Ex-detento fatura mais de R$ 1 milhão com cooperativa de reciclagem
Sergio Kapustan
Do UOL, em São Paulo
Do UOL, em São Paulo
O
ex-presidiário, e hoje empresário, Fernando de Figueiredo (foto) fundou
a cooperativa Sonho de Liberdade, em 2007, logo que saiu da prisão; a
entidade tem 80 associados, entre detentos e ex-detentos, que trabalham
com madeira reciclada da construção civil e vendem serragem para
indústrias e móveis para restaurantes, lojas e empresasDepois de cumprir pena de seis anos no presídio da Papuda, em Brasília
(DF), por assalto e roubo de carro, Fernando de Figueiredo, 44, foi em
busca de uma oportunidade de trabalho, mas sem sucesso. Resolveu, então,
abrir um negócio próprio junto com outros egressos do sistema
prisional.
Hoje fatura mais de R$ 1 milhão por ano –entre R$ 120 mil e R$ 150 mil
por mês– com a cooperativa de reciclagem de madeira Sonho de Liberdade, e
gera uma renda mensal de R$ 1.000 a R$ 4.000 para os cooperados.
Segundo Figueiredo, o negócio surgiu porque um grupo de 10 colegas não
conseguia trabalho. "O mercado, de modo geral, rejeita presidiários",
diz.
Atividade começou com a produção de bolas
Por dominarem a técnica de fabricar bolas de futebol –prática que
adquiriram no presídio–, montaram um negócio na área para vender de
porta em porta.
Depois de dois anos de mercado, a concorrência chinesa arrasou o
negócio –as vendas despencaram mais de 50%, passando de 500 unidades por
mês para 250. Símbolo da empresa, a bola foi trocada, em 2007, pela
reciclagem da madeira utilizada pela construção civil e depositada no
aterro do Distrito Federal.
Figueiredo afirma que a cooperativa tem entre seus clientes duas
indústrias do agronegócio: Cargill e Bunge. Desde o início, a estratégia
de negócio foi buscar parceiros privados e públicos.
"Percebemos uma nova oportunidade de negócio, pois era uma montanha de madeira parada na nossa frente", diz Figueiredo.
Os cooperados afirmam que reciclam 1.500 toneladas por mês. Eles
separam a madeira, que depois é triturada e vendida à indústria, onde
vira combustível para as caldeiras.
Uma parte é trabalhada para confecção de móveis rústicos.
De acordo com Figueiredo, quando a cooperativa de reciclagem começou a
dar resultado, os cooperados decidiram fazer uma parceria com a UNB
(Universidade de Brasília), que criou uma linha de seis produtos.
A universidade fez o design dos móveis, e os preços variam de R$ 300
(poltrona) a R$ 1.300 (mesa de centro). Os produtos são vendidos sob
encomenda para restaurantes, lojas e empresas.
Cooperativa já investiu R$ 450 mil em equipamentos
Para desenvolver o negócio, a cooperativa já investiu R$ 450 mil em
equipamentos, desde um caminhão até serras e trituradores. "Consolidamos
um projeto de inserção social, pois a cooperativa representa uma nova
chance para detentos que, infelizmente, não conseguem entrar no mercado
de trabalho", declara Figueiredo.
A Sonho de Liberdade surgiu na Cidade Estrutural, bairro carente de
Brasília (DF), pois a maioria dos cooperados residia na região. A sede
fica próxima a um aterro sanitário, o que facilita a coleta de material
reciclável para a produção das peças da cooperativa.
Desde a fundação, segundo os líderes, as decisões são tomadas em assembleia.
Apesar de o carro-chefe da cooperativa atualmente ser a reciclagem, a
produção de bolas, por exemplo, não foi descartada por ser uma marca da
entidade.
Por mês são produzidas 300 bolas ao preço de R$ 35 (unidade), e a
comercialização é só para eventos beneficentes e brindes corporativos.
Grupo recicla madeira do estádio Mané Garricha
Outra iniciativa da cooperativa foi uma parceria com o governo do
Distrito Federal para reciclar a madeira do Estádio Nacional de Brasília
Mané Garrincha, inaugurado na Copa das Confederações, e que receberá
jogos da Copa do Mundo de 2014.
Convivência diária de associados é importante para o negócio
Para Davi Rogério de Moura Costa, coordenador do Observatório de
Cooperativas da USP (Universidade de São Paulo), nas associações em que
os cooperados não vivem próximos podem ocorrer problemas de esvaziamento
e gestão por falta de convivência.
"Como os associados estão distantes, pois residem longe um dos outros,
isso esvazia a ideia de uma associação de fato, e torna a cooperativa um
negócio comum com os problemas que a gente conhece: falta de
qualificação de mão de obra e atrasos na entrega de produtos", diz o
coordenador.
Falta de gestão profissional é problema comum em cooperativas
O presidente do Sescoop-DF (Serviço Nacional de Aprendizagem de
Cooperativismo do Distrito Federal), Roberto Marizi, diz que
cooperativas de reciclagem enfrentam problemas de gestão, como
desconhecimento de legislação trabalhista e tributária.
Segundo Marizi, o modelo de gestão dos cooperados é, muitas vezes,
improvisado e torna as associações vulneráveis à fiscalização.
"O modelo de gestão de uma cooperativa é igual à gestão de uma
microempresa, que exige profissionalismo, mas isso não ocorre em muitas
cooperativas", diz o presidente do Sescoop.
50 mil detentos prestam serviço a empresas de São Paulo
Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, as
empresas paulistas empregam cerca de 50 mil detentos. Eles recebem
treinamento em 30 Centros de Qualificação Profissional e Produção, no
interior das unidades penais.
Por mês são qualificados 1.500 sentenciados, com remuneração de R$ 508.
Eles produzem itens como móveis escolares e de escritório, que são
comercializados para pessoas físicas e jurídicas e órgãos públicos, que
podem adquirir bens e contratar serviços produzidos sem licitação.
Há também o Programa de Alocação de Mão de Obra que permite a
contratação de detentos. Segundo a Funap (Fundação Professor Manoel
Pedro Pimental), 562 empresas privadas e 55 do setor público estão no
programa, totalizando cerca de 14,3 mil detentos.
As empresas interessadas nesse tipo de mão de obra podem obter mais
informações na Funap (Fundação Professor Manoel Pedro Pimental), pelo
telefone (11) 3150-1010.
Onde encontrar:
Cooperativa Sonho de Liberdade:
Rua Chácara Santa Luzia, 25, Cidade Estrutural, Brasília (DF) - Telefone: (61) 9693-6465 e (61) 9686-9806.
Nenhum comentário:
Postar um comentário