Para Fernando Henrique Cardoso, Brasil deve ter cuidado ao se meter na Venezuela
Para o ex-presidente, a redemocratização brasileira é um bom exemplo de como é necessário apoio popular maciço para mudança de regime
© REUTERS/Nacho Doce
BOSTON, EUA (FOLHAPRESS) - O
Brasil precisa tomar cuidado para não entrar em uma disputa de poder
entre China, Rússia e Estados Unidos, ao fazer intervenções para
restaurar a democracia na Venezuela, afirmou o ex-presidente Fernando
Henrique Cardoso em debate na Brazil Conference, realizada pela
universidade Harvard e pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT).
"Hoje a Venezuela é sustentada pela Rússia e China e conta com
presença cubana, e isso se contrapõe à pressão americana. Até que ponto
nos vamos nos meter? Vale a pena?", afirmou, em debate ao lado do
ex-presidente do Equador, Jamil Mahuad, e de Gonzalo Koncke, chefe de
gabinete do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos
(OEA), Luis Almagro. "Há interesses grandes que não são nossos."
FHC
voltou a advertir para o perigo de qualquer intervenção militar no país
e se referiu a experiências anteriores desastrosas, como as
intervenções no Iraque e na Líbia. "Usar pressão militar para tentar
resolver crises como a venezuelana não dá resultado ou demora muito. A
Líbia foi bombardeada e olhem como está. O Iraque também foi um
desastre."
Segundo
o tucano, certa vez um general americano foi falar com ele sobre o
conflito no Iraque e tinha todas as credenciais acadêmicas. "Ele sabia
tudo sobre o Iraque, só não sabia que existia um povo ali. Essa é a
questão na Venezuela, lá também tem um povo."
Para FHC, a redemocratização brasileira é um bom exemplo de como é necessário apoio popular maciço para mudança de regime.
"No
Brasil, o regime [militar] só mudou quando houve a forte mobilização
pelas eleições diretas", disse. "É preciso haver um amadurecimento
interno, que pode ser precipitado por pressões externas, mas precisa
haver esse amadurecimento". E o ex-presidente diz achar que talvez isso
ainda não esteja amadurecido dentro da sociedade venezuelana.
Isso
não significa que o Brasil e a OEA devam deixar de fazer pressão para
que haja uma transição democrática, mas é preciso tomar cuidado com o
tipo de ação que o Brasil fará em relação ao país vizinho.
"A
Venezuela vai seguir sendo nosso vizinho e nossas ações deixarão marcas,
dependendo do que se fizer no presente se pagará no futuro", disse. Ele
lembrou da invasão americana na República Dominicana em 1965 –o Brasil
enviou tropas para lá a pedido dos americanos. "Custou muito para
recuperarmos nossa reputação entre esses países."
Mahuad, ex-presidente do Equador que foi deposto em 2000, alertou
para o fato de que "dezenas de milhares de soldados de outros países
estão na Venezuela e a população está armada, nos coletivos, o que
complica tudo."
Notícias ao Minuto
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