Istoé: Perícia do TSE evidencia que a campanha de Dilma lavou dinheiro do Petrolão
No dia 20
de abril, a ministra Maria Thereza de Assis Moura, corregedora-geral da
Justiça Eleitoral, autorizou a apuração das suspeitas de que a campanha
à reeleição da presidente Dilma Rousseff, em 2014, havia utilizado
gráficas para lavar dinheiro do Petrolão. Na última semana, o relatório
entrou em fase final de redação e uma perícia deverá ser oficialmente
divulgada no próximo mês. ISTOÉ apurou que as evidências de lavagem de
recursos desviados da Petrobras se confirmaram. As empresas VTPB, Focal e
Red Seg não conseguiram comprovar que prestaram os serviços declarados
durante as últimas eleições, o que reforçam os indícios de que eram
mesmo de fachada e serviram de ponte para o pagamento de propinas do
Petrolão. Juntas, elas receberam uma fábula da campanha de Dilma em
2014: R$ 52 milhões.
A Focal foi a segunda que mais
recebeu recursos do PT, só ficando atrás do marqueteiro João Santana. Um
total de R$ 24 milhões. Mas a gráfica, assim como a VTPB e a Red Seg,
simplesmente não apresentou notas fiscais, comprovantes de pagamento,
ordens de serviço, contratos trabalhistas ou de subcontratação de
terceiros, além de extratos de transferências bancárias que
justificassem as atividades exercidas para a campanha de Dilma a um
custo milionário. Esses documentos eram fundamentais para provar que as
gráficas não foram usadas como laranjas pelo PT para esquentar dinheiro
ilegal. A ausência da papelada compromete a campanha de Dilma e
incrementa o caldo político que pode levar ao seu afastamento definitivo
em agosto, no derradeiro julgamento do impeachment. “A ausência da
devida comprovação de gastos eleitorais, principalmente quando envolver
altos valores, pode indicar a ocorrência de graves fraudes e até lavagem
de dinheiro, com sérias consequências”, afirmou o presidente do TSE,
Gilmar Mendes.
ILÍCITO: Para o presidente do TSE, Gilmar Mendes, a ausência de comprovação dos gastos eleitorais indica a existência de fraudes graves (Crédito:Ailton de Freitas/Agência O Globo)
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Os peritos do TSE visitaram as três
gráficas entre maio e junho. Seus donos contaram histórias mirabolantes
na tentativa de atestar que colocaram seu maquinário a serviço da
petista em 2014. Por isso, teriam sido aquinhoadas com os R$ 52 milhões
declarados pela campanha de Dilma. As versões, repetidas também à ISTOÉ,
não param em pé. Para comprová-las, as empresas tinham até o dia 24 de
junho para entregar a farta documentação exigida pela Justiça Eleitoral.
O não fornecimento das provas exigidas pela Justiça Eleitoral torna
muito difícil a absolvição das gráficas pela perícia do TSE.
Quem for hoje às dependências da
Focal vai se deparar com uma estrutura ínfima. A empresa de Carlos
Cortegoso, ex-garçom de Lula, fica localizada em São Paulo e exibe uma
portinha que seria incompatível com o volume de produtos que ela
declarou ter fornecido à campanha de Dilma em 2014. Dividida em dois
pisos de cerca de 40 metros quadrados cada um, a empresa conta com
apenas duas impressoras e só três funcionários trabalham por lá. Os
proprietários argumentam que, durante o período da campanha, a empresa
chegou a ter 200 funcionários, quando ainda estava sediada em São
Bernardo do Campo, cidade vizinha à capital paulista, em um espaço bem
maior. Entretanto, não foram apresentados ao TSE contratos de trabalho
desses colaboradores. Como desculpa, argumentaram que eram prestados
serviços semanais, sem vínculo trabalhista. Alegaram ainda que os
equipamentos de offset utilizados para atender ao PT estariam
acondicionados em outro imóvel de Cortegoso. Todavia, o empresário não
apresentou as notas fiscais das máquinas, nem comprovou ainda que a
tralha estava registrada nos ativos da companhia em 2014. “Existem
algumas pequenas irregularidades no sentido fiscal, mas no sentido de
criminal não tem nada”, jurou Cortegoso, abordado pela reportagem da
revista. Carece de explicação ainda como uma gráfica, sediada em São
Bernardo, poderia ter erguido palanques para a campanha à reeleição de
Dilma Rousseff Brasil afora, conforme declarou ao TSE. Até a última
semana, porém, mais essa atividade suspeita não havia sido justificada
aos peritos do tribunal.
As dependências da empresa VTPB são
ainda mais inacreditáveis, em termos de estrutura física. É uma gráfica
muito engraçada, não tem impressora, não tem nada. Nem scanner, sequer
máquina de xerox. O endereço fiscal fica registrado em uma kitnet no
bairro da Casa Verde, zona norte de São Paulo. Os donos da empresa dizem
sem corar a face que a estrutura micro não é conflitante com os R$ 22,9
milhões repassados pela campanha da presidente afastada nas últimas
eleições. A empresa, segundo suas explicações, trabalha fazendo a
intermediação entre os políticos que precisam de santinhos, por exemplo,
e as gráficas que os produzem. Contudo, não foram apresentadas notas
fiscais ou contratos que comprovem essas subcontratações. Tampouco
comprovantes de pagamentos ou ordens de serviço.
