Negociação com caminhoneiros deflagra nova crise no governo de Michel Temer
No setor empresarial, por exemplo, há forte reação contra a tabela de frete mínimo
© Lula Marques/Agência PT
A negociação com os
caminhoneiros colocou o governo de Michel Temer sob nova pressão. As
promessas feitas não só se mostraram difíceis de serem cumpridas como
abriram várias frentes de crises, num efeito bola de neve que atinge
ministérios, agências reguladoras, órgãos de controle, estados e
empresários dos mais diversos setores.
No setor empresarial, por exemplo, há forte reação contra a tabela de frete mínimo. Nesta quarta (6), a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) avisou que vai recorrer à Justiça, por meio de um mandado de segurança, para impedir o tabelamento do frete rodoviário.
"Independentemente
de qualquer coisa, por princípios, somos contra o tabelamento de
preços, que fere a lei de competitividade do mercado. Estamos retornando
a um país de 30 anos atrás", afirmou José Ricardo Roriz Coelho, que
assumiu nesta quarta-feira (6) a presidência da Fiesp.
"Centenas
de empresas estão vindo até nós para falar que com o tabelamento haverá
aumento de 30% até 150% no preço final dos produtos e quem vai acabar
arcando com isso será o consumidor. O governo quer resolver um problema e
está criando outros", afirmou. Segundo Wilson Mello, presidente do
conselho diretor da Abia (Associação Brasileira das Indústrias de
Alimentação), a tabela levará a um aumento de até 80% no preço da
logística para o setor
.Porém, como a economia está desaquecida,
ele diz ainda não ser possível saber se o aumento de custos impactará os
consumidores no caso do segmento. "Em vez de inflação, pode ser que se
tenha perda de lucratividade e competitividade do setor", diz. Fernando
Valente Pimentel, presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria
Têxtil), diz que o tabelamento do frete irá prolongar efeitos negativos
da paralisação na indústria de confecção.
"Isso é anacrônico,
inconstitucional, fere a livre iniciativa e não vai dar certo. Gera
menos investimento, menos produção, menos oferta. No final, o caminhão
vai ficar parado no meio do caminho." O presidente da CNA (Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil), João Martins da Silva Junior,
disse que a entidade pretende acionar a Justiça se não houver uma
mudança na tabela, que ele classifica como "retrocesso".
A pedido
do ministro da Agricultura, Blairo Maggi, que recebeu as reclamações de
produtores agropecuários, a tabela será revista. "A ANTT [Agência
Nacional de Transporte Terrestre]vai buscar fazer uma readequação dos
valores. Ninguém está querendo fugir do acordo que o presidente fez.
Agora, que ele seja justo para todos os lados", disse Maggi no anúncio
do Plano Safra nesta quarta-feira (6). O ministro dos Transportes,
Valter Casimiro, disse que a nova tabela será divulgada nesta quinta (7)
e que o assunto ficará sob consulta pública.
O
ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, saiu em defesa do acordo. "A
tabela será mantida. Erros ou omissões devidamente comprovados poderão
ser corrigidos a qualquer tempo", disse à Folha.Outra regra que deve
enfrentar resistências é a reserva de 30% do frete da Conab (Companhia
Nacional de Abastecimento) para autônomos, sem licitação. O assunto está
sendo analisado por ministros do TCU (Tribunal de Contas da União).
Muitos
afirmam reservadamente que a medida fere a lei de licitação. O
presidente do Cade, Alexandre Barreto, disse à Folha que o órgão também
estuda o que fazer.Nos estados, os governadores reclamam com a perda de
receitas devido à redução de R$ 0,46 por litro do diesel com o fim da
incidência da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico).
Parte dessa arrecadação federal é direcionada para os estados. Ao
zerá-la, a União cortou R$ 722 milhões que serão retirados de
investimentos para conservação de rodovias estaduais.
O
Consetrans, conselho que reúne as secretarias estaduais de transportes,
quer abrir negociação com a União. Muitos estados dependem
exclusivamente desses recursos para a manutenção de rodovias. Também há
dúvidas sobre como a União vai ressarcir os estados pelo fim da cobrança
do pedágio pelo eixo suspenso quando o caminhão retornar vazio de uma
entrega, outro acerto com a categoria. Há questionamentos também de
empresários da cadeia dos combustíveis.
Embora o ministro-chefe do
GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Sérgio Etchegoyen, tenha
afirmado que o governo usaria poder de polícia para que o desconto de R$
0,46 por litro de diesel chegasse à bomba, poucos postos repassaram os
descontos, segundo levantamento de alguns Procons.Isso ocorreu por uma
razão de mercado. A medida provisória determinou o desconto na
refinaria. Da refinaria até os postos, vale a livre negociação. Muitos
juristas dizem que o governo agir na bomba seria inconstitucional.
Ao
questionar a tentativa de intervenção, Leonardo Gadotti, presidente da
Plural, entidade do setor de distribuição, chegou a dizer que "a
Venezuela começou assim". Na primeira reunião com representantes dos
caminhoneiros, feita no auge da paralisação nacional, o Palácio do
Planalto conseguiu resistir e não ceder ao estabelecimento de frete
mínimo e à isenção do pedágio sobre o eixo suspenso. Naquele momento, a
avaliação interna já era de que fazer concessões sobre esses dois pontos
poderia criar um efeito cascata e criar insatisfação com outras
categorias.
Mas a paralisação foi mantida, o que levou Temer a fazer novas
concessões.Assessores afirmam que, para ele, era necessária uma solução
imediata para que o problema do desabastecimento não se transformasse em
uma revolta popular que ameaçasse sua permanência no cargo.
Notícias ao Minuto com informações da Folhapress
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