Fabricantes de armas usam ‘influencers’ para se promoverem nas redes sociais

A influencer digital Rita Pearl posa com uma arma - ARQUIVO PESSOAL
Nesse contexto, muitas empresas descobriram nos influencers
de armas uma oportunidade de anunciar e atingir grandes públicos. Por
exemplo, a Gunship Helicopters —uma empresa de Las Vegas, onde seus
clientes podem disparar armas de um helicóptero— faz fotos e vídeos de
mulheres jovens testando seus serviços, com milhares de seguidores em
campo.
Essas influencers costumam ser defensoras
do direito de portar armas que posam com pistolas de todos os tamanhos.
Algumas são esportistas, outras, amantes da caça e há ainda as que
começaram a se interessar por armas depois de serem vítimas um episódio
violento. Todas acumulam milhares de seguidores. Charissa Littlejohn tem
mais de 390.000 seguidores; Liberte Austin, mais de 220.000; Lauren
Young, mais de 190.000; e Kimberly Matte, mais de 85.000.
O
perfil desta última usuária está repleto de fotografias nas quais posa
com armas grandes. “Deus abençoe a América! Feliz 4 de julho”, diz ela
em um post em que carrega um rifle grande e usa um maiô com uma estampa
de bandeira dos EUA e botas altas vermelhas. A foto tem mais de uma
dúzia de tags de contas nas quais fotografias deste estilo
podem ser encontradas, como por exemplo, america.guns.girls.freedom,
girlsgunsunlimited e girlswith_guns.
Austin
também compartilha fotos desse tipo. Em uma delas, aparece dormindo com
um pijama da bandeira dos Estados Unidos, e muitas armas atrás. A
publicação tem o seguinte texto: “Foto minha dormindo tranquilamente”. E
também posa com uma menina que carrega uma pistola. “Eu peguei da minha
mãe”, explica um texto na foto publicada no Dia das Mães.
Da
mesma forma, Littlejohn mostra suas armas ao lado de bichinhos de
pelúcia de seu filho e afirma em sua conta que ele mal pode esperar para
aprender a atirar. Algumas semanas antes do nascimento dele, ela
publicou uma foto de sapatinhos de bebê ao lado das mesmas Converse dela
e seu companheiro. Poderia ser um simples post antes do parto, não
fosse o fato de os sapatinhos do menino estarem rodeados por quatro
armas. “Até já consegui uma para @babyyygat quando chegar …”, escreveu
ela a respeito.
Mais homens com armas
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| Rita Pearl, em outra imagem cedida por ela |
Os
Estados Unidos são um país com 326 milhões de habitantes e 393 milhões
de armas, de acordo com um levantamento de 2018 sobre armas leves,
denominado Small Arms Survey. Possuí-las é um direito contemplado na
segunda emenda da Constituição. Embora a maioria dos ‘influencers’ de
armas no Instagram seja mulher, essas peças são principalmente de
propriedade de homens nos Estados Unidos. De acordo com dados coletados
em 2017 pelo Pew Research Center, 62% dos proprietários de armas no país
eram homens e cerca de três quartos deles possuíam mais de uma arma.
Rita
Pearl, uma mulher hispânica de 30 anos que mora na Califórnia, também
compartilha frequentemente publicações desse tipo com seus 53 mil
seguidores no Instagram: desde vídeos nos quais carrega armas e atira em
diferentes alvos até fotografias posando com rifles grandes. Afirma
fazer isso para inspirar outras mulheres e acredita que as armas de fogo
são um esporte e uma ferramenta de defesa. “Ser uma pessoa influente em
produtos de beleza, viagens ou moda se baseia mais no orgulho do que na
adrenalina ou na segurança. Gosto de produtos de beleza e gosto de me
maquiar, mas se for para influenciar as mulheres, prefiro falar da
segurança das armas, porque ensinar como se maquiar não vai salvar a
vida delas”, explica a EL PAÍS.
Tanto
homens como mulheres citam a proteção como um motivo para possuir uma
arma de fogo, em porcentuais praticamente iguais, de acordo com o Pew
Research Center. Mas 27% das mulheres que têm armas dizem que esta é a
única razão pela qual as possuem –em comparação com 8% dos homens.
Nos
últimos anos tem havido uma crescente pressão social nos EUA para que
se restrinja o comércio de armas. A probabilidade de ser morto a tiros
no país é 24 vezes maior do que na Espanha e 100 vezes maior que no
Japão. Desde o início do século 21 houve mais de 200 tiroteios em
escolas primárias e secundárias e faculdades nos Estados Unidos, nos
quais mais de 200.000 estudantes ficaram expostos, de acordo com
informações coletadas por The Washington Post e por este
jornal. Há vários estudos que vinculam uma legislação restritiva com a
diminuição do número de homicídios e de assassinatos de crianças.
Em média, uma mulher é morta a tiros em meio a brigas por violência machista a cada 16 horas nos EUA, de acordo com a Associated Press.
Neste contexto, é comum que os fabricantes de armas e alguns defensores
da segunda emenda encorajem as mulheres a comprar armas para se
defenderem.
É o caso de Pearl, que está convencida de que
“não permitir armas de fogo deixa os criminosos felizes porque sabem
que você não pode se defender”: “Não defendo a violência e não é certo
matar pessoas, mas não está certo ser a vítima. Uma arma de fogo é para
impedir que as pessoas más cometam mais crimes”. Além disso, considera
que ao proibi-las “se cria um mercado negro e isso faz com que as
quadrilhas, as gangues e os cartéis ganhem muito dinheiro”.
Controle do Instagram
Em algumas ocasiões, o Instagram não permitiu que Pearl publicasse algumas de suas fotos. A instagrammer diz
que tentou um contato com a empresa quando isso aconteceu, mas não
recebeu uma resposta a respeito. Há fabricantes de armas que também
encontram dificuldades ao publicar conteúdo ou anunciá-las. Liberty Safe
vende cofres de segurança para armas. Antes as fabricantes costumavam
postar fotos de cofres abertos com armas dentro, mas quando tentaram
promovê-las, o Instagram impedia o anúncio. Agora, anunciam os mesmos
cofres, mas fechados e com muitas influencer na frente
segurando grandes rifles. E as pessoas entram em contato com os
‘influencers’. Austin recebeu gratuitamente um cofre de cerca de 4.000
dólares (16.000 reais) em troca de uma série de posts no Instagram,
segundo relatou ao site de notícias Vox.
Esta influencer contou ao mesmo site que costuma receber cerca de 175 dólares (700 reais) por publicação. Existem dezenas de influencers de
armas que vivem parcial ou completamente de seus posts no Instagram,
como o Vox comprovou. No entanto, outras como Pearl, garantem que não
recebem para publicar suas fotografias: “Não sou patrocinada por nenhum
fabricante de armas de fogo. Nem tenho apoio de nenhum partido político.
Não estou promovendo a venda de armas de fogo. Estou promovendo, de
forma gratuita, a importância da segurança das armas e o direito de
portar armas”.
A grande maioria dessas influencers não
publica só fotos portando armas de fogo. Por exemplo, Austin também
patrocina suplementos de proteína ou kits de branqueamento de dentes.
Entre as publicações de Pearl disparando em diferentes alvos, ela também
aparece em fotos com cavalos, andando de quadriciclo, passeando com
amigos e em imagens parecidas com as que outro perfil de influencer poderia compartilhar na rede social.
Fonte: El País - Créditos: ISABEL RUBIO

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