Infográfico: Rica Ramos
Mas quem lacrou mesmo foi a Rede
Seg. Abastecida com R$ 6,15 milhões da campanha de Dilma, a gráfica
sequer entregou cópias ou originais do livro contábil, porque ele
simplesmente não existe. A gráfica – 8ª maior beneficiária de dinheiro
da campanha que reelegeu a presidente da República em 2014 – não faz
contabilidade escriturada da empresa. Isto, por si só, já configuraria,
no mínimo, um “ilícito fiscal”, segundo advogados ouvidos pela ISTOÉ. A
Red Seg também está lotada em um imóvel que abriga somente uma
guilhotina de papel e uma impressora, que também é filha única. Os
documentos do estabelecimento apontam como proprietário Vivaldo Dias da
Silva. Um ano antes da campanha, de acordo com dados do Ministério do
Trabalho, ele era motorista e ganhava salário de R$ 1.490.
As suspeitas de que o montante
repassado à Focal, VTPB e Red Seg era oriundo do esquema do Petrolão
foram levantadas a partir da delação premiada de donos de empreiteiras
presos em decorrência dos desdobramentos da operação Lava Jato. O
mandatário da UTC, Ricardo Pessoa, que assinou a colaboração com o
Ministério Público, afirmou que repassou R$ 7,5 milhões à campanha de
Dilma Rousseff (PT). E que o dinheiro teve origem no Petrolão. O mesmo
empresário contou que realizou três repasses de R$ 2,5 milhões. Ao que
tudo indica, uma dessas parcelas serviu para saldar notas fiscais da
VTPB e Focal. O repasse ocorreu em 27 de agosto ao tesoureiro Edinho
Silva, ex-ministro das Comunicações, que realizou quatro depósitos na
conta da VTPB no total de R$ 1,7 milhão. Outros R$ 672,6 mil irrigaram
os cofres da Focal. Aproximadamente R$ 1,8 milhão teve como destino a
gráfica Red Seg. Esses não foram os únicos repasses feitos pela campanha
de Dilma às fornecedoras suspeitas de lavagem de dinheiro. Os maiores
montantes destinados à Focal e à VTPB também são de 2014 e da ordem de
R$ 24 milhões e R$ 23 milhões, respectivamente.
MOVIMENTAÇÕES IRREGULARES: O COAF já apontava para a ocorrência de lavagem de dinheiro pela gráfica VTPB (foto) durante a campanha à reeleição de Dilma
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Chamou a atenção do TSE o volume
gasto pelo comitê eleitoral de Dilma com serviços de confecção de faixas
e santinhos. No dia 29 de julho do ano passado, o ministro Gilmar
Mendes, que ocupava a cadeira de vice-presidente da corte eleitoral,
pediu à Polícia Federal que investigasse as três empresas. No documento,
Mendes recomendou que os agentes concentrassem as atenções na empresa
Focal. A PF aproveitou e relacionou a VTPB no bojo da apuração. Um
relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) já
apontava para a existência de crime de lavagem de dinheiro praticado
pela VTPB uma vez que havia a comunicação de movimentação atípica nas
contas da empresa.
Outro indício de que as empresas
fornecedoras possam fazer parte do esquema de lavagem de dinheiro, por
meio de serviços gráficos, refere-se à prestação de contas da campanha
da petista. Há centenas de recibos eleitorais de doações de materiais e
serviços. Parte deles está em nome dos mesmos financiadores diretos da
campanha. Ou seja, o “produto” doado é produzido pelas mesmas empresas
suspeitas, mas leva o carimbo de outra campanha. É o caso do deputado
Vicentinho. Ele encomendou à Focal Comunicação a produção de centenas de
faixas para a campanha da presidente. O que intriga a investigação é
que o petista, que arrecadou pouco mais de R$ 1,4 milhão, tenha ainda
contribuído materialmente para a reeleição de Dilma com R$ 350 milhões.
TRIANGULAÇÃO: Repasse a Edinho Silva, tesoureiro da campanha de Dilma, feito pela UTC serviu para saldar “notas frias” da VTPB (Crédito:Eliaria Andrade/Agência O Globo)
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Também intrigou os técnicos do TSE o
fato de valores declarados nos recibos de doação de materiais serem
muitas vezes bem abaixo do valor praticado no mercado. Do total da
produção de santinhos pela Axis Grafica, de São Caetano do Sul (RS), o
Comitê Financeiro do PT doou para a campanha de Dilma 6,5% de um total
de 30 mil, ou 1.950 itens. O valor declarado pela campanha foi de apenas
R$ 14,62. Mas uma no mercado gráfico o valor médio é de R$ 1,8 mil para
a quantidade total encomendada e de R$ 121 equivalente ao percentual
doado.
A ministra Maria Thereza, relatora
do pedido de cassação de Dilma no TSE, ainda está pedindo o
compartilhamento de provas e informações obtidas pelas investigações da
PF. À ISTOÉ, o ministro Gilmar Mendes ponderou que “nem todas as
diligências foram cumpridas pelo TSE e há outras em curso, de modo que
há de se aguardar uma maior quantidade de elementos para elaboração do
relatório final da perícia”. O prazo é de 90 dias, que alcançará meados
de agosto. Até lá, é possível que o afastamento definitivo de Dilma
Rousseff já tenha sido julgado pelo Senado.
Revista Istoé - Débora Bergamasco - 08.07.16 - 20h00 - Atualizado em 08.07.16 - 20h49 - Colaborou Ary Filgueira
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