Aplicativo de paquera e sonho do marido gringo prejudicam prostitutas nas Olimpíadas do Rio
M. nos fala também que o perfil do
cliente que procura por serviços sexuais durante as Olimpíadas não
costuma vir atrás de serviço sexual especializado, sofisticado, mas sim
de fazer baderna e farra – seja em espaços de prostituição, seja em
baladas ‘civis’ -, o que frustrou bastante as expectativas que
alimentava ao criar uma versão em inglês do seu site e fazer um curso
intensivo desse idioma para se comunicar melhor com os turistas.
Para
completar o cenário desolador da prostituição nos Jogos Olímpicos do
Rio de Janeiro, ainda temos os aplicativos de pegação funcionando a
pleno vapor. Eis aí uma ferramenta que a maioria das prostitutas ainda
não conseguiu usar para divulgação dos seus serviços e habilidades.
As
poucas que se arriscam a usar os aplicativos a trabalho frequentemente
são denunciadas e têm seus perfis desativados. Os autores das denúncias
são sempre homens: afinal, é mais vantajoso para eles ter um catálogo de
mulheres que façam sexo casual sem cobrar. Ainda mais quando tantas
delas, como no Brasil, têm fetiche por estrangeiros. Mesmo assim, há
perfis masculinos oferecendo dinheiro em troca de sexo – em alguns
casos, perfis administrados por agências de acompanhantes em busca de
novidades para incluir em seu catálogo.
As prostitutas acabaram
por aprender aquilo que é conhecimento comum de quase toda moça que
trabalha com serviços sexuais nas webcans, as camgirls: hora de jogo
importante é hora de ficar offline. Motivo? A baixa procura por sexo
online naquele momento, como explica uma camgirl que preferiu não se
identificar, pode acabar te prejudicando e fazendo com que seu nome
deixe de aparecer na lista das mais acessadas.
Homem é criado para
gostar de competição, o tempo todo se testando, pondo amizade em risco
para não perder no futebol, no videogame, no baralho, no par ou ímpar… e
que melhor lugar do que nos esportes para levarem isso ao limite? Os
pontos de prostituição importantes de qualquer cidade no Brasil durante
jogos são a prova viva.
Quando o assunto é Copa do Mundo ou
Olimpíadas, a coisa fica ainda mais complicada. Antes de mais nada, se o
turista tem grana para pagar os preços altíssimos praticados durante
esses megaeventos, não é pela prostituição a preços módicos que ele vai
se interessar. Desta ele tem até medo, pois sabe o que significa ser
lido como “gringo” (e, logo, como “rico”) num país assolado pela
pobreza.
O governo, ciente desse desconforto, dá carta branca à
polícia para tocar suas políticas de “higienização” dos centros urbanos e
pontos turísticos, o que, na prática, significa expulsar moradores de
rua e prostitutas para áreas menos acessadas.
A antropóloga
Natânia Lopes lembra um fato importante: é difícil competir com o
dinheiro estrangeiro em tempos de crise. Em busca de dólares e euros,
diversos proprietários de hotéis e flats cancelam seus contratos com
prostitutas para poderem alugá-los a preços mais elevados para os
turistas.
As reclamações frequentes de prostitutas sobre os baixos
ganhos percebidos durante os megaeventos esportivos no Brasil nos fazem
ver com outros olhos a questão do turismo sexual por essas bandas:
muito barulho para pouca prática. O desejo de encontrar num destes
megaeventos o homem dos sonhos, que se transforme em marido ideal e a
leve para longe, parece seguir sendo o mais alimentado – tanto dentre
prostitutas quanto no imaginário de mulheres que não cobram diretamente
por sexo.
* Amara Moira é colunista da Revista AzMina e autora
do livro “E se eu fosse puta?”. É travesti, prostituta e feminista.
Militante dos direitos de LGBTs e de profissionais do sexo, ainda faz
doutorado em teoria literária pela Unicamp.
Uol
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