Índia com ensino superior que quebra tabu e é eleita vereadora
A
série de reportagens apresentando fenômenos eleitorais nas eleições
municipais deste ano na região Nordeste realizada pelo blog do Magno
Martins, de Pernambuco, em parceria com o Portal MaisPB, mostra,
nesta segunda-feira (12), Edilene Bezerra Pajeú, ou simplesmente
Pretinha Truká, 41 anos, eleita vereadora em Cabrobó, Sertão
pernambucano.
Da tribo Truká para a Câmara
CABROBÓ (PE) – Forjada
na luta pelos direitos indígenas, professora com grau de instrução
superior, mais forte e destemida voz que ecoa no Sertão em pernambucano
em defesa uma raça sofrida e abandonada, a tribo dos Truká, na ilha de
Assunção em Cabrobó, Edilene Bezerra Pajeú, ou simplesmente Pretinha
Truká, 41 anos, escreve uma nova página na história política indígena do
País. É a primeira autêntica e legítima representante da nação Truká
eleita vereadora com 780 votos pelo Partido Verde.
Corpo franzino,
estatura baixa, solteira, dois filhos, nascida e criada vendo seus pais
enfrentar os poderosos na defesa de suas terras, alvo de muitas
contendas, sendo a principal delas a invasão pela União para construção
da principal tomada do projeto de Transposição das águas do São
Francisco, Pretinha Truká passa a suceder na Câmara o vereador Neguinho
Truká, que está encerrando o seu segundo mandato na Câmara de Cabrobó.
Com ela, os 4,2 mil índios da sua tribo continuarão a ter suas bandeiras
representadas no parlamento.
Ao ser convocada para disputar as
eleições, que não estava em seu projeto de vida, pautado na educação da
sua tribo, Pretinha só aceitou porque sua escolha se deu pela vontade
unânime dos mais legítimos representantes da aldeia: os caciques
Bertinho e Neguinho e a cacique Ana Cleide. “Ela foi escolhida pela sua
história, seu perfil e sua liderança”, assinala o cacique Neguinho
Truká.
Depois de Cabrobó eleger o primeiro índio parlamentar em
2008, respaldado por 1.034 votos, os Trukás passaram a ter mais força
para conquistar políticas públicas em todas as áreas, principalmente na
agricultura familiar, na educação e na regularização de suas terras.
“Sei que o desafio é grande, mas já estou curtida em grandes batalhas em
defesa de nossa gente”, afirma Pretinha, referindo-se ao trabalho de
Neguinho que lhe servirá de referência.
Preparada, politizada e
sem papas na língua, Pretinha já ecoou a sua voz até na ONU – a
Organização das Nações Unidas. Em 2004, selecionada pela Comissão de
Professores Indígenas de Pernambuco (Copipe), esteve ali na condição de
primeira mulher indígena do Brasil expondo a violência sofrida por
índios da sua tribo depois de um curso preparatório na Espanha
em Direitos Humanos. “Foi uma experiência fantástica e nosso caso, um
índio barbaramente assassinado em nossa aldeia, ganhou repercussão
internacional”, diz, orgulhosa.

A
mais nova representante dos Trukás no parlamento de Cabrobó tem 16 anos
de batente em bancos escolares. Professora do ensino fundamental em sua
aldeia, ela coordena, hoje, seis das 12 escolas indígenas do município,
que têm 121 professores e 1.010 alunos. Dos 780 votos obtidos, metade
saiu da comunidade indígena. “O trabalho dela é fenomenal e nos orgulha
muito”, afirma o prefeito eleito Marcílio Cavalcanti (PMDB), que teve
expressiva votação na comunidade indígena graças ao apoio de suas
principais lideranças, entre as quais a própria Pretinha e o cacique
Neguinho.
Guerreira, Pretinha mobilizou, recentemente, povos
indígenas de 11 das 12 etnias que existem no Estado para acampar na
Secretaria Estadual de Educação. Segundo Pretinha ela, ali estavam cerca
de 900 índios. A pauta de reivindicações foi extensa, mas o foco
principal estava nas questões educacionais, como a criação do cargo de
professor indígena, concurso público e melhoria na estrutura física das
escolas indígenas. Pernambuco tem cerca de 10 mil alunos nas 12 aldeias,
com aproximadamente mil docentes. “O governador assumiu o compromisso
de nos receber assim que assumiu o Estado. Já está na metade do segundo
ano de gestão e nunca abriu as portas para sentarmos com ele e
conversarmos”, desabafou Pretinha, que levou barracas, comida e material
de cozinha.
A representação indígena nas câmaras municipais no
Nordeste não se restringe a Pernambuco. No Ceará, o advogado Weibe
Tapeba (PT) foi eleito vereador em Caucaia. É o único do PT no
município. Em Monsenhor Tabosa, Vicentinho Potyguara (PCdoB) foi não
somente reeleito, mas o mais votado, ao lado do tucano Kaio Souto, neto
do ex-prefeito e pecuarista José Souto. Os Potiguara estão presentes
também na Paraíba e constituem a etnia mais numerosa do Nordeste.
Os
Tapeba estão restritos ao Ceará, na região de Fortaleza. No século 19, o
Estado chegou a declarar que não tinha mais indígenas. Em Pesqueira, o
presidente da Câmara – Sil Xukuru (PTB) – foi o vereador mais votado. Os
Xukuru vivem na cidade e na Serra de Ororubá. Em Fernando Falcão (MA),
vários candidatos Canela tentaram a Câmara. Mas somente Raul Canela
(PSDB) conseguiu. Três Pankararu tentaram em Tacaratu (PE). Quem chegou
lá foi Celo Pankararu (PV).
Gerson Pataxó (PT) foi o segundo mais
votado em Pau Brasil, na Bahia. O PT também elegeu Cacique Flavio, do
povo Kaimbém, em Euclides da Cunha. Cacique Aruã (PCdoB) passou raspando
em Santa Cruz Cabrália, mas não entrou – embora tenha tido mais votos
que três entre os eleitos. Porto Seguro elegeu o Cacique Renivaldo, mais
um da etnia Pataxó. É um dos poucos que não aparecem na lista de
candidatos indígenas.
MaisPB
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