi
encontrado por um funcionário da pousada que o ator mantinha e onde
morava, em Guaratinguetá, interior de São Paulo. Na
época, Walmor enfrentava vários problemas de saúde: tinha dificuldade
para andar e estava com a visão seriamente comprometida. “Ele não quis
ser um peso para ninguém. Escolheu a hora da própria morte”, declarou à
imprensa um amigo, Antonio Carlos Cardoso.
Outro exemplo de morte
antecipada devido a problemas emocionais ocorreu em 26 de março de 2006.
No início da noite daquele domingo, o corpo da atriz Ariclê Perez foi
encontrado pelo porteiro do prédio onde morava, em Higienópolis, na
capital paulista, após queda de 10 andares. Estava com 62 anos. Horas
antes, ela deixara na portaria um bilhete com os telefones de parentes
para o caso de uma emergência. Famosa por ter participado de trabalhos
de sucesso na TV, como Felicidade, Anjo Mau e A Casa das Sete
Mulheres, Ariclê era admirada por emprestar intensidade e elegância às
personagens. De acordo com o delegado do caso, familiares relataram que a
atriz passava por “profunda depressão”.
De acordo com a
literatura médica, o gatilho para o suicídio de um idoso — famoso ou
anônimo — pode ser um transtorno mental, o incômodo de se ver dependente
de outras pessoas, o devastador sentimento de solidão, a sensação de
uma existência inútil, entre outras possíveis causas. Quem tem
pensamentos suicidas deve pedir ajuda a um profissional de saúde mental.
Há medicamentos capazes de amenizar o sofrimento. A psicoterapia também
é uma indicação. Para uma emergência, o CVV (Centro de Valorização da
Vida) possui atendentes treinados para conversar com quem está em
desespero ou completo desalento. O telefone gratuito é 188.
* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Polêmica Paraíba
Fonte: Polêmica Paraíba com Portal Terra - Publicado por: Fabricia Oliveira
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