A morte de Lampião e seu bando em 28 de julho de 1938
No dia 27 de julho de 1938, o bando acampou na fazenda Angicos, situada no sertão de Sergipe,
esconderijo tido por Lampião como o de maior segurança. Era noite,
chovia muito e todos dormiam em suas barracas. A volante chegou tão de
mansinho que nem os cães pressentiram. Por volta das 5:15 do dia 28, os
cangaceiros levantaram para rezar o oficio e se preparavam para tomar
café; quando um cangaceiro deu o alarme, já era tarde demais.
Não se sabe ao certo quem os traiu. Entretanto, naquele lugar mais
seguro, o bando foi pego totalmente desprevenido. Quando os policiais do
Tenente João Bezerra e do Sargento Aniceto Rodrigues da Silva abriram
fogo com metralhadoras portáteis, os cangaceiros não puderam empreender
qualquer tentativa viável de defesa.
O ataque durou uns vinte minutos e poucos conseguiram escapar ao
cerco e à morte. Dos trinta e quatro cangaceiros presentes, onze
morreram ali mesmo. Lampião foi um dos primeiros a morrer. Logo em
seguida, Maria Bonita
foi gravemente ferida. Alguns cangaceiros, transtornados pela morte
inesperada do seu líder, conseguiram escapar. Bastante eufóricos com a
vitória, os policiais apreenderam os bens e mutilaram os mortos.
Apreenderam todo o dinheiro, o ouro e as joias.
A força volante, de maneira bastante desumana para os dias de hoje,
mas seguindo o costume da época, decepou a cabeça de Lampião. Maria Bonita
ainda estava viva, apesar de bastante ferida, quando foi degolada. O
mesmo ocorreu com Quinta-Feira, Mergulhão (os dois também tiveram suas
cabeças arrancadas em vida), Luis Pedro, Elétrico, Enedina, Moeda,
Alecrim, Colchete (2) e Macela. Um dos policiais, demonstrando ódio a
Lampião, desfere um golpe de coronha de fuzil na sua cabeça,
deformando-a; este detalhe contribuiu para difundir a lenda de que
Lampião não havia sido morto e escapara da emboscada, tal foi a
modificação causada na fisionomia do cangaceiro. "Feito isso, salgaram os seus troféus de vitória e colocaram em latas de querosene, contendo aguardente e cal." Os corpos mutilados e ensanguentados foram deixados a céu aberto,
atraindo urubus. Para evitar a disseminação de doenças, dias depois foi
colocada creolina
sobre os corpos. Como alguns urubus morreram intoxicados por creolina,
este fato ajudou a difundir a crença de que eles haviam sido envenenados
antes do ataque, com alimentos entregues pelo coiteiro traidor.
Percorrendo os estados nordestinos, o coronel João Bezerra exibia as
cabeças - já em adiantado estado de decomposição - por onde passava,
atraindo uma multidão de pessoas. Primeiro, os troféus estiveram em
Piranhas, onde foram arrumadas cuidadosamente na escadaria da igreja,
junto com armas e apetrechos dos cangaceiros, e fotografadas. Depois,
foram levadas a Maceió e ao sudeste do Brasil.
No IML de Aracaju,
as cabeças foram observadas pelo médico Dr. Carlos Menezes. Depois de
medidas, pesadas e examinadas, os criminalistas mudaram a teoria de que
um homem bom não viraria um cangaceiro, e que este deveria ter
características sui generis.
Ao contrário do que pensavam, as cabeças não apresentaram qualquer
sinal de degenerescência física, anomalias ou displasias, tendo sido
classificados, pura e simplesmente, como normais.
Do sudeste do País, apesar do péssimo estado de conservação, as cabeças seguiram para Salvador, onde permaneceram por seis anos na Faculdade de Odontologia da UFBA. Lá, tornaram a ser medidas, pesadas e estudadas, na tentativa de se descobrir alguma patologia. Posteriormente, os restos mortais ficaram expostos no Museu Antropológico Estácio de Lima localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em Salvador, por mais de três décadas.
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Memorial da Resistência, em Mossoró, no Rio Grande do Norte |
O Memorial da Resistência localizado em Mossoró no Rio Grande do Norte é um museu que retrata a história da única cidade nordestina a resistir à invasão do bando de Lampião.
Durante muito tempo, as famílias de Lampião, Corisco e Maria Bonita
lutaram para dar um enterro digno a seus parentes. O economista Silvio
Bulhões, filho de Corisco e Dadá,
em especial, empreendeu muitos esforços para dar um sepultamento aos
restos mortais dos cangaceiros e parar, de vez por todas, a macabra
exibição pública. Segundo o depoimento do economista, dez dias após o
enterro de seu pai, a sepultura foi violada, o corpo foi exumado, e sua
cabeça e braço esquerdo foram cortados e colocados em exposição no Museu
Nina Rodrigues.
O enterro dos restos mortais dos cangaceiros só ocorreu depois do Projeto de Lei nº 2.867, de 24 de maio de 1965. Tal projeto teve origem nos meios universitários de Brasília
(em particular, nas conferências do poeta Euclides Formiga), e as
pressões do povo brasileiro e do Clero o reforçaram. As cabeças de
Lampião e Maria Bonita foram sepultadas no dia 6 de fevereiro de 1969.
Os demais integrantes do bando tiveram seu enterro uma semana depois.
Lampião compositor
"Mulher Rendeira"
é um antigo tema popular, muito cantado nos sertões nordestinos ao
tempo de Lampião, e cuja origem é controversa. Segundo a versão mais
conhecida do Pe. Frederico Bezerra Maciel, regionalista pernambucano e biógrafo de Lampião, é de que o mesmo teria escrito os versos da versão original da música. A ele se acrescenta Câmara Cascudo,
segundo o qual Lampião teria feito escrito a letra em homenagem ao
aniversário de sua avó d. Maria Jocosa Vieira Lopes ("Tia Jacosa") em 15
de setembro, que era uma rendeira. Compôs a música entre setembro de 1921 e fevereiro de 1922, quando apresentou a música em Floresta (Pernambuco). A música tornou-se praticamente um hino de guerra dos cangaceiros do bando de Lampião, tendo inclusive relatos de que o seu ataque à Mossoró em 1927 teria sido feito com mais de 50 cangaceiros cantando "Mulher Rendeira".
Por isso foi incluído no premiado filme "O Cangaceiro", de Lima Barreto, que o celebrizou no país e no exterior. Na ocasião, sofreu uma adaptação do compositor Zé do Norte
(Alfredo Ricardo do Nascimento), autor de outras músicas do filme, que
manteve a sua estrutura original. Há também uma gravação de um antigo
cabra do bando de Lampião, o cangaceiro Volta Seca.
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