163 pessoas trans foram mortas em 2018 no Brasil; 83% dos crimes são cruéis
Nessa
terça (29) é o Dia Nacional da Visibilidade Trans, mas há pouco para
se comemorar. O Brasil segue na liderança do ranking dos assassinatos
de pessoas trans no Mundo, conforme publicado no último relatório da
Trangender Europe (TGEU), instituição que monitora os casos de
assassinatos desse tipo em todo o mundo. E como se trata de dados
coletados na mídia, o número de ocorrências desse tipo pode ser ainda
maior, porque existe grande índice de subnotificação.
Para
marcar a data, foi lançado um Dossiê dos Assassinatos e da Violência
contra Travestis e Transexuais no Brasil em 2018. O levantamento, único
do Brasil com esse nível de detalhamento, foi realizado pela Associação
Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA) em parceria com o
Instituto Brasileiro Trans de Educação (IBTE). Ele evidencia os
assassinatos que aconteceram contra a população Trans em 2018, mas
também traz dados sobre tentativas de assassinatos, violações de
direitos humanos e outras mortes não solucionadas.
“O
que a gente percebe nesse relatório é que o Brasil continua sendo um
país violentíssimo. O País está sem norte, na minha concepção, dado o
rumo que o governo federal tem dedicado às nossas populações. Não temos
uma política efetiva”, conclui a presidenta da Antra, Keila Simpson.
O
dossiê aponta que, em números absolutos, os assassinatos de pessoas
trans diminuíram de 2017 para 2018. Apesar disso, a presidente da Antra
afirma que não houve diminuição da violência. “Nos perguntávamos sobre
uma aparente queda nos números sobre casos de assassinatos, e chegamos à
conclusão do motivo: um aumento de 30% na subnotificação dos casos pela
mídia. Isso faz parecer que houve uma queda nos assassinatos, quando na
verdade o que existe é um aumento na invisibilidade destas mortes. Esse
tipo de violência está naturalizada”, explica.
Levando
em conta a denúncia de Keila, no ano de 2018 ocorreram 163 assassinatos
de pessoas trans , sendo 158 Travestis e mulheres transexuais, quatro
homens trans e uma pessoa Não-Binária. Destes, a associação encontrou
notícias de que apenas 15 casos tiveram os suspeitos presos — o que
representa 9% dos casos.
Ainda em
números absolutos, o Rio de Janeiro foi o estado em que mais se matou
pessoas trans no ano passado, com 16 assassinatos. Em segundo lugar
ficou a Bahia, com 15 crimes e em terceiro, o estado de São Paulo,
onde foram mortas 14 pessoas trans. O quarto e o quinto lugar ficaram
com o Ceará e o Pará, em que ocorreram 13, e 10 assassinatos dessa
população, respectivamente.
“Obviamente
uma sociedade que é orientada por um presidente da República, ou por um
candidato que se encontra à frente nas pesquisas, que infla um discurso
de ódio contra um segmento, o cidadão civil vai se achar no direito de
agredir, de violentar, de espancar? Esse discurso consegue, sim,
aumentar a violência que já é grande contra a nossa população”, ela
pondera.
Os lugares onde aconteceram mais crimes
A
maior concentração dos crimes foi registrada no Nordeste: foram 59
assassinatos, 36,2% dos casos do País. A maioria das vítimas é jovem:
60,5% das delas tinham entre 17 e 29 anos e a idade média das vítimas
dos assassinatos em 2018 é de 26,4 anos — uma queda de 1,3 anos em
relação a 2017.
O documento ainda informa que 65% dos assassinatos foram direcionados a profissionais do sexo e 60% deles aconteceu nas ruas.
Mais da metade dos crimes — 53% — foi por armas de fogo, 21% por arma branca e 19% por espancamento, asfixia e/ou estrangulamento – em 83% dos casos os assassinatos foram cometidos com requintes de crueldade e 80% dos assassinos não tinham relação direta com a vítima. 82% dos casos foram identificadas como pessoas negras e pardas.
Mais da metade dos crimes — 53% — foi por armas de fogo, 21% por arma branca e 19% por espancamento, asfixia e/ou estrangulamento – em 83% dos casos os assassinatos foram cometidos com requintes de crueldade e 80% dos assassinos não tinham relação direta com a vítima. 82% dos casos foram identificadas como pessoas negras e pardas.
Ainda
segundo o dossiê, “as questões de gênero se reforçam e demonstram que
97,5% (aumento de 3% em relação a 2017) dos assassinatos foram contra
pessoas trans do gênero feminino (158 casos). No ano de 2018 foram
noticiados pela imprensa brasileira 71 tentativas de homicídio, um
aumento de 9,8%, sendo que todas as vítimas são do gênero feminino.”
Transfeminicídio
vem se reproduzindo entre todas as faixas etárias, diz a pesquisa. Uma
pessoa trans apresenta mais chances de ser assassinada do que uma
pessoas cisgênera. Estas mortes, no entanto, são mais frequentes entre
travestis e mulheres transexuais negras. As negras também tem a menor
escolaridade, menor acesso ao mercado formal de trabalho e a políticas
públicas.
Crimes com crueldade
A
solução desse problema, segundo Keila, passa pela criação de leis que
coíbam esses crimes. “Claro que a lei por si, só, não vai resolver – a
despeito da lei do racismo, as pessoas ainda infringem a lei – mas pelo
menos teríamos um aparato legal. É preciso qualificar e punir esses
agressores.” Keila também acredita que muitos crimes que deveriam ser
punidos como transfobia, tem suas penas atenuadas por serem
classificados como homicídios ou latrocínios. Como exemplo, ela citou o
caso da travesti Quelly da Silva, morta no último dia 20, em Campinas,
São Paulo. O criminoso afirmou ter tirado o coração da vítima, colocado a
imagem de uma santa no lugar e guardado o órgão em sua casa, além de
furtar seus pertences. “Isso não é apenas um homicídio. É tétrico e foi
motivado por transfobia.”
São
apontados, também, 72 casos de violações de direitos humanos. Os casos
registrados, em sua maioria, têm ligação com transfobia, sendo 77% dos
casos: desde a proibição de usar o banheiro de acordo com sua identidade
de gênero, até a negativa de usar o nome social nos documentos
escolares.
O
dossiê registra ainda oito mortes por suicídio, cinco por aplicação de
silicone industrial e dois por uso indiscriminado de hormonioterapia.
Fonte: uol - Publicado por: Alana Yaponirah
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