segunda-feira, 8 de abril de 2013

ANNA KARENINA


COLUNA DA REVISTA O GLOBO (24/3/2013)

Karenina



De todos os filmes que chegaram a nossos cinemas na esteira do último do Oscar, poucos provocam tanto impacto no público quanto “Anna Karenina”, de Joe Wright. Não foi por acaso que ganhou o prêmio de melhor figurino do ano. Não seria injusto se levasse ainda a estatueta de melhor direção de arte, categoria a que também correria. Os figurinos, a direção de arte e a fotografia de “Anna Karenina” são mesmo deslumbrantes. Mas limitar as qualidades do filme a sua excelência técnica seria reduzir o poder de “Anna Karenina” sobre as plateias. 
“Anna Karenina” é uma experiência única. O figurino impecável, a direção de arte aplicada, a fotografia vistosa estão a serviço de uma maneira peculiar de se contar uma história. “Anna Karenina” é teatral. E não esconde esta intenção. O palco, os bastidores, a iluminação são mostrados ao espectador como numa peça de teatro. Mas limitar “Anna Karenina” a sua adesão à linguagem teatral seria reduzir ainda mais a força do filme. “Anna Karenina” é teatral mas não é teatro. O que se vê na tela não poderia ser mostrado no palco de uma sala de espetáculos. O que fica claro é que ele é filmado em estúdio, o diretor não tenta imitar a realidade, mas o teatro está a serviço do cinema. “Anna Karenina” é cinema. E ótimo cinema. 
Joe Wright apostou no risco e fez um filme que ainda não tinha sido feito. O surpreendente é que isso aconteceu com um argumento mais do que conhecido. Para que filmar mais uma vez “Anna Karenina”? O IMDB, o site que é a Bíblia dos pesquisadores de cinema, contabiliza mais de 30 adaptações para o cinema do romance de Tolstoi. A primeira é de 1910. Eu, que sou cafona, me lembro de uma novela de TV: “A mulher que amou demais”, com Tonia Carrero, numa TV Rio de muitas décadas atrás. A novela nunca chegou ao fim. Tonia já me deu uma explicação: “Trouxeram um galã do México, que era lindo, mas muito canastra”. O galã em questão era Milton Rodrigues, um ator brasileiro, não muito talentoso, que conseguiu uma sobrevida artística no México. Mas ele não deve receber a culpa. A TV Rio já estava em crise e, era muito comum emissoras em crise tirarem programas do ar sem muita explicação. 
Para não fazer mais um drama de época, como as muitas versões de “Anna Karenina”, Joe Wright apostou no risco. E a inovação vem sempre do risco. Não é um filme fácil. Pode ser considerado artificial demais. O elenco atua coreograficamente. É quase uma dança. É uma maneira de deixar mais explícito o artificialismo da sociedade russa do século XIX. Quanto os personagens deixam expor sua verdade, o filme sai do estúdio. Deixa de ser teatro e finge ser cinema realista. O público pode estranhar. Afinal, o cinema nunca foi assim. E talvez não venha a ser outra vez. Por isso “Anna Karenina” merece atenção. É um filme único. 
Junte a tudo isso Keira Knightley, uma Karenina que não fica a dever nada a Greta Garbo e Tonia Carrero. O diretor não foi tão feliz na escolha dos dois atores que dividem a cena com ela, Jude Law _ carismático demais para ser o marido rejeitado _ e Aaron Taylor-Johnson _ com uma aparência de mais velho do que realmente é para interpretar o jovem Conde Vronsky. Mas nada disso perturba a experiência de se aproveitar uma experiência cinematográfica realmente original.

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