sábado, 29 de julho de 2017

'Servidor fantasma'

Justiça mantém condenação de ex-vereador do município de Sousa, na Paraíba 

O ex-vereador do Município de Sousa, Nedimar de Paiva Gadelha Júnior, teve a condenação pelo crime de Peculato (artigo 312 do Código Penal) mantida pela Câmara Criminal na tarde desta quinta-feira (27), ao passo que o então presidente da Câmara de Vereadores local, Eduardo Medeiros Silva, foi absolvido do crime de Uso de Documento Falso, previsto no artigo 304 do CP. O relator da Apelação Criminal (0002691-25.2015.815.0371) foi o desembargador Márcio Murilo da Cunha Ramos.
Nedimar de Paiva Gadelha Júnior, primeiro denunciado, foi acusado de ter nomeado seu primo Marcos Antônio de Paiva Gadelha no cargo de assessor especial, sem que o último soubesse. Em tese, o vereador recebeu os salários do “servidor fantasma”, referentes aos anos de 2011, 2012 e 2013.
Já o segundo denunciado, Eduardo Medeiros da Silva, teria feito uso de documentos falsos, quando encaminhou para o Ministério Público recibos, com assinaturas falsas, que não guardavam semelhança com a do assessor nomeado.
De acordo com os autos, no dia 10 de setembro de 2013, foi feita uma inspeção in loco na Câmara dos vereadores, onde foi requisitada a apresentação dos documentos e não foram encontrados registros que comprovassem o tempo de posse de qualquer funcionário, nem recibos de entrega dos cheques nominais expedidos a favor de Marcos Antônio, referentes à remuneração recebida nos anos de 2011, 2012 e 2013, “por se encontrarem com o serviço de contabilidade”, que funciona em escritório particular.
Testemunhas afirmaram, no entanto, que os pagamentos devidos a Marcos Antônio eram entregues diretamente a Nedimar, sem que ele tivesse procuração outorgada para fazê-lo.
Diante dos fatos, foi ajuizada Ação de Improbidade Administrativa (0001537-06.2014.815.0371), e determinado o afastamento cautelar dos acusados de suas funções.
No dia 11 de setembro, foram encaminhados pela Presidência da Câmara cópias dos demonstrativos de pagamento e recibos dos mencionados cheques, que estavam em branco. Posteriormente, o presidente da Casa Legislativa Municipal (segundo denunciado) apresentou, pessoalmente, à Promotoria de Justiça de Sousa, novos recibos, com assinaturas que não se assemelhavam com a de Marcos Antônio, colhidas durante as audiências realizadas na Promotoria.
O próprio Marcos Antônio negou ter assinado aqueles documentos e forneceu material para exame grafotécnico que, conforme laudo, não o reconheceu como autor das assinaturas.
Quando requisitados às instituições financeiras os dados cadastrais dos titulares das contas onde os valores de tais cheques foram creditados, constatou-se que, em nenhuma delas, o beneficiado foi Marcos Antônio.
Recurso do primeiro denunciado
No recurso, Nedimar de Paiva Gadelha Júnior nega a autoria do delito ao qual foi condenado, afirmando que, em nenhum momento se apropriou de quaisquer valores devidos a Marcos Antônio. Também aduz que não há provas que demonstrem a acusação; que não ficou evidenciado qualquer apropriação de dinheiro público em razão do seu cargo; que não está presente o dolo e que não restou comprovado o proveito próprio ou alheio. Pretendeu, no recurso, absolvição por ausência de provas.
Também sustenta ausência de fundamentação para aplicação da perda de cargo e de inabilitação para o exercício de função pública, pedindo, assim, afastamento da penalidade.
O relator afirmou que, segundo os autos, a nomeação para o cargo se deu sem que o nomeado tivesse conhecimento e que o mesmo, em momento algum, tomou posse no cargo. Também restou apurado que Marcos Antônio não prestou serviços à Câmara, havendo prova pericial comprovando que as assinaturas em alguns contracheques não são dele, além de prova testemunhal que o mesmo jamais recebeu salário junto à Câmara.
Para o relator, as provas confirmam o recebimento da remuneração referente ao cargo pelo próprio Nedimar. Também ficou comprovado que o vereador passou a propor a Marcos Antônio que assinasse uma procuração com data retroativa, na qual o autorizaria a receber os salários do cargo de assessor, conforme comprovado em fase de instrução.
O desembargador Márcio concluiu que a conduta do réu Nedimar de Paiva Gadelha Júnior está descrita no artigo 312 do Código Penal, já que, após nomear um terceiro para um cargo em comissão vinculado ao seu gabinete, “passou a receber os valores pertinentes a sua remuneração como se seu fosse, prevalecendo-se do cargo que ocupava para ter acesso aos cheques, conduta que, evidentemente, causou prejuízo à Administração Pública, bem como violou o princípio da moralidade administrativa”.
Desta forma, manteve a condenação,com pena de cinco anos e nove meses de prisão, a ser cumprida em regime inicialmente semi-aberto. Também manteve a pena de 140 dias-multa, à fração de 1/5 (um quinto) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Sobre a perda do cargo público, o relator argumentou: “O crime foi perpetrado com abuso do poder público, aproveitando-se, o condenado, da liberdade no controle de assessores e subalternos para praticar o desvio de verbas públicas”, o que prova que a sentença foi devidamente fundamentada.
Recurso do segundo denunciado
Já Eduardo Medeiros, então presidente da Câmara de Vereadores de Sousa, alegou atipicidade da conduta por vários motivos, entre eles, ausência de proveito, já que encaminhou documentos que estavam nos arquivos da Câmara Municipal, não havendo como auferir vantagens na entrega de documentos falsificados, e que, na condição de presidente, não podia recusar, retardar ou omitir a solicitação feita pelo Ministério Público.
Também argumenta que houve ausência de dolo e excesso de dosimetria da pena, visto que foi condenado, em sede de 1º grau, a uma pena de quatro anos e dois meses de reclusão.
O relator absolveu o segundo réu, por entender que não houve utilização do documento falso, mas sim, a entrega dos documentos por requerimento do Ministério Público. “Não há nos autos qualquer elemento que demonstre a real utilização de algum documento falso perante terceiros por parte do apelante”, explicou o desembargador Márcio.
O magistrado considerou, ainda, que, conforme instrução processual, os documentos não foram produzidos para serem apresentados ao órgão ministerial, mas vinham sendo guardados no acervo da Edilidade mês a mês, como afirmou o tesoureiro em seu depoimento.
“Não havendo comprovação da materialidade do crime de uso de documento falso, já que a conduta narrada na denúncia não se amolda ao crime, impõe-se a reforma da sentença para reconhecer a atipicidade da conduta e absolver o réu”.
MaisPB

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