A um dia da eleição, fake news sobre candidatos inundam redes sociais
WhatsApp está entre as plataformas mais usadas pelos eleitores para se informar sobre a votação - Marcello Casal Jr./Agência Brasil |
Na véspera da votação do primeiro turno das eleições, as
chamadas notícias falsas inundam redes sociais. Vídeos editados, imagens
com o dia errado de votação, fotos com candidatos com estampas de
camisa alterada, áudios simulando vozes de candidatos para sugerir
determinadas reações a pesquisas. No vale-tudo das eleições, conteúdos enganosos têm se proliferado na web.
Os exemplos são vários. No dia 4 de outubro, a agência de checagem de
fatos Aos Fatos divulgou texto explicando que não foi Fernando Haddad o
ministro responsável pela distribuição de um livro no qual um dos
textos tratava de incesto. A acusação foi disseminada por redes sociais.
A agência também desmentiu a afirmação do deputado federal Eduardo
Bolsonaro (PSL-SP) no dia 30 de setembro de que o ato em apoio a Jair
Bolsonaro (PSL) teria reunido 1 milhão de pessoas na Avenida Paulista,
em São Paulo.
No dia 21 de setembro, o projeto Estadão Verifica desmentiu áudio
atribuído a Jair Bolsonaro (PSL) em que uma pessoa com voz semelhante à
dele simulava o político reclamando de uma pesquisa no hospital onde
estava em recuperação e xingando enfermeiras. No dia 29, a Agência Lupa
desmentiu capas falsas das revistas Época, Veja e Exame nas quais um representante da Organização dos Estados Americanos (OEA) admitia negociações para fraudar urnas eletrônicas.
A coligação Brasil Feliz de Novo, encabeçada por Fernando Haddad,
anunciou ontem (4), a entrega de 92 páginas de denúncias de conteúdos
falsos ao TSE. As mensagens foram recebidas por eleitores por meio de um
canal aberto na plataforma WhatsApp. Na petição, a coordenação jurídica
da campanha solicita a remoção dos conteúdos em perfis e páginas do
Facebook e do Twitter e divulgação de um direito de resposta aos
usuários atingidos pelas postagens.
Agências e projetos de checagem têm recebido muitas denúncias de
textos, imagens e vídeos enganosos. Segundo Tai Nalon, diretora do site
Aos Fatos, que atua na conferência da veracidade de conteúdos, nas
últimas semanas têm crescido a circulação de mensagens questionando a
lisura do processo eleitoral e apontando riscos nele, como fraude nas
urnas eletrônicas. “Há muitas questões ligadas à agenda mais
conservadora, como ideologia de gênero, religião, declarações de votos
por celebridades. Esse tipo de desinformação é muito frequente”, contou.
Para Tai Nalon, a aproximação das eleições aumenta a demanda das
pessoas por informação sobre os candidatos. Isso provoca uma busca tanto
por informação de qualidade quanto por desinformação. E o principal
espaço da circulação tem sido o WhatsApp. Pelo caráter fechado da
plataforma, acrescentou, é difícil saber qual o volume de mensagens, de
pessoas acessadas e o alcance delas junto ao eleitorado, bem como os
impactos que essa prática vai ter na urna.
Na opinião do diretor da ONG SaferNet e integrante do Conselho Consultivo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para fake news,
Tiago Tavares, essa eleição tem sido marcada por uma avalanche de
desinformação produzida em “escala industrial” para confundir o eleitor e
prejudicar candidaturas. Na avaliação de Tiago, em que pese a Justiça
eleitoral ter um caráter reativo (de agir a partir de ações e
denúncias) poderia haver uma punição mais efetiva nos centros de
produção e disseminação de conteúdos enganosos.
“Preocupa o fato de a poucos dias das eleições a gente não ter nenhum
anúncio em relação sobretudo a que tipo de punição pode ter a agências
de comunicação usadas como verdadeiras fábricas de conteúdo fraudulento
que estão sendo impulsionado por fazendas de robôs e chips de
celulares”, afirmou.
Segundo a diretora da organização Coding Rights e integrante do site de monitoramento de discursos discriminatórios Tretaqui,
Joana Varon, a desinformação nas redes tem um caráter ainda mais
preocupante, pois vem misturada com discursos de ódio a grupos e pautas.
Essas mensagens têm se beneficiado por não ter um contraponto a ataques
e discursos enganosos, nem mesmo por parte da imprensa tradicional.
