Deputada entra em ‘fogo cruzado’ por pedir inquérito contra Sheherazade e suspensão de verba publicitária do SBT
Parlamentar está sendo acusada de tentar promover a censura
A deputada Jandira
Feghali (PCdoB-RJ) está sob fogo cruzado desde que pediu a suspensão da
verba publicitária federal do SBT e a abertura de inquérito contra a
apresentadora Rachel Sheherazade e a emissora por incitação ao crime.
Nas últimas semanas, a líder do PCdoB na Câmara virou alvo de milhares
de comentários nas redes sociais, alguns bastante virulentos, que apoiam
a jornalista e acusam a parlamentar de tentar promover censura.
Em entrevista ao Congresso em Foco, Jandira diz que o que está em
questão não é o direito de Rachel Sheherazade fazer comentários na TV,
mas a impossibilidade de uma empresa, que explora uma concessão pública,
continuar recebendo verba publicitária mesmo após ter cometido um
crime. Só em 2012, o SBT recebeu R$ 153 milhões do governo federal. O
objetivo da ação, segundo ela, é que a eventual punição ao SBT sirva de
exemplo para outras redes.
“Não estamos provocando a Rachel Sheherazade, é o SBT que está em
questão. Não é uma questão dela especificamente, mas dela vinculada ao
canal. A gente espera que isso sirva de parâmetro para outras TVs”,
afirma. “A emissora vai ter de assumir”, acrescenta.
“Ação orquestrada”
A deputada afirma que não se sente intimidada com as críticas que passou
a receber desde que denunciou Rachel Sheherazade e o SBT em razão dos
comentários feitos por ela em defesa de um grupo de pessoas que
espancou, tirou a roupa e acorrentou ao poste um adolescente acusado de
furto no Rio. Ela vincula os ataques à realização da marcha de setores
da direita que pede a volta dos militares ao poder, que será realizada
neste sábado.
Jandira acredita que há uma “ação orquestrada” na internet contra
defensores dos direitos humanos. Na opinião dela, a proliferação de
comentários contrários à sua iniciativa não é espontânea, nem se deve
apenas às pessoas que concordam com a apresentadora.
“Nós mesmos apagamos uma das mensagens, que era de muito baixo nível. A
pessoa respondeu: ‘Não adianta me apagar, pois tenho 200 perfis fakes,
meu IP está na Holanda. Não vão me identificar’. Ou seja, há uma ação
orquestrada. Agora mesmo vão fazer uma marcha em São Paulo, orquestram
fakes, tem muito texto igual, as agressões são muito parecidas”, conta a
deputada.
Pauta da mídia
A líder do PCdoB na Câmara também anuncia que vai propor a votação de
uma “pauta da mídia”, que contemple desde a regionalização da
programação até a redefinição de critérios para a distribuição da verba
publicitária, passando pela regulamentação do direito de resposta.
“Alguém tem de enfrentar a grande mídia naquilo que é prejudicial à
sociedade. Uma coisa é a opinião. Outra coisa é incitar à ação
criminosa.”
Jandira Feghali trabalha em duas frentes contra o SBT. Além do ofício
enviado diretamente à Secom, no dia 20 de fevereiro, ela também
apresentou um requerimento à Procuradoria-Geral da República (PGR) em
que pede a abertura de inquérito contra a TV e Rachel Sheherazade e o
corte da verba enquanto durarem as investigações. Como mostrou o
Congresso em Foco, em caso de condenação, Jandira solicita que o SBT
perca até o direito à concessão pública. Caberá ao procurador-geral,
Rodrigo Janot, dar andamento ou não aos pedidos. “Acho mais fácil
tirarem a Rachel do ar do que cassar a concessão”, diz Jandira.
Procurados pela reportagem ainda na última terça-feira (18), a
apresentadora, o SBT e a Secretaria de Comunicação da Presidência da
República não se manifestaram sobre o assunto.
Leia a íntegra da entrevista da deputada:
Como surgiu a ideia de pedir a
suspensão da verba publicitária do SBT?
Quando eu presidia a Comissão de Cultura, uma das
pautas que tratamos com a então ministra da Secretaria de Comunicação,
Helena Chagas, foi sobre a distribuição de verbas publicitárias do
governo. Para nós, é óbvio que a verba publicitária não pode subsidiar
canais de comunicação que pregam preconceito e violam os direitos
humanos. A ministra disse que, se tivéssemos alguma denúncia, ela
interromperia a verba. Como o governo pode subsidiar um canal que tem
uma editorialista que incita à violência e à justiça com as próprias
mãos? Logo após o comentário da Rachel Sheherazade, apresentamos um
ofício na Secretaria de Comunicação na Presidência da República, pedindo
a suspensão da verba para o SBT. Mas fomos orientados de que seria
importante que o próprio Ministério Público abrisse um processo penal
para reforçar a provocação ao Executivo, no caso, a Secom. Com isso,
teríamos um caminho próprio. A Secom me deu primeiro retorno de
conteúdo, dizendo que concorda com o pedido, mas que está estudando que
providências tomar.
