domingo, 18 de dezembro de 2016

Gastos públicos

Estados brasileiros levarão pelo menos cinco anos para equilibrar contas públicas

Mesmo que os estados brasileiros sejam submetidos a um regime de teto de gastos públicos semelhante ao que foi aprovado para a União, eles terão de conviver com uma crise fiscal por pelo menos mais cinco anos, tempo necessário para que as medidas revertam gradualmente o desequilíbrio e os governos voltem a fazer superávit primário (a economia para pagar os juros da dívida) em níveis sustentáveis. Essa é a conclusão de estudo realizado pelo economista Pedro Schneider, do Banco Itaú.
Para os casos mais críticos, como o do Rio de Janeiro, para se chegar a esse resultado são necessárias medidas adicionais, que amenizem os problemas de caixa a curto prazo. Do contrário, mesmo sob o efeito do teto de gastos, nas contas do banco a dívida consolidada do estado subiria de 200% da receita em 2016 para 230% em 2018. Ou de 15% do PIB estadual para 18%.
— Mantida essa perspectiva, o Estado do Rio continuaria convivendo com atrasos no pagamentos de salários, aposentadorias e a fornecedores, que trazem efeitos negativos para a recuperação da economia — avalia Schneider.
CÂMARA TENTARÁ VOTAR SOCORRO
Como medida adicional a ser implementada, o economista cita o Regime de Recuperação Fiscal aprovado na quarta-feira pelo Senado, que prevê a suspensão por três anos dos encargos da dívida pelos estados em dificuldades financeiras em troca de algumas contrapartidas, como elevação da contribuição previdenciária dos servidores e redução de incentivos tributários, transferência de ativos para privatizações, entre outras.
A Câmara decidiu marcar sessões para segunda-feira e terça-feira para tentar votar o projeto de ajuda financeira aos estados, já que o recesso fora antecipado para ontem após a aprovação do Orçamento pelo Congresso. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), recebeu apelo de parlamentares de estados endividados, em especial o Rio de Janeiro. Maia admitiu ontem que será difícil conseguir atingir consenso até segunda-feira sobre a proposta e um quórum suficientes em plenário para realizar a votação. Na quinta-feira, a Câmara tentou, mas não conseguiu votar a renegociação das dívidas dos estados justamente pela falta de acordo.
Como os estados não foram incluídos na emenda constitucional, já aprovada pelo Congresso, que fixou um teto de gastos para a União, uma solução, segundo Schneider, do Itaú, seria incluir a medida como contrapartida no projeto de renegociação de dívidas dos estados.
— Como o teto é um ajuste forte, mas gradual, leva tempo para fazer efeito e o endividamento continua crescendo. Quando você sai de um déficit elevado, como é o caso do Rio, até ele zerar, estabilizar e voltar a níveis sustentáveis, ele continua subindo. O ponto de partida do endividamento do Rio já é desconfortável, então você precisa acelerar esse efeito do teto de gastos com as contrapartidas exigidas pelo regime de recuperação fiscal — diz Schneider.
Economistas também defendem que o estabelecimento de um teto de gastos só surtiria efeito combinado com reformas da previdência dos estados. Sem a reforma, aponta o Itaú, a despesa com pessoal, que em 2016 equivale a 60% do total do gasto primário dos estados, corresponderia a 70% dos gastos em 2022 e a 80% em 2025.
— Um teto é algo muito bom. Cria uma regra fiscal que limita o crescimento do gasto público. É bom para ambiente de negócios, para a recuperação da economia, porque sinaliza que algo está sendo feito para contornar a crise. Mas não é solução sozinho, porque, se deixar as despesas que compõem o gasto total soltas, esse teto não vai funcionar para nada. A lógica é a mesma do governo federal, é preciso partir de uma reforma previdenciária pesada e dura, porque a despesa maior é com previdência e folha de pagamento — diz Margarida Gutierrez, economista da UFRJ.
No caso do Rio, Margarida diz que os atrasos de pagamentos a servidores, aposentados e fornecedores agravam a relação com os agentes econômicos. Segundo a economista, o governo estadual não tem demonstrado comprometimento em resolver este que, ao seu ver, é o problema mais grave:
— Esses atrasos deveriam ser evitados porque paralisam. É dinheiro que deixa de ser injetado na economia e as pessoas perdem confiança em fazer negócios com o estado. Imagina um fornecedor de merenda escolar. Ao fornecer para o Rio ele já põe na conta que vai ter pagamento atrasado, então sobe o preço.
Para o especialista em contas públicas Raul Velloso, a situação dos estados põe em risco o futuro dos investimentos:
— Serão anos de investimento zero. As comunidades também correm risco de ficar sem os serviços públicos. Não lembro de outro período da história em que os estados tenham amargado crise como essa.
Segundo Schneider, sem o teto de gastos para os estados, o endividamento deles continuará subindo, o que no futuro poderá exigir um socorro mais significativo da União e um aumento da dívida pública como um todo.
O Globo

Nenhum comentário:

Postar um comentário