A ativista cita como exemplo os atos #EleNão, contra o candidato Jair
Bolsonaro, promovidos no dia 29 de setembro. Diversas publicações com
fotos falsas ou vídeos editados circularam nas redes se referindo aos
atos, inclusive por parte de algumas candidaturas. “Esse tipo de
informação muitas vezes não é desmentida, e as pessoas acabam ficando
sem o contraponto”, disse Varon à Agência Brasil.
Fonte de informação
De acordo com um levantamento realizado pela empresa MindMiners a pedido do site Nexo com eleitores brasileiros em
setembro, as redes sociais são o principal meio de informação nas
eleições, citadas por quase 60% dos entrevistados. Em seguida, vieram o
horário eleitoral gratuito na TV (53%) e conversas com amigos e família
(38%). As redes sociais mais populares foram o WhatsApp (90%), o Facebook (85%) e o YouTube (72%).
Outra pesquisa, realizada pelo Instituto Datafolha e divulgada nesta
semana, apontou que 81% dos eleitores de Jair Bolsonaro (PSL) participam
de alguma rede social. Entre os apoiadores de Ciro Gomes (PDT) o índice
foi de 72% e entre os de Fernando Haddad (PT), de 52%. O grupo com
intenção de votar em Bolsonaro é também o que mais lê notícias pelo
WhatsApp (57%) e Facebook (61%), segundo a pesquisa.
As redes sociais têm grande penetração no Brasil. Na última
divulgação, o WhatsApp afirmou ter mais de 120 milhões de usuários no
país. Em julho, o Facebook informou em eventos com
jornalistas ter alcançado 127 milhões de pessoas. As eleições deste
ano terão 147 milhões de brasileiros aptos a votarem.
TSE
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já registrou neste primeiro turno 25 processos envolvendo as chamadas notícias falsas (ou fake news, no termo popularizado em inglês). O levantamento foi realizado a pedido da Agência Brasil.
A primeira decisão foi tomada no dia 7 de junho. Em resposta a ação
movida pelo partido Rede, o tribunal determinou a retirada do ar de
conteúdos publicados na página de Facebook “Partido Anti-PT”, acusando a
candidata Marina Silva de envolvimento em casos de corrupção.
No dia 5 de setembro, o ministro Carlos Horbach determinou ao
Facebook a retirada de mensagens falsas envolvendo o candidato Jair
Bolsonaro (PSL). Nelas, o político aparecia dizendo que não precisava do
voto de eleitores do Nordeste. A medida foi tomada com base na
Resolução 23.551/2017, que proíbe veiculação de “fato sabidamente
inverídico”.
Ontem (4), o TSE deu decisão favorável à candidatura de Fernando
Haddad (PT) ordenando a remoção de vídeos de perfis no Facebook que
atribuíam ao candidato a distribuição de mamadeiras com bicos em forma
de órgãos genitais. “A publicação tem a clara intenção de desvirtuar as
concepções do candidato representante, disseminando informações
manifestamente inverídicas sobre sua atuação perante as creches”,
afirmou o ministro relator, Sérgio Banhos.
O tribunal anunciou ao longo do primeiro semestre um conjunto de
ações, como a criação de um conselho consultivo sobre o tema, a
realização de um seminário internacional em junho, e a celebração de
termos de compromisso para adoção de medidas contra essa prática com
partidos políticos e com a associação de profissionais de marketing
político. No caso do Conselho Consultivo, contudo, a última reunião foi
em junho. Questionada pela Agência Brasil, a assessoria do órgão informou que o próximo encontro do grupo tem previsão para o dia 10 de outubro.
Legislação
O Código Eleitoral (Lei 4.737/1965) lista como crime com pena de 2
meses a 1 ano “divulgar, na propaganda, fatos que sabe inverídicos, em
relação a partidos ou candidatos e capazes de exercerem influência
perante o eleitorado”. Também são condutas criminosas, com penas
variáveis, caluniar, difamar e injuriar alguém em propaganda eleitoral.
A Lei 9.504/1997 (conhecida como minirreforma eleitoral) definiu como
crime com punição de 2 a 4 anos “a contratação direta ou indireta de
grupo de pessoas com a finalidade específica de emitir mensagens ou
comentários na internet para ofender a honra ou denegrir a imagem de
candidato, partido ou coligação”.
A Resolução 23.551 regulamentou diversos aspectos do pleito eleitoral
deste ano, incluindo a propaganda de candidatos. A medida prevê a livre
manifestação do eleitor, mas admite a possibilidade de limitação quando
“ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente
inverídicos”.
Agência Brasil
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