Quais os procedimentos agora?
A entrada da PGR acelera a solução no Executivo. Estou para fazer uma
visitar ao procurador-geral, aguardo uma audiência com ele [Rodrigo
Janot]. Alguém tem de enfrentar a grande mídia naquilo que é prejudicial
à sociedade. Uma coisa é a opinião. Outra coisa é incitar à ação
criminosa. Como o SBT tem muita audiência, isso impacta a própria guerra
num terreno livre que é o da internet. Como é livre, é de todas as
opiniões, concordando-se ou não.
Impressionou a senhora a repercussão ao seu pedido nas redes sociais?
O que chama a atenção é a agressividade com que isso ocorre. Quem se
confronta conosco, geralmente, vem com um nível de agressividade muito
grande, reafirmando a posição de “mata mesmo, agride mesmo”. Uma coisa
muito odiosa, preconceituosa, agressiva.
Por que isso ocorre?
Nós mesmos apagamos uma das mensagens, que era de muito baixo nível. A
pessoa respondeu: “Não adianta me apagar, pois tenho 200 perfis fakes,
meu IP está na Holanda. Não vão me identificar”. Ou seja, há uma ação
orquestrada. Agora mesmo vão fazer uma marcha em São Paulo, orquestram
fakes, tem muito texto igual, as agressões são muito parecidas. Alguém
que fale em IP não é povão, tem conhecimento de tecnologia, comunicação.
Tem ações que se multiplicam mesmo não sendo majoritárias. Essa
violência que está nas ruas se reflete na comunicação. Há um grande
preconceito.
Mas há muita gente que se identifica com os comentários dela por não
acreditar mais no Estado…
Tem quem se identifique com ela. Fui testemunha, no Carnaval, de um
espancamento num bloco no Rio. De repente, gritaram “pega ladrão”. Aí
três caras enormes espancaram um moleque mulato, que caiu desmaiado.
Quebraram dedo da mão dele. Tive de atendê-lo na hora, como médica que
sou. Eles também queriam deixá-lo nu e amarrá-lo num poste. O que esse
tipo de programa e afirmação dela defendem pega em alguns segmentos que
se sentem legitimados para agir dessa forma. Isso é barbárie.
Mas não há também uma descrença das pessoas no Estado?
Tudo bem que as pessoas tenham desconfiança da polícia, não aguentem
mais a impunidade. Mas quem tem poder de julgar? Não pode ser um
segmento da sociedade. Deviam pegar o moleque que estava roubando e
entregá-lo para a polícia. Mas o gosto era de matar mesmo. Isso é
terrível.
Na internet, há quem diga que a representação que a senhora move
representa uma censura e que Rachel Sheherazade manifestou apenas o que
eles também pensam…
Temos de enfrentar o debate sem nenhuma conivência com o crime, com quem
rouba ou assassina. Mas é preciso compreender que as heterogeneidades
sociais estão por trás disso. Os espancados, muitas vezes, não são
bandidos profissionais, mas um garoto novo que não tem conhecimento. Um
menino que rouba um celular, e não um que cometeu estupro. Não podemos
ser coniventes com nenhum dos crimes. O único poder capaz de julgar a
proporcionalidade da punição é a Justiça, que dá direito de defesa.
Temos de defender o Estado democrático de direito.
O que representará uma eventual punição ao SBT nesse caso?
É uma simbologia para outras TVs não reproduzirem essa atitude. É
garantir que as instituições funcionem. Há projetos que queremos puxar
para a pauta do Congresso, como a redistribuição da verba publicitária, o
direito de resposta, a regionalização da comunicação, a chamada lei das
antenas. Tem uma pauta da comunicação que a gente precisa dar curso
para garantir maior acesso da população e fortalecer uma mídia que nos
permita um debate mais aberto.
Quais os próximos passos do pedido feito na Secom e da representação na
PGR contra Rachel e o SBT?
Vou pedir reunião com os dois, o ministro e o procurador-geral. Thomas
Traumann [ministro da Secom] disse que concordava com o conteúdo e ia
pensar nas providências. A ação da PGR fortalece esse nosso pedido.
A senhora propõe, em seu pedido ao procurador-geral, até a
retirada da concessão pública do SBT em caso de condenação. Há alguma
possibilidade de isso acontecer?
Acho mais fácil tirarem a Rachel do ar do que cassar a concessão. A
emissora vai ter de assumir. Não estamos provocando a Rachel
Sheherazade, é o SBT que está em questão. Não é uma questão dela
especificamente, mas dela vinculada ao canal. A gente espera que isso
sirva de parâmetro para outras TVs.
Congresso em Foco
Nenhum comentário:
Postar um comentário