Alta no preço do botijão faz pobres trocarem gás por lenha: “Fogão faz falta”
Maria Lúcia da Silva e Weverton dos Santos vivem com os dois filhos em favela em Maceió; ao lado, a grelha improvisada
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No barraco onde vive o casal Maria Lúcia
da Silva, 50, e Weverton dos Santos, 30, o botijão de gás vazio está
guardado debaixo da cama.
A pequena moradia tem um vão só, onde se espremem sofá, eletrodomésticos e as duas camas, onde o casal dorme com os dois filhos.
Em cima do antigo fogão, não há nada a
não ser poeira. Para cozinhar, a família improvisou dois tijolos e uma
grelha. O fogo vem da madeira velha – ou de restos dela – que Santos
consegue catar na rua.
Há mais de um mês, os dois, que vivem na
favela Sururu de Capote, na periferia de Maceió, não conseguem comprar
um botijão de gás por conta do preço alto. Na região, não sai por menos
de R$ 70.
“E já mandaram avisar que vai subir para
R$ 80. Eu não tenho opção: ou compro o gás, ou a comida”, conta Santos,
que é catador de latinhas e não tem renda mensal fixa.
O último reajuste da Petrobras ocorreu no dia 4, quando foi anunciada uma alta de 4,5% no preço no botijão de 13 kg. Desde junho, quando a estatal mudou a forma de políticas de preço, foram cinco aumentos, que somaram 54% de alta.
Sem esgoto, sem tijolo e agora sem gás
A favela Sururu de Capote reúne
pescadores às margens da lagoa Mundaú e é marcada pela miséria: sem
esgoto, com energia elétrica improvisada e barracos normalmente feitos
de papelão, madeira ou lona. Poucas moradias são de tijolos, visto que a
área é invadida.
Nesse cenário, o reajuste do botijão de
gás excluiu do consumo dezenas de famílias, que hoje catam madeira para
usar como lenha. “É difícil demais, um sofrimento grande. Um fogão faz
falta. Mas não temos o que fazer a não ser se apegar a Deus para ver se a
vida melhora”, relata Maria Lúcia.
Ela conta que até o meio do ano ainda
conseguia comprar um botijão a cada três meses pelo menos. O fogo a
lenha era usado, mas apenas quando o botijão acabava e o dinheiro estava
curto. “Comprava botijão a R$ 45, R$ 50 antes; agora, a R$ 70 e R$ 80,
não podemos mais pagar”, diz.
Renilza de Araújo, marisqueira
Em vários barracos da comunidade visitados pelo UOL a
situação é semelhante. “Quem me dera eu ter R$ 80 para comprar um
botijão. Isso é metade da minha renda. Estou esperando meu gás acabar
para aposentar o fogão de vez. Não tenho mais condições de comprar”,
relata a marisqueira Renilza de Araújo, 42.
Com uma renda de aproximadamente R$ 150
por mês e sem receber benefícios do governo federal –como o Bolsa
Família– há um ano, ela conta que a situação da comunidade ficou tão
difícil que até madeira está faltando. “Nem sempre a gente acha lenha.
Todo mundo está pegando. Tem gente que tira do mangue madeira verde.
Usam também pó de serra”, diz.
Na casa de Maria Ferreira dos Santos,
45, o gás do botijão está sendo racionado ao máximo. “Eu uso o fogão só
para esquentar uma coisa, cozinhar algo rápido. Para fazer feijão, coisa
que demora mais, já estou usado lenha. E não vou conseguir comprar mais
botijão daqui para a frente”, conta a beneficiária do Bolsa Família,
que recebe R$ 164 por mês e mora na favela com as duas netas.
Procurado pela reportagem, o Sindigás
(Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de
Petróleo) disse que não iria dar entrevistas sobre reajuste de preço nem
sobre uso de lenha causado pela alta dos preços.
Segundo a entidade, existem hoje 99
milhões de botijões em circulação em todo o país. Por dia 1,5 milhão de
botijões são adquiridos pelos consumidores.
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