Delegados de polícia são presos nesta quinta-feira por sequestrar traficantes
A
corregedoria da Polícia Civil prendeu dois delegados em operação nesta
quinta-feira (18) na Baixada Fluminense. Cinco inspetores também foram
presos.
Os agentes foram denunciados pelo Ministério Público por
formação de quadrilha, extorsão mediante sequestro, roubo qualificado,
concussão (exibir vantagem financeira indevida) e constrangimento
ilegal. Eles se autointitulavam “Bonde dos Coroas”. São eles:
Leonardo Guimarães de Godoy Garcia Grivot, delegado assistente
Matheus de Almeida Romanelli Lopes, delegado titular
Leonardo Ferreira Amaral, inspetor
Paulo da Silva Carvalho, inspetor
Cosme de Araújo Conceição, inspetor
Sérgio Bezerra de Andrade, inspetor
Carlos Alberto Falcão, inspetor
A
polícia também busca cumprir mandados de busca e apreensão nos armários
pessoais de três dos denunciados, na sede da 53ª DP, e nos armários de
Leonardo Grivot e Leonardo Amaral na 52ª DP (Nova Iguaçu), para onde os
policiais foram deslocados.
“Cumpre destacar que a organização
criminosa foi estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de
tarefas, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem
patrimonial, mediante a prática de diversos crimes, principalmente os
crimes de extorsão, concussão, prevaricação, ameaças, entre outros”,
lê-se num trecho da denúncia, assinada pela promotora Elisa Pitarro.
O
grupo, de acordo com escutas, pediu R$ 50 mil para liberar um
traficante em 2017, após tê-lo tirado à força de sua casa e o liberado
após sua família ter pago R$ 10 mil. A sede da delegacia foi usada para
extorsões e outras negociações criminosas, como impedir a prisão de um
contrabandista de cigarros que estava atuando na região.
O grupo
teria agido através de ameaças e tentando atrapalhar investigações sobre
os crimes cometidos dentro da própria delegacia.
O delegado
titular Matheus Romanelli, segundo o documento, atuava “executando
delitos em coautoria com os demais denunciados, retardando procedimentos
investigatórios e sindicâncias instauradas para apurar irregularidades
cometidas pelos denunciados e se omitindo de agir de forma consciente e
dolosa enquanto uma série de crimes era cometidos no interior da 53ª DP
pelos denunciados.”
Sequestro e pagamento
Segundo a
promotora Elisa Pitarro, da 11ª Promotoria de Investigação Penal,
responsável pela denúncia, a investigação começou quando uma escuta
telefônica para a investigação de outro crime revelou o sequestro e
pedido de resgate do traficante Carlos Vinícius Lima de Araújo, o
Orelha, que tinha mandado de prisão em aberto na época.
“Os
policiais invadiram a sua casa, roubaram seus pertences e o levaram para
delegacia, passando a exigir dinheiro de seus familiares para ele ser
libertado. O primeiro valor cobrado foi R$ 53 mil, coincidindo com o
número da delegacia”, explicou a promotora.
Na noite do dia 31 de
maio de 2017, Leonardo Amaral, Paulo da Silva Carvalho e Sérgio Bezerra
de Andrade invadiram a casa de Orelha e o levaram para a sede da
delegacia. O inspetor Leonardo Amaral, então chefe do Grupo de
Investigação Complementar (GIC) da delegacia, disse para o traficante:
”
Não quero te levar preso, meu bagulho é dinheiro, só quero dinheiro,
quero cinquenta mil, quando o dinheiro chegar na minha mão eu vou te
soltar”.
O grupo, enquanto falava com a mãe e a esposa de Carlos
Vinícius, chegou a sair da delegacia com o preso e circular de carro com
ele, com medo que alguém percebesse a movimentação na unidade policial.
Ao voltarem, Leonardo Amaral manteve contato com a família:
“Alô,
fala… Mas, e aí? O papo já foi dado… O que vocês querem fazer? E como é
que vai fazer? Como é que você vai fazer? Não. Não. Não… Pelo menos, a
metade. Pelo Menos metade. Olha só, são 3h15. Você tem até 4h. Pelo
menos, dobra. Se não dobrar, já sabe… Estou aguardando seu contato.”
A
família do traficante conseguiu apenas R$ 10 mil, entregues na
delegacia. Os policiais, no entanto, exigiram que ele entregasse parte
do dinheiro depois, como contado em depoimento pelo próprio Orelha após
ter sido preso pela Corregedoria da Polícia Civil em outubro de 2017:
“Que
o policial respondia que teria que pagar tudo, pois iria caçá-lo no
Chapadão ou em qualquer outro lugar e sempre ameaçava sua família; que,
diante das ameaças, sua família jogou fora todos os telefones e chips de
operadora de telefonia, como forma de extinguir a relação com os
policiais; que sua mãe se viu obrigada a sair de casa e alugar imóvel em
outro lugar para não sofrer represálias”.
Negociação
Em
outro trecho filmado com ajuda de um colaborador, este conversa com
Grivot a respeito de um amigo que estaria atuando na área de Mesquita
com a venda ilegal de cigarros. Ele diz ao delegado Grivot que o amigo
estava muito preocupado, pois havia sido parado pela viatura.
Grivot: “Abordaram?”
Colaborador:
“Abordaram. Ele está com medo de futuramente tomar um bimba. Ele já
está há um tempinho sem coisar… Aí, ele: Pô, não conheço ninguém, não
conheço ninguém…” Porque, na verdade, todo mundo é de Campo Grande, mas
não é nada da firma, não. Não é nada de MILÍCIA, não… Ele bota o
cigarrinho dele, mas falou: “Pô…estou com medo de botar e tomar um
bimba…” Aí, eu falei com ele: “Vou ver se tenho algum conhecido.”
Grivot
pergunta se o colaborador havia comentado com mais alguém sobre o
motivo da ida à delegacia. O colaborador responde que não.
Colaborador:
“Não, vim direto. Eu vim outro dia, perguntar de você, mas disseram que
você só estaria hoje, quarta-feira… Aí, eu vim direto falar contigo…
Aí, o moleque é só cigarro. O moleque só entrega cigarro aqui na área.
Aí, eu queria ver a melhor forma, se tem como deixar para lá”.
Grivot: “Tá. Eu Vou trazer um policial aqui, para conversar com a gente…”
Em
seguida, Amaral é levado para a sala. Os três conversam um pouco.
Grivot recomenda ao colaborador que converse com o chefe do GIC da
delegacia.
Grivot: “Oh, esse aqui é amigo meu e da minha maior confiança…”
Colaborador: “Satisfação”.
Grivot: “Pode ser bem direto com ele. Está certo?”
Segundo
o Ministério Público, não foi possível saber se houve o pedido para
liberar o contrabandista de cigarros foi aceito pelos policiais da
delegacia.
G1
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